Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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10/09/2018 (Nº 45) REALIDADE SOCIOAMBIENTAL DA COMUNIDADE RIBEIRINHA DA BACIA DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA DA CIDADE DE PINHÃO PARANÁ
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REALIDADE SOCIOAMBIENTAL DA COMUNIDADE RIBEIRINHA DA BACIA DE ABASTECIMENTO DE ÁGUA DA CIDADE DE PINHÃO PARANÁ

Autores:

Bióloga Esp. Ana Paula de Jesus Almeida

Instituto de Pesquisa Gravatá- Paraná – Brasil- Rua Bahia, 618- Bairro Dos Estados| CEP 85035-050 | e-mail ap.jesusalmeida@gmail.com Fone: (42)3035-7112 Guarapuava- PR

 Biólogo Ms Durinézio José de Almeida

Universidade Estadual do Centro-Oeste - Paraná - Brasil – Departamento de Ciências Biológicas- Rua Camargo Varela de Sá, 03 - Vila Carli | CEP 85040-080 | e-mail durinezio@gmail.com Fone: (42) 3629-8100 Guarapuava - PR

 

Resumo:

O trabalho socioambiental realizado no Arroio Invernada Poço do Gato teve por objetivo verificar os motivos pelos quais a região passou a ser ocupada aparente condições sanitárias e econômicas dessa população, possibilitando refletir sobre a possibilidade de modificar essa realidade, através do diagnóstico dos vários empecilhos locais e das necessidades da referida comunidade.

 

Palavras chave:

 

Introdução.

 

O município de Pinhão, com 13.734 habitantes no quadro urbano, é abastecido de água pelo Arroio Invernada e Poço do Gato. Este sofre desflorestamento da margem do manancial, com conseqüente comprometimento da quantidade e disponibilidade hídrica devido à erosão do solo. Desta forma, foi necessária a atuação do Instituto de Pesquisa Gravatá, em 2004, efetuando o levantamento sócioambiental com moradores próximos à área da bacia.

Segundo GRÜN (1994) os seres humanos colocam-se a parte da natureza, vendo-a como quem olha uma fotografia, a natureza e a cultura passam a ser dois conjuntos distintos como o observado no município citado. O atual modo de educação distingue o máximo possível esses dois conjuntos, aumentando essa distância. O processo de objetificação implica simultaneamente em domínio, posse, mas também perda e afastamento da natureza.

De acordo com WORSTER (1992) a emergência da crise ambiental como uma preocupação específica da educação foi precedida de certa “ecologização das sociedades”. Essa ecologização começou no momento em que o meio ambiente deixou de ser um assunto exclusivo, ampliando-se pela sociedade civil. Em Pinhão, a realidade do desabastecimento de água potável associada à realidade do manancial ocasionou essa ecologização, mas superficialmente, onde se tem o conceito, mas não ha pratica.

Müller (2002) acredita que somente provocando a participação da comunidade é que um programa de Educação Ambiental atinge seus objetivos, tendo em vista a necessidade de continuidade das ações, meios e resultados numa sociedade dinâmica. Para tanto, deve proporcionar os conhecimentos necessários à compreensão do ambiente, de modo a promover continuamente a construção de uma consciência social, capaz de formar atitudes que alterem os comportamentos geradores de problemas e conflitos ambientais. Essas ações devem procurar promover maior distribuição de renda e geração de empregos.

Diferentes visões têm contribuído para a construção de posturas comprometidas com a conservação e a preservação ambiental, com a melhoria da qualidade de vida e com o resgate da cidadania (Sabiá, 2002).

O Instituto de Pesquisa Gravatá (INP Gravatá) iniciou este trabalho de Educação sócioambiental por uma avaliação da realidade socioambiental da comunidade do entorno, e este trabalho é produto da compilação destes dados.

2. Material e métodos.

2.1 Caracterização da área de estudo

A área pesquisada situa-se no Município de Pinhão no entorno do Arroio Invernada. A síntese dos dados referentes a área de estudo apresentam-se na tabela 01

2.2 Levantamento de dados para pesquisa descritiva.

O levantamento sócio-ambiental foi feito através de questionário residencial e executado pela equipe de Educação  Sócioambiental da ONG Gravatá

Tabela 01- Dados gerais do município de Pinhão (Secretária de Desenvolvimento de Pinhão)


3  Resultados e discussão.

Os resultados (Figura 01) demonstraram que a maior parte das pessoas foi morar próximo às margens do manancial por falta de outra opção (57%). Para muitos foi o único local onde conseguiram comprar uma moradia. As pessoas que declararam estar no lugar por opção, ali permaneceram por terem nascido nas proximidades do rio e, possuírem familiares nas mesmas imediações. Os resultados demonstram o inicio de um ciclo vicioso de falta de opção e de ocupação irregular. Sem intervenção das governanças, este quadro será repintado ano após anos. Os Governos devem procurar atualizar ou preparar estratégias destinadas a integrar o meio ambiente e desenvolvimento como tema interdisciplinar. Isso deve ser feito em cooperação com todos os setores da sociedade. Nas estratégias devem-se formular políticas e atividades e identificar necessidades, custos, meios e cronogramas para sua implementação, avaliação e revisão. Deve-se empreender uma abordagem multidisciplinar, que abarque as questões de meio ambiente e desenvolvimento e seus aspectos e vínculos sócio-culturais e demográficos. Deve-se respeitar devidamente as necessidades definidas pela comunidade e os diversos sistemas de conhecimentos, inclusive a ciência e a sensibilidade cultural e social (AGENDA 21, 2001, 260p.)

A maior parte das pessoas situadas as margens do manancial de abastecimento se encontram na faixa etária adulta (49%), lembrando portanto que é quase a mesma a porcentagem de idosos no município (nesta região) (40%). As crianças representam em menor número a população ribeirinha do manancial Arroio Invernada-Poço do Gato. Contudo, mesmo sendo a menor densidade populacional, destes (de 0 a 18 anos), boa parte deles dificilmente terá opção de morar em um local mais distante às margens do rio, pois uma analise mais detalhada demonstra que, a maior parte da população veio morar ali por falta de opção, logo os pais terão dificuldades em oferecer condições para que os filhos possam futuramente dali sair,  permanecendo na idade adulta, assim perpetuando a poluição e destruição do rio que abastece a cidade de Pinhão.

Na área do trabalho, é baixo o percentual de pessoas que apresenta uma atividade formal (com renda fixa mensal num único emprego assegurado pelos direitos trabalhistas). A maior parte das pessoas que trabalham para arrecadar alguma renda mensal desenvolve atividades informais (os chamados bicos, sem renda mensal fixa e sem a segurança de nenhum direito trabalhista). Também um número bem significativo das pessoas dessa região vive de aposentadoria, o que já era esperado, levando-se em consideração que grande parte dessas pessoas é idosa.


 

Figura 01- Gráficos representando os resultados obtidos através de questionário socioambiental com ribeirinhos em Pinhão.

Em grande incidência a população apresenta renda mensal variável, oscilando a média em torno de um salário mínimo, segundo os demonstrativos dos questionários residenciais realizados entre os moradores ribeirinhos. Uma parte considerável dessas pessoas tem renda de um salário mínimo mensal. Outra parte, sendo esta a menor, possui uma renda mensal superior a um salário mínimo.

Tais informações sobre a renda nessa região transparece um quadro preocupante, pois devido a dados que os próprios questionários comprovam, são poucas as pessoas por habitação que possuem algum tipo de renda (informal ou não) e considerando-se também paralelamente muito deficitária a média da renda por pessoa.

A grande maioria da população da região recebe água tratada pela Compania de Saneamento do Paraná (SANEPAR), fator bastante contundente, pois isso comprova que o poder público de alguma forma contribiu para a migração das pessoas para estes locais, dando algumas condições de saneamento. Porém a proximidade das moradias ao rio, não causa só a destruição do mesmo pelo desmatamento, como coloca em risco a água do mesmo,de poços e minas, através do despejo de resíduos de esgoto doméstico (água da pia, tanque e banheiro) em valas abertas, em geral, que acabam sendo lançados ao rio, botando em risco a saúde de quem consome água diretamente do mesmo, e botando em rico lençóis freáticos que abastecem minas e poços, podendo contaminá-los, também colocando em risco quem consome de forma direta a água dos mesmos.

“A água doce é escassa e preciosa. Mais de 1 bilhão de pessoas não tem acesso a água limpa, e esse número está aumentando. Até 2025, dois terços dos habitantes do planeta poderão ter de enfrentar escassez de água. Muitos deles estarão em países ricos, e não apenas nas regiões tradicionalmente vinculadas a estiagens.

O consumo doméstico médio de água doce chega a centenas de litros por pessoa por dia. Mas o consumo global de água pelo qual somos responsáveis em todo mundo é mais de 20 vezes maior. Os alimentos e bens que compramos consomem água no caminho que percorrem para chegar até nós e, essa “água oculta” realmente vai se acumulando.

Nosso consumo de água exerce impacto global e pode afetar países, habitats e pessoas para as quais falta água.

A água que usamos em casa exerce o maior impacto sobre os recursos hídricos. Não é fácil transportar água de outras regiões e, diferentemente do que ocorre com o óleo usado para energia, nada pode substituir a água limpa depois de ela ter sido poluída ou derramada no mar.

Existe uma finalidade para a qual evidentemente não devemos economizar água: quando a tomamos. Para viver com saúde é preciso beber muita água fresca” (BERRY, 2009, 128 p.).

O percentual de pessoas que moram na região a mais de dez anos (26%) demonstra que a formação residencial em torno do rio é relativamente recente e a pouco mais de dez anos atrás era menos drástico o problema sócioambiental a ser resolvido. Os resultados demonstram que o problema se instalou mais recentemente, pois é relevante o percentual de pessoas que vieram morar na região a cerca de um ano (30%), que é quase equivalente a soma de pessoas vindas nos últimos dez anos.

Pelo gráfico (Figura 01) se percebe que é pequeno o percentual de pessoas que se infectaram com alguma doença devido a água na região, pois é importante lembrar que boa parte recebe água tratada pela SANEPAR e, muitas dizem evitar contatos diretos com a água do rio.

A maior parte das pessoas teve algum tipo de doença, como problemas de pele ao entrar em contato direto com a água do rio. Isso acontece muitas das vezes com crianças que brincam nas águas do rio, o que explica porque há contradição com o gráfico acima.

A maioria da população se diz satisfeita em estar no local onde vive. Muitos revelam ali ser um lugar tranqüilo e próximo a escolas, supermercados e postos de saúde, sem importar-se com o dano ambiental ao rio e os danos sociais, como saneamento inadequado e falta de documentação das moradias que habitam. Isso possivelmente ocorre porque essas pessoas não têm consciência da importância da preservação do rio e de sua mata ciliar, e da segurança de se ter uma habitação legalmente escriturada, vendo-se aí a grande importância da Educação Ambiental para alertar a população.

Apenas um pequeno percentual da população se diz preocupada em sair do local devido a fatores comentados acima, caso tenham outra oportunidade de moradia, cabendo a ação do poder público providenciando loteamentos sócio-ambientalmente adequados para todos os moradores das margens do manancial que estão nas áreas que deveriam ser de preservação, sendo consideradas áreas de risco. Relembrando que as pessoas que não concordam em sair do local devem ser esclarecidas por educadores ambientais, para entenderem os motivos benéficos de se ir para um outro local, onde houve um planejamento sócio-ambiental.

Grande parte da população gostaria de mudar-se para outro local se houvesse condições de um outro loteamento adequado para isso. O que demonstra que a permanência das pessoas no local se dá por estarem forçados de forma indireta (ser o único lugar onde conseguiram para morar ou por já ali terem nascido), sendo este um quadro social preocupante, pois se trata de uma forma de exclusão social que não deve ser ignorada mas solucionada para o bem estar do meio ambiente e das pessoas de todo o município.

4 Conclusão e Considerações Finais:

A  maioria dos moradores ali passaram a residir por falta de opção, contudo a maior partes dos habitantes local ali se estabeleceu a menos de 10 anos, o que denota que a área passou a ser fortemente ocupada a relativamente pouco tempo, revelando o descaso  de governantes em relação a saúde pública e aplicação políticas ambientais no entorno do manancial.

A menor porcentagem de pessoas é de crianças, prevalecendo um percentual próximo entre pessoas adultas e idosos.

As pessoas em idade produtiva em sua grande maioria conseguem sua renda mensal de maneira informal.  Os que possuem fontes de renda formais, dificilmente recebem um valor superior ao salário mínimo, pois não possuem níveis elevados de escolaridade.Os idosos sobrevivem pelo ganho de aposentadoria que, nesses casos é de um salário mínimo, tornando sempre baixa a renda mensal.

O abastecimento de água é realizado através da utilização de minas próximas às residências ou por intermédio da empresa que trata a água no estado do Paraná, no sul do Brasil, a SANEPAR, como é o que acontece na maioria das residências. Norteando então duas situações problemáticas: a água das minas pode estar contaminada e, fato de que mesmo sendo uma área de ocupação inadequada pelo ponto de vista socioambiental, a empresa de saneamento do estado concedeu o abastecimento de água para quase todas as habitações das proximidades do arroio.

Ao perguntar se as pessoas adoeceram devido ao contato com o arroio, muitas das pessoas entrevistadas responderam que não, mas ao perguntar se já tiveram alguma forma de verminose, diarréia ou problema de pele, a maioria delas respondeu que sim, que já teve algum desses problemas ou mais de um deles. O que demonstra que na verdade a população não associa as enfermidades ao contato com o arroio, o que não comprova que as doenças que tiveram foram adquiridas através do contato com a água do rio, mas há grande indício dessa possibilidade.

Contudo a maior parte dos residentes está satisfeita em morar na região próxima ao arroio, mas gostariam de um local com melhores condições se assim fosse possível, porém os governantes locais não auxiliam na realocação das famílias que residem no entorno do arroio Invernada Poço do Gato, o que implica no aumento dos problemas ambientais e de saúde pública, uma vez que essa população tende a aumentar cada vez mais com o passar dos anos, fazendo com que aumente muito a poluição da água e a depredação da mata ciliar do arroio que abastece o município de Pinhão.

 

Bibliografia:

BERRY, S. Como usar água e energia sem disperdício. São Paulo: Publifolha, 2009, 128 p.

Sabiá, I.R. Projeto de Capacitação em Educação Ambiental: Participação da População em Áreas de Mananciais, in: Educação Ambiental: Desenvolvimento de Cursos e Projetos, Philippi junior, A. & Pelicioni, M. C. F. (ed.). São Paulo : USP, p.53-59, 2002.

Muller, J. Alguns Caminhos para Efetivação da Educação Ambiental em Unidades Regionais: Ênfase em Bacia Hidrográfica, in: Educação Ambiental: Desenvolvimento de Cursos e Projetos, Philippi junior, A. & Pelicioni, M. C. F. (ed.). São Paulo : USP, p.86-101, 2002.

Grün, M. Ética e educação ambiental: A conexão necessária / Campinas, SP: Papirus, 1996.

WORSTER, D. Nature’s economy: A history of ecological ideas. Nova York: Cambridge, 1992.

Ilustrações: Silvana Santos