Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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31/05/2013 (Nº 44) EDUCAÇÃO AMBIENTAL E ESCOLA: UMA UNIÃO CONTRA O TRÁFICO DE ANIMAIS SILVESTRES
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EDUCAÇÃO AMBIENTAL E ESCOLA: UMA UNIÃO CONTRA O TRÁFICO DE ANIMAIS SILVESTRES

EDUCAÇÃO AMBIENTAL E ESCOLA: UMA UNIÃO CONTRA O TRÁFICO DE ANIMAIS SILVESTRES

 

João Fabrício Mota Rodrigues [fabriciorodrigues303@gmail.com]

Graduado em Licenciatura em Ciências Biológicas (UFC)

Núcleo Regional de Ofiologia da Universidade Federal do Ceará – (NUROF-UFC)

Programa de Pós-Graduação em Ecologia e Recursos Naturais - Universidade Federal do Ceará.

Av. Humberto Monte, s/n - Pici, Bloco 902 - CEP 60455-970- Fortaleza – CE

Telefone: (85)33669801

Raquel Crosara Maia Leite [raquelcrosara@hotmail.com]

Graduada em Ciências Biológicas (UFU) e Doutora em Educação (UFSC)

Universidade Federal do Ceará - Departamento de Biologia – Laboratório de Ensino de Biologia (LEBIO)

Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira

Av. Mister Hull, s/n – Pici, Bloco 906 – CEP 60455-760 – Fortaleza - CE

 

Resumo

Este trabalho objetiva relatar uma atividade de educação ambiental abordando o tráfico de animais silvestres desenvolvida numa escola da rede pública de Fortaleza. Uma mesma palestra foi ministrada separadamente para três turmas do 7° Ano do Ensino Fundamental. Ao final da apresentação, era pedido aos alunos que entregassem um desenho ou uma pequena produção textual sobre algo relacionado ao tráfico de animais silvestres. Ao todo, noventa e um alunos assistiram às palestras, dos quais sessenta e dois entregaram a atividade pedida. As turmas comportaram-se de modo diferenciado, porém, participativo, e diversas perguntas surgiram ao longo da apresentação. Os alunos trouxeram muitos conhecimentos acerca desse assunto provenientes dos meios de comunicação e também se apresentaram muito envolvidos com o tema.

Palavras-chave: Intervenção pedagógica, Ensino fundamental, Comércio ilegal de animais, biodiversidade, biopirataria.

 

Introdução

 

              O tráfico de animais silvestres é uma atividade muito comum e lucrativa frequentemente encontrada no Brasil. Os lucros desse comércio são gigantes, os danos ao meio ambiente, ainda maiores, e as tentativas de solução desse problema parecem não surtir efeito. Entretanto não se pode visualizar essa problemática como sem solução. A educação ambiental pode ser uma proposta viável para tentar resolver essa situação. Os trabalhos de Carneiro et al. (2009), Skrabe e Medina (2009) e IBAMA (2008) tem consonância com essa idéia. Desse modo, é importante investir nessa perspectiva e, assim, tentar sanar o problema do tráfico de animais por meio de uma união potencialmente poderosa: educação ambiental e escola.

A fim de tentar contribuir para uma possível solução do grande problema do tráfico de animais silvestres, faz-se necessário um trabalho de educação ambiental junto às escolas, de modo a conscientizar aqueles considerados por muitos como o “futuro da nação”: as crianças e os jovens.  Uma vez conscientizados e capazes de refletir criticamente sobre aquele problema, esses indivíduos ainda podem agir como multiplicadores das idéias desenvolvidas, expandindo, assim, os benefícios da atividade realizada para outras esferas da sociedade.

Esse trabalho tem como objetivo relatar uma atividade de educação ambiental desenvolvida em uma escola da rede pública estadual cearense de ensino com o tema tráfico de animais silvestres e discutir os resultados encontrados a partir dos materiais entregues pelos alunos e pelas observações registradas a partir da atividade de intervenção.

 

A biodiversidade e o tráfico de animais silvestres

 

O Brasil é um dos países mais ricos em biodiversidade, ocupando no ranking mundial, por exemplo, a primeira posição em número de espécies de anfíbios (875 espécies) (SBH, 2010) e a segunda posição em número de espécies de répteis (721 espécies) (Bérnils, 2010). Lewinsohn (2006) ainda afirma que a ictiofauna e a mastofauna brasileira também são as mais diversas do mundo, sendo a avitofauna a terceira mais rica. Entretanto, toda essa diversidade de fauna, assim como a de flora, e outros recursos naturais tem sido alvo de uma intensa exploração, a qual não respeita períodos de reprodução, práticas de reflorestamento, desenvolvimento sustentável ou qualquer outra medida que busque minimizar os impactos sobre o meio ambiente (IBAMA, 2008).   

O tráfico de animais silvestres é uma prática antiga na história brasileira e atualmente se sabe que é geradora de uma grande fonte de riquezas para seus praticantes. (RENCTAS, 2001). Acerca de sua antiguidade, Melatti (2007) destaca que os índios, ao conviverem com os colonizadores, começaram a criar aves não apenas para admirá-las, mas também para comercializá-las. Esse tráfico é o terceiro maior do mundo em lucratividade, perdendo apenas para o de drogas e o de armas. O Brasil é responsável por cerca de 10% do dinheiro movimentado pelo tráfico de animais silvestres em todo o mundo, o que corresponde a, aproximadamente, dois bilhões de dólares (Jornal do Brasil Online, 2004). 

Os resultados dessa prática são maus-tratos e mortes de milhões de animais silvestres em virtude do desejo de lucro fácil de alguns indivíduos (IBAMA, 2008). Além desses danos diretos, também há de se lembrar do desequilíbrio ecológico causado pela retirada irresponsável desses animais de seus habitats. Sabe-se que o tráfico de animais é um dos maiores responsáveis pela redução de abundância de espécies numa região, perdendo, apenas, para o desmatamento (Ribeiro & Silva, 2007).

 

Educação ambiental: uma solução possível?

 

A educação ambiental é uma das alternativas de tentativa de solução para o problema estudado. Diminuir o máximo possível o “analfabetismo ambiental” ou falta de informações acerca dos problemas ambientais, o qual leva as pessoas a realizarem atos danosos ao ambiente sem ter conhecimento de sua ação nociva, é uma tentativa de solução para o tráfico de animais silvestres, assim como para os muitos outros problemas ambientais conhecidos atualmente (Latorre & Miyazaki, 2005). Giovanini (2009) aponta a educação ambiental como importante meio de conscientizar a sociedade a não comprar ilegalmente animais silvestres. Essa atividade educativa e a regulamentação de criadores comerciais de animais silvestres são consideradas pelo autor acima como formas de tentar diminuir a grande demanda de espécimes, a qual suporta o tráfico.

A educação ambiental pode ser formal, por meio de cursos que buscam principalmente a abordagem interdisciplinar dos problemas ambientais, ou não-formal e informal, nos quais os conhecimentos são obtidos no dia-a-dia, seja pelos meios de comunicação, seja por uma simples conversa na rua (Mariga, 2006). Segundo essa autora, essa modalidade informal é importante por formar senso crítico nas populações locais e por permitir a valorização dos conhecimentos populares. Jacobucci (2008) apresenta visão semelhante acerca dessa diferença ao propor que a modalidade formal seja aquela desenvolvida no espaço escolar, enquanto a não-formal, em qualquer outro local, tal como museu, zoológico, parque botânico, dentro outros.

Segundo pesquisa realizada por Loreiro & Cossío (2007), a educação ambiental teve grande expansão nas escolas brasileiras entre os anos de 2001 e 2004. Essa temática era desenvolvida nas instituições de ensino de diferentes modos: realização de projetos em parceria com a comunidade ou com empresas; inserção do tema dentro das outras disciplinas, dentre outros. Loreiro & Cossío também observaram que as escolas do Sul e Sudeste do Brasil já trabalhavam com a educação ambiental há aproximadamente 10 anos, enquanto aquelas das regiões Norte e Nordeste começaram suas atividades nessa área mais recentemente.

Antes de iniciar a apresentação dos trabalhos realizados em educação ambiental convém informar acerca da escassez de material e pesquisas que abordam a importância da educação ambiental como ferramenta para combate do tráfico de animais silvestres. Sulaiman (2011) discute o papel educador da mídia em dez temas e problemáticas ambientais consideradas atuais os quais foram divulgados em uma revista de educação ao longo de um ano. Dentre esses tópicos discutidos, o tráfico de animais silvestres não estava presente, o que demonstra a pouca atenção dada ao tema. Portanto, o presente trabalho também visa enriquecer esse quadro.

Latorre e Miyazaki (2005) realizaram uma pesquisa com frequentadores da Fundação Parque Zoológico de São Paulo, a qual constatou uma grande correlação entre a falta de conhecimento dos problemas ambientais, assim como de temas e assuntos relacionados ao meio ambiente, e atitudes incorretas em relação à aquisição e ao manejo de animais silvestres. Ao final do trabalho, os autores ainda enfatizam ser também papel da escola propiciar aos alunos conhecimentos adequados acerca dos recursos naturais e de seu uso sustentável, assim como noções de que a natureza é um bem comum a todos.

O IBAMA (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis) realizou em 2008 uma campanha que visava conscientizar o público acerca das consequências do tráfico de animais silvestres. Esse projeto possuiu diferentes tipos de atividades. Uma delas tinha como slogan “Isto acontece porque você compra”, na qual diversos cartazes ou banners foram confeccionados contendo fotos de animais oriundos daquele comércio ilegal. O principal objetivo dessa atividade era realmente chocar as pessoas e mostrar o quão fortes são as conseqüências daquela atividade. Outra parte da campanha consistiu no projeto “Escola é o bicho”, no qual foram realizadas palestras em escolas públicas e particulares para crianças de, em média 10 a 12 anos, a fim de mostrar-lhes a problemática do tráfico de animais silvestres. Também foram desenvolvidas atividades que buscavam preparar os educadores para que eles pudessem trabalhar esse tema com os alunos.

A partir da participação na campanha desenvolvida pelo IBAMA, Carneiro et al. (2009) avaliaram os resultados obtidos por esse projeto. O principal ponto abordado foi uma análise dos desenhos produzidos pelas crianças que assistiam às palestras, nos quais foi possível observar o que elas entendiam acerca do tema. O estudo ainda indicou a necessidade da realização de mais campanhas de educação ambiental, tanto formais quanto informais, a fim de dar continuidade ao combate daquele comércio ilegal por meio da ação conscientizadora do público mais jovem.

Skrabe e Medina (2009) também buscaram soluções para o tráfico de animais silvestres por meio da educação ambiental. O estudo era composto de duas fases: na primeira, em virtude da carência de material bibliográfico nesta área, foi feito um diagnóstico acerca da situação do problema no estado (Rio Grande do Sul); na segunda, buscava-se a formação de um Plano de Educação Ambiental para tentar resolver o problema do comércio ilegal na região. O diagnóstico foi realizado por meio de entrevistas realizadas com criadores de animais silvestres, pet shops, dentre outros estabelecimentos que trabalhassem com animais silvestres. Convém dizer que a entrevista foi bem-vinda pelos entrevistados e que gerou um material muito importante para a análise posterior. Na segunda fase, ocorreu uma reunião no intuito de avaliar os resultados obtidos na pesquisa. Nela foram propostas medidas tais como uma grande campanha de divulgação da problemática analisada e de suas conseqüências, criação de um blog abordando o tema e a realização de reuniões posteriores para discutir o encontrado nas entrevistas, dentre outras propostas.

 

Metodologia

 

Esta pesquisa pode ser classificada como qualitativa, pois, nesse tipo de trabalho, o pesquisador realiza suas atividades junto ao grupo estudado, em virtude de saber a importância do contexto que engloba o objeto de estudo para melhor entender a situação analisada. Ao mesmo tempo em que se tem noção dessa importância, também se sabe da necessidade do contato direto com o público para poder obter suas idéias tais quais são formuladas por eles (Lüdke & André, 1986).  A abordagem qualitativa “trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes” (Minayo, 2009, p. 21). Com este entendimento, nesta pesquisa foram analisados os diários de campo com registros da intervenção e do material produzido pelos estudantes e entregues ao final de cada atividade.

A escola onde o trabalho foi realizado pertence à rede pública e está localizada na cidade de Fortaleza. Outro fator importante foram experiências anteriores com estágios nessa instituição, nos quais ela recebeu os estagiários com muito entusiasmo. Conversou-se inicialmente com o coordenador da instituição, ao qual foi entregue um ofício que formalizava a idéia da atividade. Posteriormente, conversou-se com os professores de ciências de modo a decidir como seria realizada a atividade.  

              A escola na qual essas palestras foram ministradas realizava um programa de atividades relacionadas ao meio ambiente. Ao longo dos meses de agosto e setembro de 2010, foram exibidos alguns filmes relacionados aos problemas ambientais. Em sala de aula, os professores eram instruídos pela coordenação da escola a realizarem pequenos debates com os alunos acerca do meio ambiente e seus problemas derivados da atividade humana. Ainda havia um concurso no qual os alunos que apresentassem as melhores produções textuais falando sobre esse tema ganhariam viagens para passeios ecológicos. Desse modo, as palestras foram inseridas e articuladas em um contexto mais amplo.

Uma intervenção pedagógica, organizada na forma de uma palestra com o tema “Tráfico de animais silvestres” foi ministrada em três turmas diferentes de 7° Ano do Ensino Fundamental daquela escola durante o mês de Setembro de 2010. A escolha dessa série foi feita em virtude do fato de seu programa curricular incluir o conteúdo “Animais”. Desse modo, a palestra realizada estaria em sintonia com o conteúdo de ciências abordado naquela série. Essa concordância possibilitaria articulações entre a palestra e as aulas de ciências e diminuiria possíveis empecilhos por parte dos educadores e da escola para realização da atividade. As palestras foram realizadas por meio de uma apresentação desenvolvida no programa Microsoft Office Power Point 2007, continham textos e figuras e duravam cerca de 50 minutos. Convém reforçar que a mesma apresentação foi ministrada nas três turmas que participaram das atividades.

No planejamento da intervenção, preocupou-se em permitir e incentivar a participação dos estudantes, para não deixar que a atividade fosse centrada no palestrante e se tratasse de uma simples transmissão de conhecimentos. Considerou-se que o aluno é sujeito ativo de aprendizagem, possuidor de saberes e vivências que são importantes no processo de construção do conhecimento. Desta forma, buscou-se estimular o diálogo. Para tanto, a apresentação começava com algumas perguntas a serem feitas aos alunos, nas quais se poderia saber um pouco do conhecimento prévio dos estudantes acerca do tema que seria trabalhado. Em seguida, era debatido o conceito de animal silvestre, assim como a diferenças entre esses animais e os domésticos. Posteriormente, era abordado o tema “tráfico de animais silvestres” propriamente dito, trabalhando a definição dessa atividade, suas conseqüências para o meio-ambiente, as punições para aqueles que participavam de alguma forma desse tráfico e o que poderia ser feito para diminuir ou tentar resolver esse problema. Ao final da palestra, também era informado aos alunos como proceder para poder criar legalmente um animal silvestre em casa.  

Após o término das palestras, foi pedido aos alunos que escrevessem uma pequena redação de caráter informal ou que fizessem um desenho acerca do tema trabalhado, permitindo, assim, aos estudantes escolherem a forma na qual desejassem expor suas idéias. Eles tiveram liberdade para entregar ou não a atividade proposta, assim como para escolher a parte do tema apresentado que quisessem trabalhar. Os  alunos foram avisados no início das atividades sobre a pesquisa que estava sendo realizada por meio daquele trabalho. Também lhes foi garantido o anonimato das respostas e dos materiais produzidos por eles.

Anotações sobre as palestras realizadas foram feitas em um caderno de campo, no qual eram registradas características básicas das palestras como número de participantes e números de desenhos entregues, bem como informações acerca da participação de alunos e professores na apresentação, do interesse mostrado por eles ao tema, dentre outros fatores. Uma visão geral das respostas apresentadas por eles ao questionamento realizado no início da palestra também era registrada nesse guia. Esse material foi analisado posteriormente.

 

Resultados e discussão

 

A primeira turma a assistir à apresentação era do turno da tarde e será denominada posteriormente como “Turma Manga”, e a palestra teve início aproximadamente às 17 horas, correspondendo à última aula do dia. Havia vinte e sete alunos em sala, dos quais dezoito entregaram a atividade proposta ao final da apresentação. Essa turma foi a que apresentou o pior comportamento quando comparada às outras participantes do trabalho. Talvez o horário no qual a palestra foi realizada fosse um momento de mais cansaço dentre os alunos, devido ao fato de ser a última aula do dia. A apresentação foi realizada sob constantes interrupções para pedir a contribuição dos estudantes. Houve muita conversa por parte deles e muitas perguntas não muito relacionadas ao tema. Alguns alunos mostraram um relativo descaso ou indiferença quanto ao assunto trabalhado. A professora dessa turma comentou que esse grupo parecia não se importar muito com os animais. Apesar dessas dificuldades, a apresentação foi realizada com sucesso antes do término da aula. Essa professora foi a mais receptiva e entusiasmada com a proposta das palestras, não impondo dificuldade para a sua realização e pedindo para que atividades desse tipo fossem desenvolvidas com mais frequência.

A segunda turma a assistir à apresentação, a qual será chamada de “Turma Melancia”, também era do turno da tarde, porém a palestra teve início aproximadamente às 13 horas, correspondendo à primeira aula do dia. Havia trinta e quatro alunos em sala, dos quais dezoito entregaram a redação ou o desenho proposto. Diferentemente da turma anterior, esta se comportou melhor, facilitando o andamento da atividade, que pode ser desenvolvida sem muitas interrupções. Muitas perguntas relacionadas ao tema apresentado foram feitas, e os alunos mostraram-se bem empolgados com o assunto discutido. Eles também apresentarem muitos conhecimentos obtidos por meio da mídia (televisão, principalmente). Em virtude dessa maciça participação dos alunos, esta palestra teve duração superior à planejada adentrando um pouco no período da aula seguinte. A professora da turma foi bastante receptiva quanto à realização do trabalho, porém não tão entusiasmada quanto àquela citada anteriormente. 

A terceira e última turma a assistir à apresentação era do turno da manhã e será chamada de “Turma Morango”, e a palestra teve início aproximadamente às 10 horas, correspondendo à quarta aula do dia ou à primeira logo após o intervalo. Havia trinta alunos, dos quais vinte e seis entregaram a atividade pedida. Essa turma também apresentou bom comportamento, que facilitou a realização da apresentação. Os alunos mostraram-se também muito interessados no tema proposto, perguntando diversas dúvidas sempre que possível. Mesmo antes de a apresentação começar, os estudantes já haviam conversado com o palestrante e tentado interagir com ele. Uma grande concentração de alunos foi percebida na região anterior da sala, enquanto alguns outros permaneceram em pontos mais posteriores do recinto. Nesta turma, a professora participou da apresentação por meio de exemplos, diferentemente das outras educadoras, as quais não interferiram nas palestras. A participação expressiva da turma influenciou para que a apresentação terminasse exatamente no final da aula, porém ainda foram necessários alguns minutos para que os alunos fizessem os desenhos e/ou redações. A professora dessa turma foi a que mais dificultou a realização da palestra. Ela argumentou que estava muito difícil ministrar todo o conteúdo e que precisava terminá-lo para poder aplicar a prova, entretanto comprometeu-se a ceder duas de suas aulas em turmas diferentes para que as apresentações pudessem ser feitas. Apesar disso, um desses momentos ainda não foi cedido, segundo ela, por falta de tempo para terminar conteúdo devido à realização por parte da escola de atividades não previstas. Enquanto aguardava os alunos concluírem os desenhos e/ou produções textuais, ela comentou que sabia da importância de aulas diferentes como aquelas e que as faria com frequência se tivesse mais tempo.

O posicionamento das professoras quanto à realização das palestras foi diversificado, o que mostra um pouco da heterogeneidade existente entre suas idéias. Na turma Manga, existe uma professora que parece não se prender a currículos fechados e, muitas vezes, descontextualizados, os quais não abrem espaços para os estudantes analisarem problemas do dia-a-dia. Assim, ela apresenta-se mais aberta a atividades extracurriculares, como as palestras realizadas, que possam contribuir para uma formação dos alunos. Desse modo, essa educadora aproxima-se da idéia que Cavalcante (2005) expõe em seu estudo, em que ele enfatiza a importância de levar as discussões de temas ambientais para a sala de aula, de modo que os estudantes possam refletir e formar idéias próprias acerca de um daqueles assuntos. Já na turma Morango, parece haver uma professora ainda muito ligada aos currículos convencionais estabelecidos pela escola, causando relutância em aceitar novas atividades que fogem um pouco dessa esfera mais segura abordada pelos livros didáticos. Quanto à professora da turma Melancia, em virtude da pouca manifestação da parte dela, não foi possível fazer maiores análises. Entretanto, a apatia pode ser considerada como um indicativo de indiferença frente à atividade desenvolvida.

Belo & Paranhos (2011) também encontraram posicionamento diversificado dos professores quanto à aplicação de atividades de educação ambiental no espaço escolar. A falta de tempo em sala de aula foi um fator citado pela professora da turma Morango como empecilho para a realização de atividades diferenciadas, o qual também foi evidenciado no estudo acima. Percebe-se que os professores também se sentem pressionados a “cumprir o currículo” determinado no período do planejamento anual da escola e temem que a realização de tais atividades possa dificultar essa programação. Esse problema também foi observado por Augusto e Caldeira (2007). Ainda sobre as educadoras, a baixa participação dessas ao longo das apresentações permite a formação de duas hipóteses para explicar esse fato: elas não queriam interferir na atividade realizada com o receio de atrapalhá-la ou elas não se sentiam muito à vontade para discutir o tema. Apesar de não se ter investigado este ponto nesta pesquisa, a professora da turma C parece ter superado esse obstáculo e fez contribuições para a intervenção.   

Abaixo segue uma breve lista dos tipos de perguntas mais frequentemente feitas pelos estudantes nas palestras:

- Como se obter um animal silvestre legalmente?

- Quais são os requisitos para se obter um animal silvestre legalmente?

- O que fazer quando encontrar um animal silvestre fora de seu habitat?

- Como proceder quando não for mais possível criar o animal silvestre?

              Como se pode ver, as perguntas mais realizadas na apresentação confirmam que muitas crianças têm curiosidade sobre o tema e que elas não sabem os meios corretos para criar animais silvestres. Esses fatos mostram o quanto a educação ambiental ainda deve agir no sentido de fazer com que esse público perceba as diferenças entre animais silvestres e domésticos e o motivo pelo qual não se deve criá-los em casa. Para aqueles que, mesmo sabendo das dificuldades, ainda desejam criar animais silvestres é muito importante mostrar-lhes as consequências da aquisição ilegal por meio de feiras e vendedores irregulares. Segundo Latorre e Miyazaki (2005), muitas vezes as pessoas agem de modo errado por não ter o conhecimento adequado, assim propiciar essa informação correta e esclarecer o máximo possível de dúvidas acerca do tráfico de animais silvestres é um meio válido de combate a essa prática.  

              Segue abaixo um quadro com um breve resumo das turmas visitadas:

 

Quadro 1 Dados gerais das palestras. Frequência dos alunos nas palestras e o número de trabalhos entregues.

Turma

Número de alunos presentes

Número de alunos que entregaram o material pedido

Percentual daqueles que entregaram a atividade

Manga

27

18

67%

Melancia

34

18

53%

Morango

30

26

87%

Total

91

62

69%

 

Esses valores são semelhantes aos apontados por Carneiro et al. (2009) em sua pesquisa, na qual a porcentagem total dos alunos que entregaram o material pedido foi de 63,69%. Esses autores ainda ressaltam que uma possível explicação para que alguns alunos não entregassem o trabalho era o fato de eles estarem em uma fase na qual se tornam muito críticos em relação a suas produções de modo a considerá-las não muito bonitas ou muito “infantis”. Ainda há de considerar que o tema pode não agradar a todos os estudantes em sala, assim, aqueles que não se interessam pelo assunto, muito provavelmente também não realizam a atividade em virtude dela ser opcional e não propiciar àqueles que a fazem benefícios tradicionais no ambiente escola benefícios (nota em avaliação).

Também se poderia relacionar essa quantidade de material entregue com a participação e empolgação dos alunos da turma. Essa relação mostrou-se positiva para as turmas A e C, porém na turma B, em que houve grande participação dos estudantes, a quantidade de atividades entregues foi pequena. Esse resultado foi o contrário do que se esperava, afinal, muito interesse na palestra dever-se-ia refletir em muita vontade de participar da atividade pedida.  Entretanto, convém lembrar as possíveis explicações dadas anteriormente e que cada turma por ser composta por diferentes estudantes possui diferentes características. Talvez para a turma B fosse mais fácil e atrativo expor suas idéias oralmente a colocá-las no papel. Outro motivo que pode explicar o fato de nem todos os estudantes entregarem a atividade é a possibilidade de eles sentirem-se envergonhados em participar da pesquisa científica, pois eles foram avisados acerca dela no início da palestra.

              O material entregue pelos alunos apresentou conteúdo bastante diversificado. A maioria produziu trabalhos que continham desenhos e figuras em conjunto. Dentre os contextos retratados pelos estudantes, tiveram destaque a proibição, a retratação do tráfico e soluções para esse problema. Um aluno, por exemplo, escreveu acerca da importância da formulação de leis mais rígidas para os praticantes desse comércio legal e abordou uma parte do problema social do tráfico de animais silvestre. Ele evidenciou a importância de oferecer alternativas de fonte de renda para a população responsável por retirar os animais da natureza e que sustentava a si e a família com essa prática.

Esse material trouxe várias idéias e temas frequentemente vinculados pela mídia, enfatizando a influência dos meios de comunicação como produtores de educação ambiental não-formal. Um exemplo dessa participação foi a representação de casos de serpentes contrabandeadas em aeroportos e transportadas dentro de meias; casos de contrabandos de macacos e mesmo notícias referentes à estatísticas desse comércio ilegal. Esse fato reforça a importância dada por Giovanini (2009) à educação ambiental como potencial combatente do tráfico de animais, assim como enfatiza o impacto da modalidade não-formal, segundo Mariga (2006), no dia-a-dia da população.  

 

Considerações finais

 

              A atividade de educação ambiental, a qual consistiu na realização das palestras sobre o tema “Tráfico de Animais Silvestres” numa escola da rede pública de Fortaleza, foi realizada com sucesso, sendo seu relato importante para se observar o conhecimento e o envolvimento dos alunos em relação ao tema. Eles mostraram-se muito animados e receptivos às idéias trabalhadas e discutidas em sala e apresentaram muitas dúvidas em relação ao assunto discutido. Evidenciou-se grande influência dos meios de comunicação sobre o que os alunos entendiam do tema. Muitas informações presentes na palestra, como, por exemplo, os problemas ecológicos derivados do tráfico ilegal de animais e algumas medidas para tentar diminuir esse comércio ilegal, eram familiares de alguns alunos. Desse modo, o trabalho realizado possibilitou a integração dessas informações presentes na memória dos estudantes com as novas trabalhadas em sala durante a palestra. Essa pesquisa também mostra que é possível articular experiências afins com o projeto pedagógico da escola de modo satisfatório. Por fim, é importante ressaltar a importância da continuidade das atividades de educação ambiental, a fim de evitar que elas sejam eventos isolados e, consequentemente, com menor impacto.

             

Referências bibliográficas

 

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Ilustrações: Silvana Santos