Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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04/09/2012 (Nº 41) EDUCAÇÃO E PEDAGOGIA AMBIENTAL COMO CONCEITO E PROPOSTA ESCOLAR
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Educação Ambiental em Ação 41

EDUCAÇÃO e pedagogia AMBIENTAL COMO CONCEITO E PROPOSTA ESCOLAR

 

 

Alysson Rodrigo Fonseca

Eng. Agrônomo, Especialista em Biologia, mestre em Entomologia, doutor em Ciências pela Universidade Federal de Lavras – UFLA. Professor pesquisador da Fundação Educacional de Divinópolis, FUNEDI/UEMG. E-mail: arodrigo@funedi.edu.br. Endereço: Rua Goiás, 492, apt 23, centro, Divinópolis, MG. CEP:35500-000. Tel: (37) 99058194.

 

Fernanda Alves Zuquim

Bióloga, Mestre em Educação, Cultura e Organizações Sociais pela Universidade do Estado de Minas Gerais/ UEMG/Fundação Educacional de Divinópolis; Docente e Diretora do Colégio Anglo/ Arcos, MG. E-mail: fernandazuquim@yahoo.com.br. Endereço: Rua Israel Pinheiro, 89, Brasília. Arcos – MG. CEP 35588-000. Tel: (37) 99532958

 

Batistina Maria de Sousa Corgozinho

Socióloga, Doutora em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG. Professora pesquisadora da Fundação Educacional de Divinópolis, FUNEDI/UEMG. E-mail: bcorgozinho@funedi.edu.br. Endereço: Rua João Esteves, 225, Bairro Bom Pastor, Divinópolis, MG. CEP:35500-153. Tel: (37) 3221 4428

 

Francisco de Assis Braga

Eng. Florestal, Doutor em Ciência Florestal pela Universidade Federal de Viçosa – UFV. Professor adjunto na Universidade Federal de Viçosa - Campus Florestal. Rodovia LMG 860 km 6. Florestal, Minas Gerais. CEP 35690-000. Email francisco.braga@ufv.br

 

 

   

RESUMO

 

Um dos dilemas enfrentados pela educação contemporânea está na incoerência do ensino ministrado atualmente, que na maioria das vezes vai ao encontro dos paradigmas do capital e da industrialização, dando pouca importância aos valores de formação de um cidadão ético e consciente. Portanto, existe a necessidade de uma nova pedagogia, que dê importância aos sentimentos e aos valores humanos e não apenas um conhecimento técnico que vise preparar o indivíduo para o vestibular ou mercado de trabalho. O presente estudo busca através de uma abordagem teórica discutir a educação e a pedagogia ambiental, da forma como acontece na atualidade. O texto mostra que o modelo educacional deve focar-se na busca de conhecimento, criatividade e criticidade em relação ao mundo, pois os problemas ambientais são fundamentalmente decorrentes da falta de formação e informação, tendo fortes implicações para políticas educacionais e ambientais. A formação do cidadão consciente certamente contribuirá para um mundo com menos desigualdade e com um desenvolvimento comprometido com a sustentabilidade.

 

Palavras chave: Pedagogia Ambiental, Educação Ambiental, meio ambiente, sustentabilidade.

 

 

Breve apresentação do trabalho para a chamada na capa da revista: este artigo busca através de uma abordagem teórica discutir a educação e a pedagogia ambiental, da forma como acontece na atualidade. O texto mostra que o modelo educacional deve focar-se na busca de conhecimento, criatividade e criticidade em relação ao mundo, pois os problemas ambientais são fundamentalmente decorrentes da falta de formação e informação, tendo fortes implicações para políticas educacionais e ambientais.

 

  

Introdução

 

A educação oferecida no âmbito escolar apresenta-se como uma possibilidade dos indivíduos apropriarem-se de conhecimentos produzidos ao longo do tempo, buscando assim valores que possam contribuir para o desenvolvimento e melhoria do modo de viver coletivo. Dessa forma, é possível perceber que a educação ambiental se apresenta como obrigação legal, ética e moral da escola, uma vez que o momento atual pede mudanças profundas e incorporação de valores que visem a equidade social. Nesse contexto, buscar alternativas de sustentabilidade nas relações entre os indivíduos e a natureza torna-se um desafio para todos nós.

Com este intuito, a educação ambiental assume cada vez mais a sua função transformadora, na qual a co-responsabilização dos indivíduos torna-se um objetivo essencial para promover um novo tipo de desenvolvimento, chamado por muitos de desenvolvimento sustentável. Entende-se, portanto, que a educação ambiental constitui uma das condições necessárias para se modificar o quadro de crescente degradação sócio-ambiental, com ênfase em um modelo educacional que vise equilibrar a relação entre os indivíduos e a natureza. Nesse sentido, a educação fornecida no âmbito escolar apresenta-se como uma possibilidade dos jovens se apropriarem-se de conhecimentos produzidos ao longo do tempo, buscando assim valores que possam contribuir para o desenvolvimento e melhoria do modo de viver. Por isso, a educação ambiental através da escola é uma obrigação legal, ética e moral, uma vez que a atualidade exige mudanças profundas nos valores e comportamentos.

A Educação Ambiental, nas suas diversas possibilidades, abre um estimulante espaço para repensar práticas sociais. É papel do professor mediar e estimular a aquisição de um conhecimento suficiente para que o aluno tenha a possibilidade de adquirir uma base adequada de compreensão do ambiente global e local, impulsionando novas práticas no seu cotidiano através de um modelo educacional que assuma o compromisso com a sustentabilidade, como parte essencial de um processo social. Tal percepção possibilitaria certamente uma visão mais ampla da interdependência entre os problemas e soluções relacionados ao meio em que vivemos. Assim, o reducionismo pode ser superado ao estimular um pensamento voltado para uma perspectiva de ambiente diretamente vinculado ao diálogo entre saberes. A participação da comunidade nas estratégias de resgate do meio ambiente e dos valores éticos é fundamental para o fortalecimento da complexa interação entre indivíduos e natureza.

Dessa forma, propomos discutir a educação e a pedagogia ambiental que é oferecida na escola buscando identificar, através da pesquisa em trabalhos desenvolvidos sobre essa temática, as principais falhas e problemas, assim como propor possíveis direcionamentos. Não tem a pretensão de propor soluções acabadas, mas discutir possibilidades de mudança no modelo atual, o que pode contribuir para uma melhor percepção das pessoas em relação ao mundo em que vivem.

 

 

 

Educação Ambiental formal e não formal

 

 

A Educação Ambiental pode ser definida como uma abordagem educacional que visa uma mudança de paradigmas rumo ao desenvolvimento sustentável (PHILIPPI JUNIOR; PELICIONI, 2005). Ruscheinsky (2002) salienta a necessidade de se esclarecer que sustentabilidade não se trata de uma forma qualquer de exercício ou de ação, mas a prática de uma ação transformadora intencional, de caráter coletivo, que se articula com a busca de uma sociedade democrática, socialmente justa e com o desvelamento das relações de dominação na própria sociedade.

Diante do exposto, percebe-se que a Educação Ambiental apresenta um conceito abrangente e destaca a participação da sociedade na construção de valores sociais (moral, ética, dignidade, respeito, solidariedade) que sejam capazes de mudar a relação homem - natureza. Segundo Carvalho (2006), a disseminação de experiências e conhecimentos, o engajamento das comunidades em atividades práticas é um meio de construir (e reconstruir) a cidadania.

O processo educacional pode ser formal, em nível escolar, ou informal, através de práticas educativas que envolvam a comunidade na defesa do meio ambiente, conforme preceitua a Lei n° 9.795, de 27 de abril de 1999. A educação conduzida desde a infância pode fortalecer o elo entre o ser humano e o meio ambiente, principalmente através do desenvolvimento de valores e responsabilidade ambiental (CARVALHO, 2006).

Em se tratando de Educação Ambiental é possível reconhecer dois objetivos que, de certa forma, se encontram interligados e se complementam. O primeiro objetivo refere-se à escola como uma unidade impactante, ou seja, uma instituição inserida dentro de um contexto maior e que, como qualquer outra, contribui para a manutenção e até crescimento dos problemas ambientais de uma cidade, seja pelo lixo que gera, pelo esgoto, consumo de energia e água etc. Já o segundo refere-se à escola ou à educação fornecida pela escola, como perpetuadora e multiplicadora de uma cultura que pode ser predatória ao meio ambiente, seja simplesmente pelo fato de desconsiderar sua existência (Grun, 2000) ou por ser baseada em certos pressupostos que hoje parecem ser antiquados e que a fazem ser considerada tanto parte do problema quanto da solução (Sterling, 1996).

Reconhecido o cenário, pode-se então pensar em uma estratégia de implementação da Educação Ambiental utilizando uma visão ampliada (TRISTÃO, 2005) que aborde os objetivos, mencionados acima, em conjunto. Desta forma, além de ser agente de mudança, a escola seria também um objeto de mudança (Sterling, 1996). Os benefícios desta abordagem seriam muitos, dentre eles, o fato de o objetivo maior da Educação Ambiental ser o desencadeamento de mudança de comportamento, contribuindo na transição de um modelo individualista para um sustentável (TRISTÃO, 2005; PESSOA; BRAGA, 2010).

Estes novos comportamentos devem ser desenvolvidos e exercitados no ambiente imediato dos docentes, no caso, na escola (GOUVÊA, 2006). As mudanças não mais podem ser em situações simuladas, mas sim reais, em que as mais diversas variáveis e conflitos que venham a aparecer possam ser trabalhadas em uma atividade democrática, progressiva e dinâmica, fundamentada pela práxis, e que resulte na real redução dos impactos causados pela escola. Nesse formato, a Educação Ambiental seria incorporada nas políticas e programas da educação formal de maneira planejada e estratégica, de modo que não fique dependente do compromisso ou entusiasmo individual (Palmer, 1998).

O segundo benefício está na coerência entre o discurso feito na abordagem curricular da Educação Ambiental, ou seja, o que ocorre dentro da sala de aula e aquilo que é experimentado pelos jovens e também pelos professores na escola (Huckle, 1995).

A inserção da Educação Ambiental nos currículos escolares tem sido tema de debate, no sentido de se decidir se deve ou não ser uma disciplina ou se deve ser um tema transversal (GAZZINELLI, 2002). Sato (1997) defende que a Educação Ambiental deve ser abordada como uma dimensão que permeia todas as atividades escolares, perpassando os mais diversos setores de ação humana. Um outro questionamento, proposto por Gazzinelli (2002), se encontra na abrangência da localidade em que a Educação Ambiental deve se processar para atingir o maior número possível de pessoas.

As esferas formais e informais são repetidamente evidenciadas como espaços específicos de desdobramento das atividades de Educação Ambiental. Enquanto todas as esferas de experiências sociais são importantes é na esfera formal que a Educação Ambiental pode ter um aceleramento de novas condutas, se considerarmos que a escola representa historicamente o locus do saber social e ideologicamente valorizado (ANDRADE JÚNIOR et al., 2004). Neste sentido, as questões ambientais e ecológicas passam a compor um novo paradigma para a atuação da escola na sua missão de educar estimulando a vivência de valores que produzam a equidade social e o equilíbrio ambiental (MOLES, 1995).

As crianças, adolescentes e jovens passam a maior parte do tempo na escola, que portanto, é na atualidade o principal local de aquisição de valores sociais e atitudes comprometidas com o equilíbrio ambiental (JACOBI, 2003). Dessa forma, a instituição escolar é mediadora de conhecimento e estímulo para uma consciência crítica e promotora de ações de cidadania. Por isso, esta deve ser um espaço onde o corpo discente e docente estejam envolvidos e comprometidos na construção de um ambiente saudável, harmonioso e equilibrado (GAZZINELLI, 2002).

Medina (2001) e Pessoa e Braga (2010), entendem a Educação Ambiental como um processo que cria possibilidades de formação crítica e participativa relacionadas à correta utilização dos recursos ambientais. Isso, entretanto, não é apenas retórica, uma vez que, segundo Grun (2000) a Educação Ambiental tem pela frente um trabalho de desmistificar os extremismos, tanto do cartesianismo quanto do arcaísmo. Para tanto, torna-se necessário reverter saberes e práticas buscando contemplar aspectos que vislumbrem uma sociedade ecologicamente sustentada.

Agrupar as dimensões de uma abordagem que vislumbrem a sustentabilidade a um trabalho popular com comunidades pressupõe um processo de identificação e conquista dos atores sociais envolvidos, através da busca de parcerias e programas que sejam elaborados de acordo com os interesses e perspectivas da população alvo, no caso, os alunos (JACOBI, 2003).

Nesse sentido, Guimarães (1995) argumenta que a Educação Ambiental, voltada para a participação ativa dos atores sociais, apresenta-se como uma dimensão do processo educativo, nos quais os envolvidos buscam a construção de um novo paradigma que contemple as aspirações populares de melhor qualidade de vida. Segundo Carneiro (2006) tal modelo possibilitaria a integração entre educação ambiental e educação popular, tendo como consequência a interação e integração dos aspectos sociais, econômicos, políticos, ecológicos e culturais para uma vida melhor e mais sadia.

A Educação Ambiental, em sua vertente mais atual, se inscreve nos princípios da sustentabilidade, da complexidade e da interdisciplinaridade (PELICIONI, 1998). Segundo Leff (2001), o pensamento da complexidade deve estar na base da ecologia, da tecnologia e da cultura, constituindo uma racionalidade produtiva. A Educação Ambiental requer, portanto, a construção de novos objetos interdisciplinares de estudo, através da problematização dos paradigmas dominantes, da formação dos docentes, da incorporação do saber ambiental emergente em novos programas curriculares e nos programas com as comunidades, seja urbana ou rural (MORIN, 1991).

A despeito de qualquer crítica que se possa fazer da supervalorização dada à Educação Ambiental como um mecanismo poderoso na “mudança de comportamento” em relação ao meio ambiente, ou atribuindo a ela o papel de formadora de uma “consciência ambiental”, a Educação Ambiental apresenta-se com um conteúdo abrangente no âmbito filosófico e político (FARIAS; CARVALHO, 2007). Sobre essa questão Leff (1996) argumenta que a Educação Ambiental adquire um sentido estratégico na condução do processo de transição para uma sociedade sustentável, uma vez que se trata de um processo histórico que reclama o compromisso do Estado e da cidadania para elaborar projetos nacionais, regionais e locais. Dessa forma, a Educação Ambiental deve se definir por um critério de sustentabilidade, que corresponda ao potencial ecológico e aos valores culturais de cada região (MIRANDA; SCHALL; MODENA, 2007).

Nesse sentido, as pesquisas quanto às ações educativas, pontuais ou processuais, formais ou informais, no Brasil, indicam que as tendências de concepções e práticas são múltiplas e multifacetadas, pois são situadas e contextualizadas local e globalmente. (JACOBI, 2005) Os resultados desse pensamento e saberes são indicadores do avanço da consciência ecológica, “ecopedagógica” e socioambiental das questões relacionadas ao macro e ao micro do meio ambiente (GUATTARI, 2006).

Para Boff (1999), o fato de a educação ambiental começar pela escola é um passo muito importante nesse processo de transformação e resgate de valores como os do cuidado e do zelo com o meio ambiente em seu sentido mais amplo possível. Segundo Pelicioni (1998) torna-se imprescindível estabelecer as relações entre a economia, o desenvolvimento social e político e o meio ambiente. Aqui, a importância da educação leva ao já analisado desenvolvimento sustentável, o qual tem por base o uso racional dos recursos naturais, que impulsionam a economia.

 

 

Educação e pedagogia ambiental

 

 

Um dos dilemas enfrentados pela educação contemporânea está na incongruência do ensino ministrado atualmente (LUCATTO; TALAMONE, 2007), pois os objetivos que levaram ao advento da Escola moderna são aqueles que salientam ainda a era do capital e da industrialização. Os objetivos desse tipo de escola moderna é, ainda hoje, o preparo de mão-de-obra, o ensino de valores cívicos e o ensino para a igualdade (GADOTTI, 1998; SOUZA NETO, 1999). Entretanto, este modelo não condiz com as exigências da sociedade contemporânea, nem com as necessidades das pessoas que frequentam as escolas atualmente.

A educação deve ser uma educação para a vida, para o ser humano e para o seu viver bem (CARNEIRO, 2006). Neste sentido, há necessidade da educação dar importância aos sentimentos e aos valores humanos, não apenas um conhecimento técnico, como ilustra Claparéde apud Marqueti (1999, p.55) “os sentimentos atribuem objetivos à conduta, ao passo que a inteligência fornece os meios técnicos para sua realização”. Ignorar que lidamos com pessoas e que, portanto, possuem sentimentos, de diferentes naturezas e origens é esquecer a própria característica que nos faz humano. O próprio Piaget expõe sua posição acerca do objetivo da educação:

 

O principal objetivo da educação é criar homens capazes de fazer coisas novas, não

simplesmente de repetir o que outras gerações fizeram – homens criativos, inventivos e descobridores. O segundo objetivo da educação é formar mentes que possam ser críticas, possam verificar e, não, aceitar tudo o que lhes é oferecido. O maior perigo hoje, é o dos chavões, opiniões coletivas, tendências de pensamentos já prontos. Temos que estar aptos a resistir individualmente, a criticar, a distinguir entre o que está provado e o que não está. Portanto precisamos de discípulos ativos, que aprendam cedo a encontrar as coisas por si mesmos, em parte por sua atividade espontânea e, em parte pelo material que preparamos para eles, que aprendam cedo a dizer o que é verificável e o que é, simplesmente, a primeira idéia que lhes veio (PIAGET apud OLIVEIRA, 2002, p.45).

 

 

            Na atualidade, podemos considerar que o primeiro objetivo indicado acima, se relaciona com o conceito de inovação e o segundo com a capacidade de análise. Cabe à educação a responsabilidade de estimular e criar condições favoráveis para que o educando desenvolva seu potencial, capacidade criativa e crítica, ou seja, sua capacidade invenção e de análise sobre a realidade. Educação procede da expressão latina educare e pode ser traduzida por guiar para fora. Dessa forma, “educar é conduzir de um estado a outro, é modificar numa certa direção o que é susceptível de educação” (LIBÂNEO, 1985, p. 97). Significa proporcionar ao educando o desenvolvimento de suas próprias habilidades potenciais. Assim sendo, é possível que esse desenvolvimento seja na direção do bem-estar coletivo.

A necessidade de conhecimento, criatividade e criticidade em relação ao mundo mostram-se claramente nas propostas curriculares do Ministério da Educação (GAZZINELLI, 2002). Por exemplo, o Referencial Nacional para a Educação Infantil coloca o conhecimento do mundo e de si como um dos objetivos deste nível de ensino. A autonomia, outro objetivo proposto, só será alcançada mediante este conhecimento, para que as crianças possam agir com criticidade sobre a realidade, construindo sua leitura própria do mundo e do seu próprio meio (JACOBI, 2005).

 

A criatividade é a última etapa, desenvolvida após a criança ter alcançado os objetivos precedentes, pois, para criar, ela tem de conhecer e ser autônoma para criticar o que existe e para criar o que não existe (MARANDOLA; MARANDOLA JR., 2001, p.32).

 

A civilização contemporânea vive uma profunda crise da racionalidade moderna que produz inúmeros reflexos nos indivíduos e na sociedade, como a crise ambiental. Leff (2001) aponta que os problemas ambientais são fundamentalmente problemas do conhecimento, tendo fortes implicações em toda a política ambiental e para a educação escolar. Desta forma, este autor postula que se deve aprender a aprender a complexidade ambiental, sendo um problema de aprendizagem do meio, como compreensão do conhecimento sobre o mundo.

O legado deste aprendizado é o questionamento da racionalização crescente do conhecimento e a objetivação do mundo, levantando a questão dos valores e da subjetividade do saber (SILVA; GOMES; SANTOS, 2005). Neste contexto, Leff (2001) propõe que o aprendizado da complexidade deve ser mediante o saber ambiental, pois trata-se de um conceito utilizado para assinalar os saberes que as populações desenvolvem acerca de seu ambiente, construindo-o coletivamente através do tempo. Cada cultura possui uma forma própria de relação com o ambiente, havendo diversos saberes ambientais, localizados temporal e espacialmente. Portanto, considera as várias formas de conhecimento como passíveis de manter uma relação dialógica, o diálogo de saberes, num processo de apreender o mundo a partir de cada sujeito. Rocha (2006) complementa que a ciência e a educação devem incorporar a tradição e a modernidade, trabalhando os valores tradicionais, sendo esse um processo de libertação do conhecimento proposto pela racionalidade econômica.

A complexidade ambiental é, assim, um mosaico de alternativas e diferenças. Uma construção coletiva que visa, acima de tudo, a noção holística do ambiente, sem reduzi-lo a processos ou pessoas, buscando sua visão ampla e profunda ao mesmo tempo, dinâmica e pulsante, numa incursão pelos conhecimentos e modos de vida humanos (TRISTÃO, 2005).

Na discussão ambiental, por exemplo, as problemáticas de cunho físico são evocadas pelo ambientalismo com grande sensação, subsidiando um catastrofismo concernente ao fim do planeta e da vida humana na terra. A re-habilitação não é por esta via, mas pela consciência ecológica (FARIAS; CARVALHO, 2007). O objetivo de uma pedagogia do ambiente é que o ser humano conheça o seu meio para que possa agir de forma ética e responsável, deixando de agir como se não houvesse consequências ou como se a natureza fosse infinita. É a educação para a vida, através do respeito, responsabilidade e solidariedade (CARNEIRO, 2006).

Por fim, esta pedagogia procura promover o pensamento complexo, para que possamos enxergar a complexidade imbricada de relações e, desta forma, agir em consonância (FARIAS; CARVALHO, 2007). O pensar e o agir com este conhecimento, apontam para o re-pensar a racionalidade moderna, como defende Leff (2001), apontando também para o cuidado com o ambiente e com o ser humano, conduzido por uma ética humanista, que pode servir de ponto de partida para este des-construir e re-construir das estruturas de pensamento que desprezaram o ser, o ente e as coisas (gazzinelli, 2002).

 

 

A escola e a Educação Ambiental

 

 

Provavelmente, um dos maiores problemas no âmbito escolar reside no distanciamento que a escola parece manter em relação à vida de cada um e de todos (Fracalanza, 2004). Segundo o autor, apesar do cenário apresentado atualmente nas escolas, a Educação Ambiental se faz necessária na educação formal. Muito possivelmente, os anos iniciais de escolaridade (que para alguns muitas vezes representa toda a escolaridade a que têm acesso) são essenciais na definição do caráter do adulto e na sua compreensão e prática de cidadania.

Entretanto, a tão divulgada necessidade de desenvolvimento da Educação Ambiental nas escolas, ainda encontra-se comprometida, pois a escola continua a manter uma prática educativa distanciada da vida, do aluno e da sociedade em geral. Além dessa situação, Fracalanza (2004) cita ainda problemas na escola relacionados às concepções de educação ambiental, as metodologia e práticas de ensino utilizadas pelos professores; à formação inicial e continuada de professores e ainda, à organização e funcionamento das escolas, dentre outros.

Exemplo disso foi relatado por Portela, Braga e Ameno (2010), ao investigarem as percepções de meio ambiente e educação ambiental de professores de ensino médio, ressaltando que o pensar e o fazer em educação ambiental revelou flagrante predomínio da orientação conservadora na percepção docente quanto à Educação Ambiental.

A implementação da Educação Ambiental em escolas deve levar a efeito a idéia de não focar seu desenvolvimento em um indivíduo ou grupo de indivíduos dentro da instituição, ou mesmo ser dependente de indivíduos de fora dela. Mas deve ter como horizonte a formação de valores e comprometimento em todos os profissionais que trabalham no ambiente escolar, independente do cargo que ocupem, ou seja, do jardineiro à diretoria. Com isto, toda a instituição estará envolvida no projeto. Uma atitude desse porte também promoverá uma consciência ambiental, de coerência com aquilo que passará a ser visto em sala de aula. Pois, não adianta o corpo discente aprender que não deve jogar papel no chão se ele sai da sala de aula e vê que outros membros da comunidade escolar fazem isso (SANTOMÉ, 1998).

Evidentemente, este envolvimento não se dará de forma linear ou rápida, mas ao longo de um processo de treinamento que deve, não só envolver professores, mas também todos os demais profissionais da escola. Por traz desta idéia está o desenvolvimento de práticas que valorizem a cooperação, igualdade de direitos, autonomia, democracia e participação coletiva. Ao propor um processo de treinamento que envolva todos, substituí-se de forma significativa a hierarquia normalmente presente por um ambiente mais democrático, onde cada um será estimulado a contribuir, tornando a escola um local de funcionamento mais orgânico (RUSCHEINSKY, 2002).

Deve-se também considerar que nenhuma atitude deve ser imposta. Isso leva a pensar que a melhor maneira de se propor métodos para resolver problemas é permitir aos envolvidos na questão o debate sobre as melhores formas. O que, certamente, trará uma sensação de auto-valorização e de propriedade em relação à mudança proposta, ao mesmo tempo não trará a sensação de imposição, já que as propostas estarão sendo feitas justamente por quem será responsável pela mudança. Dessa maneira, os diferentes profissionais da escola se verão como parte importante de um projeto maior que depende da participação cooperativa de todos, no qual cada setor, à sua maneira, apresente práticas benéficas ao ambiente (PHILIPPI JUNIOR; PELICIONI, 2005). Segundo os mesmos autores, outro ponto a ser considerado no projeto como um todo, que precisa ser esclarecido para todos os envolvidos, é que as mudanças na escola devem acontecer de forma contínua e progressiva. Isto irá evitar pressão sobre os envolvidos, pois na verdade, o importante é perceber que tudo não passa de um processo, uma mudança de paradigma, ou seja, de comportamento, o que leva a entender que acontece de forma gradativa. Assim, à medida que certas inovações se tornam naturais outras serão pesquisadas e implementadas em um longo e contínuo processo, cujo objetivo maior é o de sempre reduzir os impactos causados pela escola.

Com isso, considera-se ser eficaz um projeto de Educação Ambiental em uma escola que seja implementada com uma metodologia tal que permita que ele seja continuado após o fim do processo de treinamento, ou seja, de se tornar sustentável ou ainda parte da cultura da escola (SANTOMÉ, 1998).

 

 

Considerações finais

 

 

No que se refere aos conhecimentos necessários à compreensão da problemática ambiental, o sistema educacional brasileiro carece de mudanças quando ao quesito meio ambiente. Tal afirmação direciona para uma necessidade emergente de um efetivo engajamento na construção de um novo modelo que vise o desenvolvimento de formas sustentáveis de crescimento. Nesse sentido é preciso buscar modelos que conduzam a práticas pedagógicas que incentivem o debate, a construção do conhecimento e a reflexão sobre as questões ambientais, possibilitando um desenvolvimento claro dos conceitos de conscientização e de cidadania.

Portanto, partindo do princípio que o entendimento da complexidade ambiental é transdisciplinar e extrapola as esferas do conhecimento abordado nas disciplinas dos diferentes níveis educacionais, esse novo modelo deve se direcionar para a formação de indivíduos com consciência ética e discernimento, com capacidade para contribuir para um mundo mais igualitário e respeitoso ao ser humano e demais formas de vida.

Entretanto, o modelo educacional brasileiro, da forma como se apresenta, favorece a falta de reflexão e teorização a cerca da complexidade ambiental, tanto pela carência de conhecimento por parte dos educadores, quanto pela falta de recursos oferecidos pelas instituições de ensino. Tal quadro resulta, na maioria das vezes, em um ativismo ingênuo, apesar de bem intencionado, que não contribui significativamente na formação de cidadãos, como sujeitos na construção de novas relações sustentáveis entre sociedade e natureza.

Nessa perspectiva, o educador tende a reproduzir o discurso “ambientalizado”, presente no senso comum, suprimindo no ambiente escolar a dimensão política em sua intencionalidade de gerar práticas críticas e criativas. Essa postura é bastante incômoda, haja vista que o ambiente escolar é um lugar de constante aprendizado, renovação e aprimoramento de conhecimentos.

Apenas reproduzir o conhecimento certamente não faz jus à condição de educador, pois um profissional deve buscar um modo globalizado de se fazer valer o aprendizado obtido, pois uma postura enrijecida em nada acrescenta no processo educativo. Assim, uma postura aberta é de fundamental importância quando o assunto abordado é o meio ambiente, sendo necessário estudo e aprimoramento dos processos pedagógicos para que esses se tornem realmente práticas educacionais eficientes.

 

 

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Ilustrações: Silvana Santos