Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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10/09/2018 (Nº 45) A UTILIZAÇÃO DO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL PARA A DEFESA DO MEIO AMBIENTE
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A UTILIZAÇÃO DO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL PARA A DEFESA DO MEIO AMBIENTE

 

Renata Calheiros Zarelli

Vânya Senegalia Morete

André F. dos Reis Trindade

 Flávio Bento

 

Resumo

A intenção deste artigo é explicitar de forma clara e sucinta a utilização do sistema tributário nacional para a defesa do meio ambiente. A adoção dos tributos e a defesa do meio ambiente são importantes princípios que devem nortear a ordem econômica pátria. O objetivo é trazer à discussão que pode ser utilizado o tributo em proveito da proteção do meio ambiente, a fim de desestimular a poluição ambiental e valorizar aqueles que se utilizam de mecanismos limpos para a produção de seus produtos. 

 

1.  Introdução

No preâmbulo da Constituição de 1988 observa-se que as intenções e os interesses do Estado Democrático de Direito brasileiro visam assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias.

Outro dado relevante para o entendimento deste artigo é o conceito de desenvolvimento sustentável, que nasceu durante a Conferência das Nações Unidas sobre Direitos Humanos e Meio Ambiente ocorrido em Estocolmo, em 1972. Desenvolvimento sustentável é aquele que assegura as necessidades da presente geração sem comprometer a capacidade das gerações futuras de resolver suas próprias necessidades.

O objetivo é esclarecer os mecanismos que a lei tributária possui e os princípios que o direito ambiental dispõe, para que sejam utilizados conjuntamente para a defesa do meio ambiente.

Com tais explanações, a intenção deste artigo é demonstrar como a utilização do sistema tributário nacional para a defesa do meio ambiente pode ser colocada em prática com as disposições legais existentes na legislação pátria.

O presente artigo está dividido em três capítulos: um que tratará sobre o sistema tributário nacional; no segundo momento sobre a tributação ambiental; e por fim, a utilização das espécies tributárias na defesa do meio ambiente.

 

2.  Sistema Tributário Nacional

Vale anotar que, sistema é considerado um todo formado de parcelas que se vinculam e se submetem a um princípio comum ou, ainda, a composição de partes orientadas por um vetor único (SPAGOLLA, 2008, p 113).

Com isso, nas palavras de Paulo de Barros Carvalho, o sistema tributário nacional

 

empreende, na trama normativa, uma construção harmoniosa e conciliadora, que visa atingir o valor supremo da certeza, pela segurança das relações jurídicas entre Administração e Administrados. E, ao fazê-lo, enuncia normas que são verdadeiros princípios, tal o poder aglutinante de que são portadoras, permeando, penetrando e influenciando um número inominável de outras regras que lhe são subordinadas (CARVALHO, 2007, p. 140).

 

Ainda neste sentido, Aliomar Baleeiro dispõe que

 

o sistema tributário movimenta-se sob complexa aparelhagem de freios e amortecedores, que limitam os excessos acaso detrimentosos à economia e à preservação do regime e dos direitos individuais. [...] A defesa do sistema tributário e do próprio regime político do país processa-se por um conjunto de limitações ao poder ativo de tributar (BALEEIRO,1999,p. 53).

 

Assim, o sistema tributário nacional está estabelecido na Constituição Federal, que é a lei tributária fundamental, que contêm as diretrizes básicas aplicáveis a todos os tributos (CARRAZZA, 2010, p. 512).

Na Carta Fundamental estão descritas as normas de competência tributária, que tem o condão de criar os tributos - impostos, taxas e contribuição de melhoria – e estabelecer qual será o ente da federação que ficará responsável pela sua implantação e gerenciamento.

Nas palavras de Roque Carrazza, competência tributária é

 

(...) a possibilidade de criar, in abstrato, tributos, descrevendo, legislativamente, suas hipóteses de incidência, seus sujeitos ativos, seus sujeitos passivos, suas bases de cálculo e suas alíquotas (CARRAZZA, 2012, p. 512).

 

A Constituição Federal ao atribuir a competência para a criação de tributos aos entes da federação, também definiu normas que limitam este poder de tributar, com a finalidade de

 

delimitar o campo de atuação e as situações fáticas que podem servir de suporte à cobrança, vedando que se estabeleçam figuras tributárias arbitrárias e em desrespeito aos princípios constitucionais e aos direitos e garantias fundamentais do cidadão (SPAGNOLLA, 2008, p. 116).

 

A previsão constitucional que determina os objetivos fundamentais do Estado - construir uma sociedade livre, justa e solidária e garantir o desenvolvimento nacional, etc. - e ainda, pela disposição dos fundamentos do Estado Democrático de Direito - a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, e a valorização do trabalho e da livre iniciativa, etc. - são as diretrizes para o sistema tributário nacional.

Neste sentido, os autores Celso Antonio Pacheco Fiorillo e Renata Marques Ferreira, dispõem que

 

Com efeito, verificamos que a partir da promulgação da Carta de 1988 não se pode, de forma alguma, analisar a relação Fisco-contribuinte ignorando que o valor maior da dignidade da pessoa humana foi alçado a fundamento da República Federativa do Brasil, assumindo nítida feição no sentido de situar a arrecadação de quantia em dinheiro advinda da atividade tributária como um todo, em proveito da pessoa humana, a fim de que o Estado possa cumprir sua função social, assegurada pelo art. 6º do Texto Maior, o chamado piso vital mínimo. (FIORILLO e FERREIRA, 2005. p. 37).

 

Desta forma, é evidenciado nos dispositivos da constituição brasileira que, a dignidade da pessoa humana deve ser o escopo do sistema tributário nacional para que o Estado cumpra com sua função social e que dê melhores condições de vida à coletividade.

Nas palavras de Paulo Henrique do Amaral, quando trata sobre a função dos tributos

 

(..) têm dupla função que é fundamentalmente diferenciada pelo fim que perseguem. Por um lado, a natureza arrecadatória dos tributos é seu fim fundamental para o Estado poder custear as necessidades públicas, caracterizando, assim, a função primária do tributo. Em contrapartida, o tributo pode ser adotado como instrumento de política social, econômica e, é claro, ambiental, com a finalidade de levar a cabo os fins constitucionais (AMARAL, 2007. p. 64).

 

O sistema tributário nacional deve se preocupar com o meio ambiente ecologicamente equilibrado, haja vista que é considerado direito fundamental do indivíduo e é um dos princípios que devem nortear a atividade econômica do país, além de ser um “requisito indispensável para a obtenção de uma melhor qualidade de vida para a população” (SPAGNOLA, 2008, p. 118).

 

3.  Tributação Ambiental

              Antes de tratar o que é tributação ambiental, pretende-se expor brevemente sobre os princípios que norteiam o direito ambiental e tributário, não esgotando o assunto, tendo em vista a existência de outros princípios tão importantes quanto estes aqui elencados.

 

 

3.1  Princípios Ambientais

 

3.1.1 Princípio do meio ambiente ecologicamente equilibrado

Para alguns doutrinadores, além dos direitos fundamentais dispostos no art. 5º da Constituição Federal, há também o direito fundamental preceituado no art. 225 do mesmo texto, que condiciona a pessoa humana a possuir um “ambiente ecologicamente equilibrado”, considerado por tais como cláusula pétrea.

O princípio evidencia a importância de se ter um ambiente ecologicamente equilibrado, igualando-o ao direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, que são direitos fundamentais inerentes ao nascimento do homem, modificando assim a visão antropocêntrica, observando a importância do meio ambiente para a sobrevivência humana, colocando a sua preservação como o dever de cada um e a sua qualidade como forma digna de vida.

 

3.1.2 Princípio do desenvolvimento sustentável

O princípio do desenvolvimento sustentável está intimamente ligado às raízes humanas, uma vez que o homem possui o direito de desenvolver-se e ao mesmo tempo o direito de assegurar às gerações futuras as mesmas condições.

Este princípio possui grande importância, haja vista a necessidade de se buscar um ponto de “equilíbrio” entre o desenvolvimento social e o crescimento econômico. Os dois “devem coexistir, de modo que aquela não acarrete a anulação desta” (FIORILLO, 2008. p. 86).

Para Celso Antonio Pacheco Fiorillo

o princípio do desenvolvimento sustentável tem por conteúdo a manutenção das bases vitais da produção e reprodução do homem e de suas atividades, garantindo igualmente uma relação satisfatória entre os homens e destes com o seu ambiente, para que as futuras gerações também tenham oportunidade de desfrutar os mesmos recursos que temos hoje à nossa disposição (FIORILLO, 2008, p. 28).

A intenção deste princípio não é impedir o desenvolvimento, pelo contrário, tenta garantir o desenvolvimento hoje e para o futuro. O que se procura é que as atividades das empresas sejam desenvolvidas com instrumentos adequados que minimizem a degradação do meio ambiente e que tomem consciência que sem cuidado não haverá recursos naturais em um futuro próximo.

 

3.1.3 Princípio do poluidor-pagador

Este princípio, também conhecido como o princípio da responsabilidade, visa estabelecer ao poluidor a efetivação da compensação financeira pelo dano gerado ao meio ambiente, tentando, de uma forma coercitiva, responsabilizar o poluidor por degradar o meio ambiente e minimizar o dano ecológico causado.

Neste sentido, Milaré esclarece “o princípio do poluidor-pagador (poluiu, paga os danos) e não pagador-poluidor (pagou, então pode poluir). A colocação gramatical não deixa margem a equívocos ou ambigüidades na interpretação do princípio” (MILARÉ, 2001. p. 117).

              A tributação ambiental, associada a este princípio, “terá o papel de incorporar o custo da poluição ambiental ou do uso dos recursos ambientais ao preço do produto poluidor ou daqueles que utilizem os recursos ambientais” (AMARAL, 2007, p. 124)

 

              3.1.4 Princípio da prevenção

O princípio da prevenção baseia-se na tomada de medidas que evitem, reduzam ou eliminem as causas de danos ao meio ambiente. Tal princípio é o fundamento de todo o Direito Ambiental, uma vez que com o alicerce da prevenção, a atenção é

 

voltada para o momento anterior à da consumação do dano – o mero risco, ou seja, diante da pouca valida da simples reparação, sempre incerta e, quando possível, excessivamente onerosa, a prevenção é a melhor, quando não a única, solução (MILARÉ, 2001, p. 118).

 

Objetiva-se com a prevenção evitar danos ao meio ambiente, pois normalmente os danos são compensáveis, mas tecnicamente e sob a ótica da ciência, irreparáveis (MILARE, 2001, P. 119), por exemplo, a contaminação de um lençol freático por agrotóxicos; ou ainda, trazer de volta uma floresta de séculos que sucumbiu sob a violência do corte raso.

Inserido no contexto tributário, “conclui-se que será o poluidor quem deve assumir o custo com a prevenção, ao adotar mecanismos de controle e eliminação da poluição que foram produzidas em razão de sua atividade” (AMARAL, 2007, p. 153).

 

3.2  Princípios Tributários

 

3.2.1     Princípio da legalidade

              Este princípio estabelece que os tributos só poderão ser instituídos ou aumentados por lei, é o princípio da reserva legal em matéria tributária.

              Neste caminho, o autor Paulo Henrique do Amaral cita Sacha Calmon Navarro Coêlho que ensina:

nas sociedades livres se exigem regras perenes que assegurem, em matéria tributária, a prevalência dos dois pilares que sustentam o direito como ordem normativa: os princípios da justiça e da segurança. Assim, da mesma forma que hoje se consagrou a máxima da nullum poena sine lege no direito penal, também a que se fazer referência à máxima nullum tributum sine lege no direito tributário. Portanto, onde houver Estado de Direito haverá respeito ao princípio da reserva de lei em matéria tributária. Onde prevalecer o arbítrio tributário, certamente inexistirá Estado de Direito (AMARAL, 2007, p. 72).

              Trazendo tal princípio para a tributação ambiental, “necessita-se da realização de políticas ambientais visando à instituição de sistemas de precaução, prevenção e reparação dos danos ambientais que poderão ser custeados pela tributação ambiental” (AMARAL, 2007, p. 73).

 

3.2.2     Princípio da tipicidade

              Este princípio está intimamente ligado ao da legalidade, pois, a criação de um tributo não se dá somente pelo fato de sua inserção no mundo jurídico através da lei, ele deve ocorrer pela adequação do fato à norma legal. Tal subsunção do fato à norma tributária é que caracteriza o princípio da tipicidade.

              O autor Paulo Henrique do Amaral cita a explicação de Yone Dolacio de Oliveira que sustenta:

 

Os dois princípios (legalidade e tipicidade) devem ser vistos em complementaridade, não se dando preeminência a qualquer deles. Assim, se o princípio da legalidade exige lei formal, o princípio da tipicidade impõe a conduta dos titulares, da competência impositiva para criação e aumento do tributo – a definição do fato gerador, da base de cálculo, alíquota e sujeito passivo (art. 97 do CTN, complementando o princípio da legalidade e informando o princípio da tipicidade) (AMARAL, 2007, p. 73).

 

              Devido às características dinâmicas do direito ambiental e sua necessária proteção, a tipicidade do tributo, ou seja, a subsunção do fato à norma deverá ser extremamente flexível, admitindo assim, soluções distintas para situações novas.

             

3.2.3     Princípio da progressividade

              O princípio da progressividade, nas palavras de Misabel Derzi e Sacha Calmon, é o

fenômeno pelo qual as alíquotas de um imposto crescem à medida que aumentam as dimensões ou intensidades da circunstância considerada pela norma como condição de sua aplicabilidade. Já assentamos que a base de cálculo continua permanecendo inalterada, variando apenas a circunstância normativamente eleita, como condição de aplicação da alíquota (AMARAL, 2007, p. 103).

              Assim, caso a progressividade venha a ser utilizada nos tributos ambientais, estará implícito também o princípio da igualdade, haja vista que “quanto maior for a base de cálculo dos tributos ambientais, maior será a intensidade da poluição ambiental ou da utilização dos recursos naturais (...), dando a cada um o que lhe é devido” (AMARAL, 2007, p. 107).

 

3.3  Conceito de Tributação Ambiental e suas experiências em outros países

Tem-se que a tributação ambiental é um instrumento constitucionalmente garantido ao Estado para auxiliar na efetiva proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, conforme determina o art. 225, da CF. No Brasil, este mecanismo ainda não é muito utilizado, tendo em vista a quantidade de tributos existentes no país.

Assim, a tributação ambiental é tida “como o emprego dos instrumentos tributários existentes para gerar recursos necessários à prestação de serviços públicos ambientais, bem como para direcionar a postura dos contribuintes à preservação do ambiente que se mostra essencial à qualidade de vida” (SPAGNOLLA, 2008, p. 90).

 A conseqüente intervenção do estado no domínio econômico, com o intuito de garantir uma harmonia entre a economia e o desenvolvimento sustentável, foi concretizada nos artigos 149 e 170 da Constituição Federal.

Há a inserção do meio ambiente nos princípios da ordem econômica e financeira brasileira, bem como no art. 225 da Carta Magna que estabelece que o meio ambiente é um bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo ao Poder Público e a todos a obrigação de estabelecerem políticas públicas e privadas na preservação ambiental.

Nas palavras de Sirvinkas (2011, p. 198), quando menciona sobre a tributação ambiental:

 

[...] pode ser singelamente conceituada como o emprego de instrumentos tributários para orientar o comportamento dos contribuintes a protesto do meio ambiente, bem como para gerar os recursos necessários à prestação de serviços públicos de natureza ambiental.

 

              A tributação ambiental foi implantada em alguns países do continente europeu, como instrumentos fiscais de política ambiental, aplicadas a poluição ambiental. Citam-se:

 

a)   Alemanha: se prevêem taxas ou impostos sobre vasilhames e embalagens em algumas comunidades;

b)   Bélgica: tem-se optado pela via da fiscalidade. Reformas ocorridas em 1993 estabelecem distintos tipos de tributos e outras prestações coativas em consideração aos objetivos ecológicos;

c)   Grã-Bretanha: exige-se imposto sobre resíduos que tributa o uso dos desaguadouros e que se pretende afetar um fundo social.

d)   Itália: instituiu-se imposto sobre resíduos depositados em aterros, cujo objetivo é financiar serviço de eliminação de dejetos por meio de imposto municipal (AMARAL, 2007, p. 55).

 

              A intenção da tributação ambiental ou green taxes (conceito norte-americano) é precisamente a de “internalizar” os custos ambientais, isto é, trazer para o custo de cada bem ou mercadoria o custo que seu consumo representa em termos ambientais” (AMARAL, 2007, p. 54).

 

4.  Utilização das espécies tributárias para a defesa do meio ambiente

Vale lembrar os tipos de tributos existentes no ordenamento jurídico brasileiro, suas principais características e a forma que podem ser utilizados para a efetivação da preservação ambiental.

 

4.1 Impostos

 

O artigo 16 do Código Tributário Nacional define imposto como “o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte.

A Constituição Federal em seu artigo 145, I, II e III, define as competências para a criação de impostos aos entes federados – União, Estados e Municípios, respectivamente.

Na lição de Paulo de Barros Carvalho,

com efeito, debalde procuraremos na hipótese de incidência dos impostos uma participação do Estado dirigida ao contribuinte. São fatos quaisquer – uma pessoa física auferir renda; industrializar produtos; praticar operações financeiras; ser proprietária de bem imóvel; realizar operações relativas à circulação de mercadorias; prestar serviços etc. A formulação lingüística o denuncia e a base de cálculo o comprova. É da índole do imposto, no nosso direito positivo, a inexistência de participação do Estado, desenvolvendo autuosidade atinente ao administrado. (CARVALHO, 2007, p. 36).

 

O autor Paulo Henrique do Amaral clarificou sobre a utilização dos impostos como instrumento tributário de proteção ambiental que

 

poderá se dar por meio direto ou indireto. Quanto ao meio direto, poderá ocorrer pela instituição de imposto ambiental que possui como hipótese de incidência tributária a poluição ambiental ou a utilização de recursos ambientais. Já o meio indireto se dará mediante o uso de incentivos fiscais com a finalidade de desenvolver no contribuinte um comportamento não-poluidor (AMARAL, 2007, p. 160).

 

Após tais considerações, a Constituição Federal não previu impostos de natureza ambiental, desta forma, eles seriam aplicados de forma indireta, através de incentivos fiscais, para que o contribuinte tenha atitudes não poluidoras contra o meio ambiente.

A título exemplificativo há em nosso ordenamento jurídico os seguintes impostos que têm características de incentivos fiscais: a) ITR (Imposto sobre Propriedade Rural), que busca a desestimulação da manutenção de propriedades improdutivas, graduando progressivamente as alíquotas do imposto; b) IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), o qual institui alíquota progressiva nos casos em que a propriedade urbana não esteja cumprindo sua função social etc. (MAGANHINI, 2007, p. 69).

 

4.2 Taxas

             

              O artigo 77 do Código Tributário Nacional determina que as taxas são cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições. Têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição.

              Vale esclarecer o que é poder de polícia para José dos Santos Carvalho Filho, como “a prerrogativa de direito público que, calcada na lei, autoriza a Administração Pública a restringir o uso e o gozo da liberdade e da propriedade em favor do interesse da coletividade” (FILHO, 2011. p. 70).

              Além disso, conforme disposto no art. 77, consideram-se serviços públicos: a) utilizados pelo contribuinte efetivamente, quando por ele usufruídos a qualquer título; e potencialmente, quando, sendo de utilização compulsória, sejam postos à sua disposição mediante atividade administrativa em efetivo funcionamento; b) específicos, quando possam ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade ou de necessidades públicas; c) divisíveis, quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos seus usuários.

              Assevera o autor José Marcos Domingues de Oliveira que

 

No direito brasileiro, à luz do artigo 77 do CTN, parecem admissíveis como fatos geradores o licenciamento, a fiscalização e a limpeza ou recuperação ambiental, guardando uma razoável equivalência com o curso dos serviços públicos de licenciamento e fiscalização, e da limpeza ou recuperação ambiental correlacionáveis, exemplificativamente, à situações individuais dos contribuintes (tipo de estabelecimento/ instalações/ atividades, área fiscalização, etc.) e aos volumes de emissões despejos ou produção de resíduos poluidores.(OLIVEIRA, 1999. p. 57-58)

             

              Nos sistema pátrio, tem-se que a Lei 10.165/2000 que alterou a Política Nacional do Meio Ambiente – Lei 6938/81, instituiu em seu artigo 17-B a Taxa de Controle de Fiscalização Ambiental – TCFA, cujo fato gerador é o exercício regular do poder de polícia, para controle e fiscalização das atividades potencialmente poluidoras e utilizadoras de recursos naturais.

              Quanto à constitucionalidade deste dispositivo trazido pela Lei 10.165/2000, foi abordado perante o STF no RE 416.601, bem como em diversos outros julgados desta Corte, que entendeu ser legítima a cobrança da TCFA pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais – IBAMA, não havendo inconstitucionalidade na cobrança de tal tributo.     

 

4.3 Contribuição de Melhoria

              A contribuição de melhoria se caracteriza por estar vinculada à realização de obra pública que valorize a propriedade imobiliária, ou seja, este tributo será instituído para se fazer jus ao custo de obras públicas de que decorra valorização imobiliária (AMARAL, 2007, p. 177), tendo como limite total a despesa realizada e, como limite individual o acréscimo de valor que da obra resultar para cada imóvel beneficiado.

              Neste sentido, Paulo Henrique do Amaral esclarece sobre a aplicação da contribuição de melhoria no direito ambiental

O Estado, conseqüentemente, poderá desenvolver projetos voltados para a proteção ambiental com a construção de obras públicas de natureza ambiental, sem a necessidade de onerar os cofres públicos. Os proprietários de imóveis valorizados por essas obras são obrigados a pagar essa contribuição, pois o dinheiro público foi utilizado essencialmente em seu benefício, ocorrendo, assim, um benefício individual em detrimento da coletividade, cabendo à contribuição de melhoria corrigir essa injustiça.

              Em contrapartida, diversos autores discordam de tal disposição[1], tendo em vista que os contribuintes não têm capacidade contributiva para suportar o ônus de custear a reparação de determinado dano ambiental, muitas vezes, realizado por pessoas físicas e/ou jurídicas.

             

5.  Conclusão

              O objetivo deste artigo foi o de analisar de forma sucinta a possibilidade de utilização do sistema tributário nacional na defesa do meio ambiente, haja vista que os tributos e os incentivos fiscais são instrumentos eficazes na proteção do meio ambiental ecologicamente equilibrado.

              Nas palavras de Paulo Henrique do Amaral, que trata com grande veemência sobre o contexto da utilização do sistema tributário nacional na defesa do meio ambiente

 

Assinala-se que, dentre vários instrumentos para concretização dessas políticas estatais, pode-se revelar eficiente a utilização dos tributos, com o intuito de obrigar os agentes econômicos a suportar as externalidades negativas geradas em razão da sua atividade econômica poluidora ou, por outro lado, estimular por meio de incentivos fiscais que eles desenvolvam comportamentos não agressores ao meio ambiente (AMARAL, 2007, p. 44).

 

              O autor complementa sobre o incentivo estatal para as atividades econômicas não-poluidoras que

 

deverão ser incentivadas por meio de instrumentos tributários e econômicos em detrimento das poluidoras como forma de reorientar as condutas dos agentes poluidores a adotarem novas e adequadas tecnologias limpas para reduzirem custos em seus processos de produção (AMARAL, 2007, p. 51).

 

              Diante o exposto, verifica-se que a taxa poderá ser utilizada de forma excelente no papel da proteção ambiental, “financiando o sistema de fiscalização de determinadas atividades poluidoras ou na adoção de serviços públicos de natureza ambiental” (AMARAL, 2007, p. 172).

              Além disso, já foi discutida a sua constitucionalidade no STF (RE 416.601), quando da análise da TCFA - Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental.

               Ainda neste sentido, a lei que instituiu a TCFA admitiu a possibilidade de que 60% (sessenta por cento) do valor desta taxa seja direcionado ao órgão ambiental estadual, e os 40% (quarenta por cento) restantes encaminhados ao IBAMA (órgão ambiental federal). Alguns Estados já aderiram a tal procedimento, por meio de lei estadual, tais como Bahia, Pernambuco e Rio Grande do Norte. No Paraná, o projeto de lei está em trâmite perante a Assembléia Legislativa do Estado.

              Em relação a utilização dos impostos na proteção ambiental, estes devem ser instituídos de forma indireta, ou seja, através de incentivos fiscais. Com isso, estimularia o contribuinte a realizarem condutas voltadas à proteção ambiental ou a não praticarem condutas poluidoras; para tanto, a pessoa política competente poderá diminuir, retirar ou aumentar a carga tributária do sujeito passivo como forma de atender seu escopo. Pode-se citar o ITR (Imposto de Territorial Rural), que isenta o seu pagamento, àqueles que possuem áreas com florestas sob o regime de preservação ambiental em sua propriedade (AMARAL, 2007, p. 193 e 196).

              Quando o Estado ao incentivar a construção de obras de caráter ambiental, por exemplo: praças, academias ao ar livre, etc., estará atendendo ao interesse coletivo, pois propiciará a elevação do bem-estar coletivo. Com tal atitude, haverá uma valorização dos imóveis próximos a estas obras, e assim, o Estado poderá efetuar a cobrança da contribuição de melhoria para custear tais obras.

              Nas palavras de Paulo Henrique do Amaral “(...) ocorrendo, assim, um benefício individual em detrimento da coletividade, cabendo à contribuição de melhoria corrigir esta injustiça” (AMARAL, 2007, p. 180).

              Em decorrência da experiência vivida na Europa com a instituição de tributos ambientais e o resultado de seu custo-benefício em custo prazo[2], verifica-se que o tributo ambiental pode ser utilizado de forma a prestar um inestimável serviço à proteção ambiental.

              Com isso, salientasse que este artigo trouxe as explicações sobre o tema, de forma sucinta, não tendo o intuito de exaurir o tema proposto, e sim de provocar novas discussões sobre o assunto.

             

 

6.  Referências Bibliográficas

AMARAL, Paulo Henrique do. Direito Tributário Ambiental. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2007.

 

BALEEIRO, Aliomar. Limitações Constitucionais ao Poder de Tributar. 7 ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999.

 

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, Senado, 2011.

 

BRASIL, Lei Ordinária nº 6.938, de 10 de dezembro de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 02 set. 1981.

 

BRASIL, Lei Ordinária nº 10.165, de 27 de dezembro de 2000. Altera a Lei no 6.938, de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, 28 dez. 2000 e retificado em 09 jan. 2001.

 

CARRAZZA, Roque Antonio. Curso de Direito Constitucional Tributário. 26 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2010

 

CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário. 19 ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

 

FILHO, José dos Santos Carvalho. Manual de Direito Administrativo. 24 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.

 

FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.

 

FIORILLO, Celso Antonio Pacheco; FERREIRA, Renata Marques. Direito Ambiental Tributário. São Paulo: Ed. Saraiva, 2005.

 

MAGANHINI, Thais Bernardes. Extrafiscalidade Ambiental: Um instrumento de compatibilização entre o desenvolvimento econômico e o meio ambiente. Tese de Mestrado em Direito – UNIMAR, Marília. 2007.

 

MILARÉ, Edis. Direito ambiental: doutrina, prática, jurisprudência e glossário. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.

 

OLIVEIRA, José Marcos Domingues de. Direito Tributário e Meio Ambiente: Proporcionalidade, Tipicidade Aberta, Afetação da Receita. 2. Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1999.

 

SPAGOLLA, Vanya Senegalia Morete. Tributação
ambiental: proposta para instituição de um imposto ambiental no direito
brasileiro.
Tese de Mestrado em Direito – UNIMAR, Marília. 2008

 

SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de Direito Ambiental. 9 ed. São Paulo: Saraiva, 2011.

 



[1] O autor Jorge de Oliveira Vargas apud Amaral, sustenta que “a obra pública da qual decorre a legitimidade da cobrança da contribuição de melhoria tem como requisito a valorização de imóveis particulares, e isso não é o objetivo do ambientalismo, pois este visa o benefício de todos e não só de alguns”. (AMARAL, 2007, p.180)

[2] “(...) citam-se os impostos sobre o enxofre, o gás carbônico (CO2) e os óxidos de nitrogênio, bem como os esquemas de diferenciação fiscal dos combustíveis (na Suécia o teor médio do enxofre dos combustíveis caiu 40% em dois anos, com reduções significativas das respectivas emissões. O chumbo foi erradicado da gasolina e as emissões de óxidos de nitrogênio foram reduzidas em 35% em dois anos) e o imposto sobre a poluição de recursos hídricos (na Holanda, o tributo gerou verbas que possibilitaram rápido aumento da capacidade de tratamento, melhorando substancialmente a qualidade das águas em dez a quinze anos). Os tributos ambientais analisados revelaram benefícios ambientais e, na maioria dos casos, pareceram ter uma boa relação custo-benefício, com resultados significativos em períodos relativamente curtos (dois a quatro anos). (AMARAL, 2007, p. 44).

Ilustrações: Silvana Santos