Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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10/09/2018 (Nº 45) O POTENCIAL PEDAGÓGICO DE QUATRO INSTITUIÇÕES DA BAIXADA SANTISTA PARA O ENSINO DA BIODIVERSIDADE E SUA CONSERVAÇÃO
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ANÁLISE DO POTENCIAL PEDAGÓGICO DE ESPAÇOS NÃO-FORMAIS DE ENSINO PARA O DESENVOLVIMENTO DA TEMÁTICA DA BIODIVERSIDADE E SUA CONSERVAÇÃO

 

O POTENCIAL PEDAGÓGICO DE QUATRO INSTITUIÇÕES DA BAIXADA SANTISTA PARA O ENSINO DA BIODIVERSIDADE E SUA CONSERVAÇÃO.

 

 

 

 

 

Sandra Regina Pardini Pivelli1

 

 

 

 

 

1Secretaria de Meio Ambiente de Santos - SP

 

 

 

 

 

 

Resumo

 

Zoológicos, museus, aquários e jardins botânicos têm sido apontados como instituições que promovem conservação, educação e pesquisa principalmente sobre a diversidade de espécies vegetais e animais. O presente trabalho propôs-se a investigar o potencial pedagógico de quatro instituições localizadas na Baixada Santista, que expõem a biodiversidade, para o ensino desta temática e sua conservação: o Museu de Pesca, o Jardim Botânico Municipal de Santos Chico Mendes, o AquaMundo e o Parque Ecológico Voturuá. Para tanto, analisou-se documentos, propostas, espaços de exposição, atividades educacionais e os discursos dos profissionais destas instituições envolvidos neste contexto. Apesar da potencialidade pedagógica da biodiversidade estar presente pelo seu caráter intrínseco no acervo institucional das exposições, não há projeto pedagógico articulando a temática diretamente às atividades de educação ambiental. A falta de entendimento da importância destes espaços como elos da conservação ambiental pelos gestores faz com que a característica mais enfatizada perante a população seja a do lazer, utilizando os elementos que compõem o acervo principalmente como atração turística.

 

Palavras chave:  biodiversidade, conservação, potencial pedagógico.

 

Introdução

A desarmonia constatada atualmente é fruto de um processo histórico do qual a humanidade tem sido protagonista. O modelo de desenvolvimento no qual o racional predomina levou a desigualdades sociais sem precedentes na história da humanidade e, com as comodidades proporcionadas pelas conquistas materiais, houve um distanciamento cada vez maior de nossa essência natural. A convivência com o mundo natural tem sido cada vez menor, em vista do crescente processo de urbanização. No Brasil, por exemplo, 80% da população vive nas cidades, longe das áreas naturais. (Wilson, 2003).

Nosso país é líder mundial em diversidade de várias espécies. Isto faz com que tenhamos a responsabilidade de conserva-las principalmente devido ao crescente processo de extinção. Estabelecer um contato direto com a beleza e a diversidade encontradas na natureza pode ser o meio mais eficaz de aumentar o conhecimento e sensibilizar as pessoas de modo a proporcionar uma religação do ser humano com seu meio natural. Quanto maior o número de pessoas atingidas por esse novo pensar e agir, maiores serão as chances de se chegar a um equilíbrio entre bem estar social e integridade ambiental.

Ao servir de palco para um aprendizado diferenciado, instituições que expõem biodiversidade como, museus, zoológicos, jardins botânicos e aquários podem sensibilizar melhor o ser humano, despertando nele o interesse por questões ambientais que estimulem posturas mais éticas. (Wilson, 2003). Essas instituições, que possuem como uma de suas metas a educação, apresentam um potencial singular no processo de educar, principalmente o público de centros urbanos, repassando conhecimentos e dando oportunidades de se ter experiências diretas com o mundo natural e sua diversidade.

A biodiversidade não é um conceito abstrato, nem puramente físico-biológico, mas sim, também humano, pois tem uma localização físico-geográfica e formas de apropriação com feições específicas, o que lhe confere uma dimensão material, concreta e, portanto, a insere necessariamente no contexto das relações sociais. (Lewinsohn; Prado, 2002).

 Ela pode constituir um conceito chave no processo educacional, um tema central na compreensão de muitos assuntos relacionados ao meio ambiente, gerando um estímulo extra para observar mais de perto todos os tipos de atividades sociais envolvendo as espécies, engrandecendo assim a dimensão da educação ambiental. Ela pode ajudar ainda a compreender a base em que formamos nossos valores possibilitando a busca de soluções para os problemas ambientais, podendo constituir um eixo condutor, administrando ações locais a partir de conhecimentos que envolvem a capacidade dos ecossistemas como sustentáculos da vida.

 

OBJETIVOS

O presente trabalho propôs-se a investigar o potencial pedagógico para o desenvolvimento da temática da biodiversidade e sua conservação nas seguintes instituições situadas nos Municípios de São Vicente, Santos e Guarujá – SP: o Zoológico do Parque Ecológico Voturuá (PEV), o Jardim Botânico Chico Mendes (JBMSCM), o Museu de Pesca (MP)  e o Acqua Mundo (AM).

 

mETODOLOGIA

O presente trabalho apoiou-se na análise dos seguintes aspectos presentes nos locais estudados:

1) Análise de materiais escritos das instituições, tais como, documentos, textos, folhetos de divulgação e de pesquisa referentes às suas propostas.

2) Observação direta das instituições em relação aos seguintes itens:

a)    Espaço expositivo em termos de área, planejamento, organização espacial, disposição dos materiais de exposição, móveis e equipamentos;

b)    Acervo em termos de quantidade, diversidade, disposição, apresentação e organização;

c)    Materiais informativos (folders, textos, catálogos, impressos, etiquetas, painéis, placas, ilustrações, recursos gráficos e eletrônicos);

d)    Presença de monitores e/ou educadores;

e)    Os tipos e estilos de atividades educacionais propostas (contemplativo, interativo, auto-interpretativo e inter-relativo a partir de um interlocutor)

3) Aplicação de questionários aos profissionais destas instituições, principalmente aqueles envolvidos na administração e na elaboração e desenvolvimento da proposta institucional.

4) Aplicação de entrevistas semi-estruturadas à aqueles envolvidos na elaboração e no desenvolvimento dos projetos destas instituições, principalmente, dos projetos educacionais relacionados à temática investigada.  

A análise dos dados se deu numa abordagem qualitativa da pesquisa educacional. Os referenciais teóricos utilizados para a análise dos significados basearam-se em autores que discutem as concepções de biodiversidade, as relações homem e natureza, as concepções de conservação da natureza e, por conseguinte, de biodiversidade e que analisam espaços não-formais de ensino.

 

RESULTADOS

 

A-   A relevância do tema biodiversidade na administração dos espaços expositivos institucionais:

 

O planejamento formal de todas as instituições apresenta um forte componente empírico, não existindo qualquer instrumento com um grau de detalhamento maior enfocando os parâmetros utilizados para a montagem das exposições. O único local onde foi mencionado o uso de um referencial bibliográfico como eixo norteador da montagem do acervo foi o Jardim Botânico que utilizou as Normas Internacionais de Conservação para Jardins Botânicos. 

O Museu de Pesca e o Jardim Botânico têm atribuições genéricas estabelecidas por lei e publicadas em Diário Oficial. Mas, não há nenhum plano diretor concebido para nenhuma das instituições estudadas. O Museu ainda possui o estatuto da sua Sociedade de Amigos que procurou garantir uma certa característica expositiva do acervo.

As características da exposição são bem diversas entre si. O acervo do Zoológico e do Botânico estão situados ao ar livre, sendo raras as áreas cobertas disponíveis que possibilitem algum tipo de contato com os espécimens. No Zôo há presença de afastamento que evita a proximidade excessiva do público com os animais da exposição em alguns recintos. No Botânico não existe tal impedimento, mas na entrada principal há um totem informando as atividades que não podem ser praticadas dentro do Parque e uma delas é o pisoteio grama dos canteiros destinados as coleções. No Museu de Pesca e no Acqua Mundo a exposição encontra-se praticamente toda em espaço coberto, sendo que no Aquário há climatização do local. Permite-se o toque num determinado local no Acqua Mundo, mas a contemplação do acervo feita eventualmente com a mediação de um monitor é ainda a maneira mais utilizada no entendimento das espécies da exposição.

Todas as instituições encontram-se com placas indicativas, painéis informativos com textos descritivos sobre partes da exposição. No Museu de Pesca há exemplares com etiquetas, principalmente os armazenados em vitrines e no Acqua Mundo a maior parte dos painéis são luminosos devido a própria disposição do acervo ser localizada num corredor escuro, possibilitando a auto interpretação do público. No Acqua Mundo há monitores distribuídos pelos tanques, proporcionando informações caso sejam solicitados. Em todas as instituições é necessário agendar previamente a monitoria.

A presença de um atendimento personalizado para portadores de necessidades especiais é freqüente em todas as instituições. A proposta mais inclusiva neste aspecto é a do Acqua Mundo que possui mais estruturas físicas, como cadeiras de rodas disponíveis e programa educacional estabelecido para esta finalidade. Os portadores de necessidades visuais constituem o principal foco de atenção deste tipo de atendimento.

O contato com outras instituições também se mostra como um processo bastante difícil de ser executado. Infelizmente, estes locais ainda mantém um trabalho praticamente isolado. Mesmo quando estão situados no próprio município, há dificuldades de se estabelecer uma comunicação efetiva inter-institucional. Os maiores contatos são estabelecidos em eventos da área, mas a realidade local é muito pouco discutida. Uma articulação maior se faz necessária não só para troca de experiências, mas para a própria reflexão sobre os objetivos reais de cada espaço.

Os objetivos institucionais com relação a temática da biodiversidade não são diretamente relacionados a sua própria implantação nem a sua conservação. Este tema acaba surgindo indiretamente em decorrência da sua relação com as exposições, mas elas não foram planejadas para isto. Embora o Jardim Botânico tenha sido a única instituição que “trocou” de identidade com a principal finalidade de conservar espécies botânicas, este objetivo até o presente momento ainda não está sendo cumprido. Então, a ênfase dos acervos é dada no caráter expositivo de espécies que chamam a atenção do público por algum motivo (tamanho, curiosidade, afetividade, medo, utilidade, raridade, extinção, dentre outros). Isto indiretamente acaba se relacionando com a temática da biodiversidade, mas não constitui o foco da exposição.  Assim, a implantação das instituições estudadas em relação a este tema ainda está muito baseada no pragmatismo, colocando-se na exposição o que se pensa despertar a curiosidade do visitante e o que se tem disponível em termos de exemplares no momento. Tal fato pode ser justificado:

·         Pelo histórico de criação das próprias instituições, que com exceção do Acqua Mundo, passaram por várias mudanças até se estabelecerem no que são hoje;

·         Pela ausência de equipes multidisplinares “capacitadas” no assunto que poderiam propor outros enfoques nos acervos, além do puramente expositivo;

·         Pelo tema biodiversidade ser relativamente recente comparado com a história de criação das instituições (exceção feita ao Acqua Mundo);

·         Pela falta de interesse político e público na implantação de outro foco expositivo nos acervos;

·         Pela falta de literatura especializada e de exemplos bem sucedidos que inclua além da filosofia os procedimentos básicos para a montagem de acervos biológicos vivos ou conservados em exposições públicas que trabalhem com a temática da biodiversidade;

·         Pela falta de recursos financeiros destinados para esta finalidade.

 

B- A relevância do tema biodiversidade na organização dos espaços espositivos institucionais:

 

Analisando a questão da biodiversidade no espaço expositivo. Em termos de área de exposição a instituição que apresenta o menor espaço expositivo é o Acqua Mundo com 3.000 m2. A ele segue-se o Museu de Pesca, o Zoológico e o Jardim Botânico com cerca de 90.000 m2. Mesmo sendo a menor área expositiva comparado com as outras instituições, é importante salientar que se comparássemos com outros aquários brasileiros e da América Latina, as dimensões do espaço expositivo são as maiores encontradas.

Há uma relativa escassez de produção de material de divulgação da biodiversidade por parte das instituições, segundo alguns depoimentos, principalmente devido a falta de recursos financeiros. Todas as instituições como exceção do Museu de Pesca apresentam folder como principal material de divulgação. As informações nele contidas são principalmente de ordem turística. O MP apresenta atualmente um cartão postal com uma foto do esqueleto da Baleia Fin, mas já produziu outros materiais que infelizmente tiveram sua publicação interrompida. 

As coleções encontram-se organizadas principalmente utilizando o critério taxonômico em todas as instituições. Apenas a sala do mar do Museu de Pesca se apresenta com contexto ecológico. No Zôo apesar das informações das placas se referirem aos aspectos ecológicos das espécies, apenas um recinto apresenta algumas características representativas dos ambientes em que vivem os animais. No Acqua Mundo há alguns tanques como os do Manguezal, Amazônia, Pantanal, Recifes de Corais dentre outros que se apresentam com algumas características representativas desses ecossistemas. No Jardim Botânico apenas a Coleção da Mata Atlântica apresenta características de um ecossistema florestal, nas demais as plantas foram dispostas linearmente no plantio respeitando principalmente alguns princípios básicos de cultivo das espécies vegetais.

Não há clareza de diferenciação entre acervo permanente e temporário em nenhuma das localidades. Possivelmente a instituição que mais se aproxima dessa definição é o Acqua Mundo, onde os tanques temáticos (Manguezal, Amazônia, Pantanal, Recifes de Corais e Oceano) são considerados permanentes. Mesmo assim, acredita-se que este parâmetro acaba sendo assumido mais por questões estruturais, como dificuldades de manejo, do que por uma caracterização de importância para a compreensão da(s) idéia(s) que sustenta(m) as exposições. Assim, praticamente todo o acervo de  todos os locais são passíveis ou não de mudanças, conforme vontades administrativas, possibilidades de manejo, disponibilidade de elementos expositivos, de espaço e principalmente de  recursos de financeiros.

Em termos de tamanho e representatividade do acervo deve-se salientar que foi muito difícil encontrar dados atualizados deste quisito em todas as instituições. Inclusive houve conflitos de informações fornecidas nas entrevistas e descritas nos documentos consultados. Mesmo entre documentos encontrou-se discrepância de números nas instituições, por exemplo entre informações de folders e publicados em trabalhos científicos. De qualquer maneira, estabelecendo uma estimativa do número de espécies há uma grande variação, de 25 no Zoológico a 270 no Acqua Mundo. O número de indivíduos também varia de 190 a 2000 nos mesmos locais. Não foi possível obter estes números no Museu de Pesca e no Jardim Botânico. A partir de um levantamento realizado em 1997 conseguiu-se apenas o número de espécies no Jardim Botânico que era de 185 na época. Mesmo os dados do Acqua Mundo são referentes ao ano de sua inauguração (2000) portanto, podem estar superestimados. 

               A maior parte do acervo do Museu de Pesca e do Acqua Mundo e do Jardim Botânico é constituída de espécies brasileiras e há um esforço das equipes técnicas no sentido de manter esta representatividade elevada como amostra significativa da nossa biodiversidade. No Museu de Pesca as maiores salas são dedicadas a exposição de tubarões, mamíferos marinhos e peixes. No Jardim Botânico os maiores canteiros são destinados às coleções da Mata Atlântica e das Palmeiras. No Zoológico do Parque Ecológico Voturuá as maiores áreas expositivas são destinadas aos mamíferos de grande porte como os leões, hipopótamo e onças. No Acqua Mundo o maior tanque é o Oceano com cardumes de grandes peixes, tubarões e raias, seguidos por outros de caráter ecossistêmico como o do Manguezal com caranguejos e lambaris, o da Amazônia com grandes peixes e o do Pantanal com jacarés e tartarugas. Há também grandes espaços destinados aos pinguins, ao tanque do toque com estrelas, ouriços, moluscos, tubarões-lixas e ao lobo marinho. É necessário mencionar que alguns animais são trazidos pela Polícia Ambiental e permanecem no Acqua Mundo e no Zoológico do PEV, por questões de tratamento veterinário ou falta de destinação adequada, descaracterizando eventualmente o planejamento inicial da exposição. Este é o caso do lobo marinho, no Acqua Mundo. No Museu de Pesca o acervo também sofre influência externa a partir de espécimes encontrados mortos nas praias do litoral paulista. Quando isto ocorre e há interesse por parte do Museu em preservar o animal para a exposição, ele é recolhido e preparado para posteriormente se incorporar ao acervo deslocando outros espécimes do seu local original. Como se pode notar, a ênfase das exposições que contemplam animais é dada nos vertebrados, geralmente de grande porte. No caso do Jardim Botânico, a ênfase é dada nas espécies de Palmeiras pela representatividade e interesse econômico que este grupo tem em nosso país e nas de Mata Atlântica pela importância desse ecossistema em termos de conservação regional.

 

C-   A relevância do tema biodiversidade nas propostas educacionais institucionais:

 

A principal atividade educativa encontrada em todas as instituições é a visita monitorada, que pode apresentar variações conforme as solicitações dos grupos envolvidos. A mais solicitada ainda é a que trabalha com a interpretação do acervo de uma forma geral, sem especificidades pronunciadas. As visitas monitoradas caracterizam-se por apresentarem um monitor para cerca de 20 a 40 alunos. Este percorre o acervo descrevendo as espécies da exposição. Seu principal instrumento de comunicação é a linguagem verbal que procura se adequar as diferentes faixas etárias.  Não há ainda nenhuma monitoria diretamente envolvida com o tema biodiversidade. O tema é mencionado eventualmente, mas ainda como parte de um contexto mais amplo. O Acqua Mundo apresenta um jogo que aborda o tema ecossistemas, onde há apresentação das localidades com suas respectivas espécies representativas. Baseando-se na análise do discurso educacional essa é a proposta que mais se aproxima da temática de uma forma lúdica.

Considerando o estilo educativo, observou-se que estão presentes tanto atividades educativas que proporcionam a contemplação, interação onde o participante pode tocar em determinados pontos da exposição e auto interpretação feita a partir da linguagem de apoio (textos de placas e painéis)  disponível e a partir de uma mediação onde o papel do monitor se torna o foco da atenção da visita.

Os objetivos educacionais das instituições também não têm como foco o tema biodiversidade. Assim como nos objetivos institucionais, esta temática aparece indiretamente no discurso do Museu de Pesca e nos materiais escritos do Zoológico, Jardim Botânico e Acqua Mundo. Neste aspecto, são destacadas as espécies raras, ameaçadas de extinção e eventualmente quando o acervo de um determinado grupo de espécies é representativo, ele é enfatizado em termos numéricos e de variedade.

Normalmente os objetivos educacionais são norteados pela demanda pública ou política que geram ações pragmáticas e imediatistas, sem uma reflexão mais profunda da finalidade dos espaços expositivos e de como eles podem influenciar a opinião dos visitantes. Desse modo, freqüentemente os espaços institucionais tornam-se complementares aos escolares, às vezes, sem qualquer identidade própria. O motivo da escolha por este tipo de atuação educacional deve-se a principalmente a três fatores:

1) A falta de uma equipe que permaneça por mais de dois anos desenvolvendo exclusivamente trabalhos educacionais. O trabalho educacional é geralmente executado por estagiários ou voluntários, que permanecem no máximo por 2 anos sob a coordenação de um biólogo(a). Este profissional tem, muitas vezes, que desempenhar também atividades burocráticas e técnicas além das educacionais. A troca constante de membros da equipe durante as mudanças de administração pública faz com que novos objetivos sejam incorporados muito rapidamente, sem ao menos se refletir sobre os anteriormente concebidos. Dificilmente há permanência de tempo suficiente dos profissionais para promover incorporação de um saber ambiental necessário para dar continuidade aos objetivos já implantados; 

2) A forte demanda por um atendimento pontual, por parte dos grupos interessados, que não envolva mais do que uma única visita ao local, realizada preferencialmente em datas ecológicas como o dia da árvore, por exemplo;

Segundo Garcia (2001), também é importante salientar que mesmo quando são feitas inovações relevantes nas propostas educacionais elas frequentemente não se mantém devido a um desencontro entre as políticas públicas e a própria evolução do projeto, dificultando a sua autonomia política e econômica, restringindo assim a sua atuação e perspectivas.

3) A necessidade de visibilidade política do trabalho. O trabalho educacional passa frequentemente por análises quantitativas que são enfatizadas como referenciais do bom andamento das atividades e garantem a manutenção do projeto frente as constantes mudanças administrativas.

Nos textos apresentados que representam a biodiversidade do Zôo há um trecho introdutório num dos tipos das placas que personifica o animal, como se ele contasse a sua própria vida como espécie. No Museu de Pesca e no Acqua Mundo há predominância de uma linguagem técnica científica. O ensino de biologia foi historicamente, principalmente nos anos sessenta e setenta do século XX, impregnado por modos de pensamento baseados no empirismo-lógico que acreditavam no conhecimento científico como o único capaz de afirmar as verdades do mundo.  Esta concepção ainda se faz muito presente em todas as exposições. Apenas no Museu de Pesca se encontra um espaço, a Ala Lúdica, onde se pode dizer que tanto as coisas do mundo estão permeadas, impregnadas de ciência, como a prática científica está também permeada, completamente com as coisas do Mundo.

Não há dispositivos eletrônicos educativos em nenhuma das exposições estudadas.

Excetuando o Museu de Pesca que elaborou um projeto sobre exposição itinerante e chegou a executar um pouco desta prática, este tipo de atividade é praticamente inexistente nos espaços estudados. A justificativa baseia-se principalmente na falta de recursos destinados para esta finalidade, espaço físico para acomodação dos materiais expositivos e transporte até os locais de apresentação.

A publicação de trabalhos educacionais existe, mas ainda é pequena diante do volume de informação gerada nos processos rotineiros diários. Além disso, a produção educacional é menor do que a técnica. Provavelmente, isto ocorre devido a prioridade que geralmente é dada as ações instrumentalizadoras na parte educativa em detrimento do registro das mesmas e a maior valorização do conhecimento técnico produzido, quando comparado ao educacional. Normalmente, os trabalhos produzidos são apresentados sob a forma de painel em eventos que enfocam a área da instituição. Trabalhos em nível de mestrado ou doutorado ainda são muito insipientes, mas alguns estagiários desenvolvem seus trabalhos de conclusão de curso dentro da temática institucional.

A continuidade efetiva do processo educativo nestes espaços é ainda muito difícil pela brevidade de permanência dos participantes, pela ausência de instrumentos adequados para registrar este processo e pela diversidade de público que procura atendimento. Assim em termos de proposta educacional frequentemente predomina a aplicação de jogos e atividades já prontas ou adaptadas para uma determinada finalidade. Geralmente, os grupos atendidos são provenientes de escolas, que pretendem complementar o conhecimento da sala de aula, sem muitas vezes se preocupar com as questões conservacionistas destes locais.

A avaliação existe em todas as instituições excetuando o Jardim Botânico. Ela é baseada principalmente no preenchimento de questionários direcionados geralmente para os professores que recebem o atendimento e se fundamenta mais na opinião a respeito das atividades oferecidas. No Acqua Mundo ainda é feita uma avaliação na forma de testes com predominância de estruturas do conteúdo abordado. Neste mesmo local e no Zôo eventualmente são feitos jogos com os participantes, que também se constituem uma maneira de avaliar o conteúdo aprendido.  No Zoológico ainda é feito relatório interno da própria equipe e reuniões para discussão do andamento e planejamento das atividades. No entanto, como a educação ambiental se fundamenta basicamente na mudança de mentalidade, comportamentos e valores é extremamente difícil avaliar este contexto fortemente subjetivo. (Reigota, 1994). Neste aspecto não há nenhum tipo de avaliação formal sendo feito.

        A coerência em termos de teoria e prática presente nos depoimentos com exceção do Museu de Pesca ainda está longe de ser uma realidade. Considerando que a educação se baseia também em exemplos práticos do discurso teórico, isto se torna um grande problema a ser superado. Diante da realidade política, econômica, social, cultural e, sobretudo histórica em que vivemos considera-se muito importante a percepção, por parte das instituições, de que a educação não formal é um campo propício para a criação de novas propostas e ações pedagógicas, devendo receber maior atenção em suas características peculiares de gestão participativa e de ação pedagógica. Para tanto, é necessário um maior empenho neste campo de investigação, já que ainda são poucos os trabalhos no Brasil sobre este assunto, sendo frequente o desconhecimento, até por parte dos educadores institucionais, da utilização do termo educação não formal associado à prática pedagógica que desempenham.

 

CONCLUSÃO

Nos locais estudados o foco educativo concentra-se prioritariamente na apresentação expositiva biológica e ecológica das espécies animais e vegetais. Acredita-se que, além disto, a educação realizada nestes espaços deveria enfatizar os motivos pelos quais eles foram construídos e devem ser conservados bem como sua importância estética, histórica, ecológica e humana para o passado, presente e futuro.  A maioria das atividades oferecidas nos espaços estudados se baseiam principalmente na transmissão de conhecimentos científicos relacionados a biologia e ecologia das espécies e sua conservação da natureza. Essas atividades têm o seu valor, mas são destituídas dos aspectos políticos, econômicos, culturais e sociais que podem até complementar um programa de educação ambiental, mas não constituir sua prioridade.

 Neste aspecto, acredita-se que todas as instituições estudadas seguem um referencial histórico de tentar assumir um espaço complementar conteúdistico do ensino formal e direcionam boa parte dos seus esforços neste sentido, sem às vezes analisar quais são suas reais possibilidades para atingir tal objetivo e se é mesmo esta a sua vocação.

Considerando isto, é preciso ter cuidado para não se escolarizar as instituições. Acredita-se que o objetivo maior destes locais que expõem biodiversidade é o de despertar curiosidades, paixões, possibilitar situações investigadoras, gerar perguntas que proporcionem a sua evolução e não somente dar respostas às questões que são colocadas pelo ensino formal.  

Segundo Garcia (2001), a prática dos educadores de espaços não formais acaba muitas vezes se aproximando muito do contexto educacional da escola. O fato dos projetos educacionais dependerem geralmente de contato com a secretaria de educação e a falta de formação em trabalhos educacionais não escolares nesta área acaba por introduzir aspectos formais limitando uma visão mais ampla que a educação não formal demanda.

Dentro desta realidade, acredita-se que os profissionais envolvidos no trabalho educacional realmente se esforçam para desempenhar um bom trabalho. No entanto, é preciso estimular o debate sobre o real papel educacional destas instituições, o que ajudará a repensar continuamente seus objetivos como espaços não formais de educação, já que frequentemente há uma dificuldade por parte dos educadores em perceber outras dimensões do trabalho que não sejam as técnicas relativas a sua área de atuação, deixando de lado uma visão mais ampla, principalmente relacionada a importância do convívio social e da participação no aprendizado. (Garcia, 2001). 

É importante salientar que as instituições que expõem biodiversidade devem servir de exemplo e estar conscientes de que são modelos para o público. Se elas se propõem a passar uma mensagem conservacionista, precisam estimular mudanças de atitudes e comportamentos e, para que isto ocorra é necessário que os projetos educativos oferecidos possam dar oportunidades aos participantes de avaliarem suas atitudes e comportamentos, conhecendo o seu lugar no ecossistema e buscando maneiras de reduzir o seu impacto sobre o ambiente a partir de uma nova perspectiva, a da biodiversidade. Se aceitarmos a ideia de que o mundo é aquele que também construímos e interferimos, a partir do nosso próprio repertório, podemos criar o senso de responsabilidade sobre nossas ações diante dele e, dessa forma, ajudar a conservá-lo. 

A oportunidade de explorar o Zoológico do Parque Ecológico Voturuá, o Jardim Botânico, o Museu de Pesca ou o Acqua Mundo utilizando a temática da biodiversidade como foco pode proporcionar oportunidades para acompanhar as mudanças do meio, percebendo os seus ciclos, suas relações de interdependência e sua história e nosso relacionamento com ela. A importância do sentimento de pertencimento a esse meio é fundamental para estimular sua conservação, proporcionar a visão ambiental do todo e estimular o ensino da biodiversidade agregando valores a sua temática.

O uso de espaços não formais de educação como os estudados nesta pesquisa podem gerar a oportunidade de aplicação dos conteúdos escolares auxiliando na compreensão dos mesmos. Mas, não é só isso. A razão instrumental é muito eficaz para resolver questões técnicas, mas está longe de ser suficiente para resolver problemas humanos. Os problemas ambientais são essencialmente humanos, e só serão superados se incluirmos uma nova maneira de abordá-los. (Mendonça; Neiman, 2003).

Para a construção de um potencial pedagógico envolvendo a temática da biodiversidade é necessário valorizar o papel do sentir, do intuir, do construir, do fazer parte, trabalhando a importância da vivência nas ações educativas e na sua própria relação com a cultura. Neste aspecto acredita-se que as instituições estudadas possuem principalmente no aspecto expositivo (recursos visuais, auditivos, tácteis, olfativos e gustativos) o potencial para o desenvolvimento da temática da biodiversidade. Contudo, no aspecto pedagógico é preciso que ele seja aprimorado através de um planejamento estrutural que envolva além da área educacional, os setores técnicos e administrativo, buscando uma clareza maior nos objetivos institucionais. Pois, atualmente o papel mais enfatizado perante a mídia destas instituições é o de entretenimento, enfocando suas múltiplas atrações, constituídas por seres vivos, em suas diversas formas de conservação.

Além disso, é necessário conhecer melhor as o público alvo assim como suas representações sociais para promover a inclusão de valores que estimulem o indivíduo à aliar a questão da conservação ambiental com o desenvolvimento humano. Assim, a participação das pessoas envolvidas é fundamental. A mera transferência de informação não motiva a participação da sociedade na conservação da biodiversidade (LERDA; EARLE, 2007)

Diante do desafio de concretizar esta mudança, é importante ressaltar que estamos em pleno processo de construção de um saber-fazer ambiental conservacionista e neste percurso certamente estamos cometendo erros e acertos. Os erros precisam ser vistos como etapas de aprendizagem. Assim sendo, pode-se dizer que estas instituições apresentam uma história de percursos em termos de exposição da biodiversidade. E que apesar de não desenvolverem todo o seu potencial pedagógico, estão de alguma maneira contribuindo para a construção de um saber-fazer ambiental mais promissor com relação à questão da biodiversidade e sua conservação na atualidade.

 

referências bibliográficas

 

Chizzotti, A. Pesquisa em Ciências Humanas e Sociais. 6a ed. São Paulo: Cortez, 1991.

Council for Environmental Education. Educating for life Guidelines for Biodiversity Education. United Kingdown: Hobsons Academic Relations, 1997.

GARCIA, V.A. A educação não-formal no âmbito do poder público: avanços e limites. In: SIMSON, O. R. de M. von; PARK, M. B.; FERNANDES, R. S. Educação não formal: cenários da criação. Campinas: Unicamp/Centro de Mémória, 2001. p.29-38.

Krapas, S; Rebello, L. O perfil dos Museus de Ciência da Cidade do Rio de Janeiro: A perspectiva dos profissionais. Revista Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências (RBPEC) 2001; 1: 69-85.

LERDA,D.; EARLE, S. W. Educação ambiental para a conservação – desafios e lições. In: JUNQUEIRA, V.; NEIMAN, Z. (orgs.) Educação ambiental e conservação da biodiversidade. São Paulo: Manole, 2007. p. 91-102.

Lewinsohn, T. M; Prado P. I. Biodiversidade Brasileira Síntese do Estado Atual do Conhecimento. São Paulo: Contexto Acadêmica, 2002.

MENDONÇA, R.; NEIMAN, Z. À sombra das árvores: transdisciplinaridade e educação ambiental em atividades extraclasse. São Paulo: chronos, 2003.

REIGOTA, M. O que é educação ambiental. 2. ed. São Paulo: Brasiliense Coleção Primeiros Passos, 1994.

SIMSON, O. R. D. M. V; PARK, M. B; FERNANDES, R.S. Educação Não Formal: Cenários da Criação. Campinas: Unicamp, 2001.

THOMAS, K. O homem e o mundo natural. São Paulo:Companhia das Letras, 1988.

Wilson, J.Educação Ambiental em Jardins Botânicos: Diretrizes para o desenvolvimento de Estratégias Individuais. Rio de Janeiro: Rede Brasileira de Jardins Botânicos, 2003.

 

 

Figuras:

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Zoológico do Parque Ecológico Voturuá

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Jardim Botânico Municipal de Santos Chico Mendes

 

 

 

 

 


 

 

 

 

 


 

Acqua Mundo

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Ilustrações: Silvana Santos