Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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04/09/2012 (Nº 41) REPRESENTAÇÕES SIMBÓLICAS / AMBIENTAIS DE ATIVIDADES DE CONSERVAÇÃO DE QUELÔNIOS POR ESTUDANTES DE ESCOLA RIBEIRINHAS NO BAIXO AMAZONAS
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REPRESENTAÇÕES DE ATIVIDADES DE CONSERVAÇÃO DE QUELÔNIOS POR ALUNOS DE ESCOLAS RURAIS RIBEIRINHAS DO BAIXO AMAZONAS, BRASIL

REPRESENTAÇÕES SIMBÓLICAS / AMBIENTAIS DE ATIVIDADES DE CONSERVAÇÃO DE QUELÔNIOS POR ESTUDANTES DE ESCOLA RIBEIRINHAS

NO BAIXO AMAZONAS

 

David Xavier da Silva, Augusto Fachín Terán, João Marinho da Rocha e Carmem Lourdes Freitas dos Santos Jacaúna

 

David Xavier da Silva. Graduado em Pedagogia, Especialista em Tecnologia Educacional pela Universidade Federal do Amazonas e Professor da Universidade do Estado do Amazonas no Centro de Estudos Superior do Amazonas, Est. Odovaldo Novo s/n – Parintins, AM. Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Educação e Ensino de Ciências na Amazônia da Universidade do Estado do Amazonas. Bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Amazonas – FAPEAM. E-mail: davidxavier58@gmail.com

 

Augusto Fachín Terán. Bacharel em Ciências Biológicas, Mestre e Doutor em Ecologia pelo Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – INPA. Docente do Programa de Pós-Graduação em Educação e Ensino de Ciências na Amazônia da Universidade do Estado do Amazonas. Escola Normal Superior, Av. Djalma Batista s/n. Manaus, AM. E-mail: fachinteran@yahoo.com.br

 

João Marinho da Rocha. Licenciado em História, Especialista em Historiografia da Amazônia pela Universidade Thahiri-ISEAMA e Professor da Universidade do Estado do Amazonas no Centro de Estudos Superior do Amazonas, Est. Odovaldo Novo s/n – Parintins, AM. Mestrando no Programa de Pós-Graduação em Educação e Ensino de Ciências na Amazônia da Universidade do Estado do Amazonas. Bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Amazonas – FAPEAM. E-mail: jmr.hist@hotmail.com.

 

Carmem Lourdes Freitas dos Santos Jacaúna. Licenciada em Geografia, Especialista em Tecnologia Educacional pela Universidade Federal do Amazonas e Professora da Universidade do Estado do Amazonas no Centro de Estudos Superior do Amazonas, Est. Odovaldo Novo s/n – Parintins, AM. Mestranda no Programa de Pós-Graduação em Educação e Ensino de Ciências na Amazônia da Universidade do Estado do Amazonas. Bolsista da Fundação de Amparo à Pesquisa do Amazonas – FAPEAM. E-mail: carmen.lfsj@gmail.com.

 

RESUMO

Projetos de conservação sobre quelônios amazônicos vêm sendo executados na Amazônia desde a década de 70. Em alguns locais a participação dos alunos das comunidades é importante para o sucesso dos projetos, entretanto se desconhece a contribuição desta atividade na formação científica dos estudantes. Diante dessa condição, buscou-se compreender como alunos participantes de atividades de conservação no projeto “Pé-de-Pincha” percebem a realidade representada a partir do desenho. Constituíram-se como sujeitos da pesquisa 48 alunos participantes de três escolas rurais ribeirinhas do município de Parintins, Amazonas. As informações foram obtidas através da observação, questionários e atividade prática. Nas análises de dados, tornou-se evidente que há influência significativa na aprendizagem dos alunos envolvidos nas atividades do projeto. Este tipo de atividade na Amazônia configura-se em um modelo de conservação de espécies ameaçadas de extinção, além de promover o ensino de ciências nas escolas amazônicas.

 

PALAVRAS-CHAVE / Educação Científica / Quelônios / Projeto “Pé-de-Pincha” / Comunidades Ribeirinhas.

 

Introdução

 

Em função da exploração dos quelônios amazônicos, especialmente aqueles pertencentes ao gênero Podocnemis, projetos de conservação de quelônios são desenvolvidos em diversos locais da Amazônia. Um desses projetos é executado no Baixo Amazonas sendo conhecido como “Pé de Pincha” (Nome dado ao projeto em função da pata do quelônio possuir um formato que quando em contato com a areia deixa uma marca parecida com uma pincha (tapa de garrafa de bebida)). Este projeto de cunho conservacionista tem a participação ativa de comunitários e é desenvolvido em doze municípios do Médio e Baixo Amazonas. Surgiu em 1999 dentro da Universidade Federal do Amazonas, a partir de demanda de algumas comunidades do município de Terra Santa, no Estado do Pará, que buscaram apoio para a realização de atividades que levassem ao uso racional da fauna, com ênfase em quelônios, recurso que era abundante na região, mas que, devido ao consumo predatório, havia-se tornado escasso (Vidal e Costa, 2008). O objetivo principal desse projeto é preservar os quelônios pelos próprios comunitários e executar ações de educação ambiental. Dentre as espécies mais conhecidas e preservadas pelos ribeirinhos temos a "tartaruga-da-Amazônia" Podocnemis expansa, o "tracajá" P. unifilis, a "iaçá" P. sextuberculata, e o "cabeçudo" Peltocephalus dumerilianus (Andrade, 2005). Atualmente o trabalho vem sendo desenvolvido por uma equipe multidisciplinar, que integra professores, técnicos, estagiários, e voluntários de diversas instituições e principalmente as comunidade ribeirinhas. Na cidade de Parintins, há atuação do projeto a mais de 10 anos nas comunidades rurais suburbanas, tendo os comunitários forte atuação no desenvolvimento das ações de manejo e proteção das espécies.

As ações de preservação e conservação têm sustentação nas escolas das comunidades onde o projeto acontece; entretanto, pouco se sabe a respeito da influência destas atividades na educação científica dos estudantes que participam destas ações, sendo esta negligenciada (Silva e Fachín-Terán, 2011; Rocha e Fachín-Terán, 2011).

Para compreender a influência das atividades do projeto “Pé-de-Pincha” na educação científica dos estudantes das séries iniciais, pesquisamos a representação de sua participação nas ações de manejo a partir do desenho, que conforme Lopes e Park (2007): o desenho é considerado um modo singular de expressão de conteúdos pessoais e sociais, os quais se apresentam úteis para a coleta de dados sobre a representação social da criança. Revelar indícios tanto de informações como também do objeto social que representa e assim esclarecer quais os benefícios que o projeto agrega na formação científica e cidadã dos estudantes.

 

Procedimentos metodológicos

 

O estudo foi realizado de novembro a dezembro de 2011, nas escolas Municipais Santa Terezinha do Aninga, Santa Luzia do Macurany e São Pedro do Parananema, comunidades ribeirinhas localizadas no município de Parintins, no Estado do Amazonas-BR (Figura 1). Trabalhou-se com 48 alunos de 3 turmas de 4º ao 5º ano do Ensino Fundamental que participaram anteriormente das atividades do projeto. A maior parte dos alunos são moradores destas comunidades, e, estudaram em anos anteriores nas séries iniciais.

Para compreender como as crianças das escolas participantes se relacionavam com o projeto, foi desenvolvida uma atividade de desenho. Através desta, buscou-se saber como é representada a participação do estudante nas atividades do projeto. Para tal fim disponibilizamos uma folha de papel A4 em branco, um lápis e uma caixa de lápis de cor pequena, e foi solicitado dos estudantes que desenhassem sua participação no projeto “Pé-de-Pincha”.

Como instrumento metodológico de análises dos desenhos, utilizou-se a perspectiva teórica apresentadas nos trabalhos de Reigota (1994) e Freitas (2009), os quais tratam das representações do meio ambiente, adaptado-se para uma discussão no campo da leitura das representações simbólicas, visando compreender as influências das atividades do projeto na forma de pensar dos alunos e nas escolas investigadas. Nesta análise foram valorizados os contextos apresentados, no sentido de se conhecer a visão representativa que os estudantes têm de seu meio, como também de verificar sua atuação frente às atividades de manejo e reprodução.

Parintins_localiza1 (3).JPG

Figura 1. Localização da área de estudo no município de Parintins.

Fonte: Org: Willer Pinto, 2012.

 

Resultados e Discussão

 

A atividade desenvolvida possibilitou a verificação de qual era a leitura simbólica representada através de gravura ou desenho que os alunos fazem das ações do projeto. Tal atividade buscou considerar que há nos desenhos uma manifestação de representação social (Moscovici, 1978; Jodelet, 1993), importante para o entendimento das questões investigadas. Isto é corroborado por teóricos como Porcher (1982) que afirma que é preciso repetir até a exaustão que o desenho se constitui uma atividade capital da escola primária. Para Sans (2009), quando a criança desenha, normas próprias são feitas, e interligam o ver, o saber e o fazer.

Os desenhos representam a espacialidade dos alunos e são criados das mais diferentes formas e foram categorizados de acordo com as representações neles manifestados e agrupados em categorias pelos seguintes critérios estabelecidos: I – Elementos da paisagem natural, II – Elementos e instrumentos da transformação da ação humana, III- Dependências práticas de atuação do projeto, IV – Pessoas e personagens representados no desenho, e, V – Animais dos Ambientes. O agrupamento nestas categorias é apresentado na Tabela I.

 

TABELA I - FREQUÊNCIA RELATIVA E PORCENTAGEM EM FUNÇÃO DAS CATEGORIAS DE REPRESENTAÇÃO ENCONTRADAS NOS DESENHOS DAS CRIANÇAS (N=48)

Representação

Categorias

N

%

Flores

I

1

2,08

Arcos Íris

I

2

4,16

Campo

I

3

6,25

Frutas

I

5

10,41

Nuvens

I

21

43,75

Lago

I

34

70,83

Sol

I

37

77,08

Árvores

I

40

83,33

Barco

II

2

4,16

Malhadeira (rede de pesca)

II

2

4,16

Cesto

II

3

6,25

Escola

II

3

6,25

Praia

II

4

8,33

Ponte de soltura (porto improvisado)

II

8

16,67

Canoa

II

11

22,92

Ovos

III

5

10,41

Chocadeira

III

8

16,67

Viveiro (berçário)

III

12

25,00

Ninhada

III

20

41,67

Pescador

IV

3

6,25

Pessoas

IV

36

75,00

Boi

V

1

2,08

Jacuruaru (camaleão)

V

1

2,08

Peixe

V

3

6,25

Pássaros

V

9

18,75

Tracajá (filhotes)

V

32

66,67

Tracajá (adultos)

V

34

70,83

 

 

Nas categorias analisadas, observa-se que na primeira, houve maior presença de elementos da paisagem natural, tais como a presença das árvores (N=40, 83,33%), do sol (N=37, 77,08%) e lago (N=34, 80,83%); na categoria IV a presença do homem nas atividades do projeto (N=36, 75%) foi importante; e na Categoria V, os tracajás adultos (N=34, 70,83%), e tracajás filhotes (N=32, 66,67%) tiveram uma porcentagem relativamente alta, revelando como o desenvolvimento do projeto está relacionado com o cotidiano do aluno nas três comunidades estudadas. O detalhe nos desenhos dos estudantes procurou mostrar que a participação no projeto algumas vezes ultrapassou o sentido natural, inserindo aspectos do cotidiano de outras pessoas que também fazem parte desse processo. De acordo com Sans (2009) a capacidade criadora é um potencial inerente à pessoa, que não se mede e não se ensina, mas existem meios para estimulá-la, fazendo com que o ser humano a explore e torne-se mais criativo.

Dentre os elementos desenhados pelos alunos destacam-se o cenário no qual eles vivem, sendo incluídos elementos como às árvores, o sol, o lago, as pessoas, os animais, entre outros. Todas essas representações são encontradas nas comunidades rurais pesquisadas, onde o aluno através dos desenhos representou sua participação, não esquecendo de mostrar que as atividades ocorrem de forma ordenada e com a presença de outros fatores. Apesar de alguns elementos serem intocáveis, como por exemplo, o sol; sua presença é de fundamental importância para todos os seres vivos.

Nessas comunidades o espaço geográfico ainda mantém a característica peculiar do meio rural; sendo as árvores um exemplo desse perfil. Ao considerar a participação do aluno, este representou da forma como ele se vê inserido nas atividades do Projeto, estando o sol e as árvores como elementos fundamentais dentro dessa visualização (Figura 2).

 

Figura 2. Presença no desenho de elementos da categoria I – Elementos da Paisagem natural.

Fonte: Elaborado por aluno da comunidade da Aninga.

 

Para a educação científica o conhecimento tradicional possui um valor além do simbolismo, neste caso, os alunos enxergam esses elementos como parte de suas vidas. A compreensão que o homem faz de seu papel dentro da sociedade em que vive, pode ser representado de diversos modos. A transferência da imagem mental do aluno representada no papel se dá a partir de seu entendimento de como a sua participação no projeto está sendo feita; Sans (2009) trata do assunto dizendo que o desenho é uma amplitude que representa uma cena, um tema ou algo que vibra. Como educação científica o projeto “Pé- de-Pincha” tem contribuído para o desenvolvimento educacional de diversas gerações de estudantes, cabendo ao professor ao longo desse período a tarefa de propor uma metodologia de ensino onde a conservação da espécie fosse mais que uma ação voltada para a manutenção dos quelônios.

Os instrumentos de transformação humana foram destacados através de representações como: casas, ponte improvisada (Figura 3); o que significa que houve interferência para que estes elementos pudessem estar presentes tanto no dia a dia do aluno, quanto para o benefício do desenvolvimento do projeto “Pé-de-Pincha”. A casa símbolo de presença familiar configura-se como um cenário de morada de homens e mulheres que podem colaborar com as práticas do projeto. A ponte por sua vez, foi necessária para facilitar o dia a dia; ou seja, os inventos dos seres humanos podem auxiliar e melhorar o desenvolvimento dos trabalhos.

 

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Figura 3. Presença no desenho de elementos da categoria II – Instrumentos da transformação da ação humana.

Fonte: Elaborado por aluno da comunidade do Aninga

 

A linguagem transmitida na figura que representa a categoria II, sobre os instrumentos da transformação humana, reflete que o papel do homem na atuação de agente social também destaca a personalidade dos indivíduos. Dessa forma o ensino de ciência é capaz de ser visto por meio das representações feitas nos desenhos, onde o projeto Pé de Pincha é via de interpretação do cotidiano. Numa perspectiva apontada por Lemke (2006): sustentarei que a educação científica necessita mais de entusiasmo, mais honestidade, mais humildade e mais valor real para muitos estudantes. Com os estudantes de menor idade, devemos trabalhar para criar um compromisso mais profundo com os maravilhosos fenômenos naturais; o projeto como ação concreta de comunitários das comunidades Aninga, Parananema e Macurany, representa o compromisso de educar cientificamente os estudantes que possuem conhecimento do senso comum, inserido conteúdos que a ciência tem descoberto para melhor desenvolvimento das fases do “Pé-de-Pincha”.

O aluno através do desenho pode fazer outras inferências com relação à representação da transformação humana, cada criança expressou a forma como o homem modifica seu espaço geográfico e revelaram quais são diferenças que ocorrem do natural para os elementos que o ser humano criou. Andrade (2005) destaca que o desenho possibilita uma visão de mundo diferente. Para a educação científica a criticidade dos alunos sobre o seu ambiente revela que a compreensão da relação de projeto e ensino de ciência está intrínseca na conjectura de suas expressões, seja na participação da pesquisa ou mesmo no desenho para análise. A educação científica ainda não conseguiu envolver todos os estudantes, dessa forma o projeto “Pé-de-Pincha” surge como alternativa de ensino de ciência a fim de melhorar a participação dos cidadãos no processo, nesse sentido Cachapuz et al (2005) diz que a educação científica é fundamental para se resolver as necessidades de uma população; no campo educacional alfabetizar cientificamente favorece a vontade de desenvolver diversos tipos de ciência na Amazônia.

Da participação do aluno no projeto “Pé-de-Pincha”, este promoveu um ambiente idêntico com a manifestação original do espaço no qual ele está inserido, como agente social este sistematizou as diversas formas de apresentar como sua presença também favorece a solidez das ações. Sans (2009) destaca que desenhar engloba a potencialidade do indivíduo e expande sua criatividade. É nesse sentido que a Educação Científica quer que a ciência seja desenvolvida em sala de aula, como um desafio de pensar além do comum, proporcionando alternativas de apresentá-la a estudantes através de ações concretas como o “Pé-de-Pincha”, que nasceu de uma ideia simples e se expandiu para diversos locais, educando e tornando possível a conservação dos quelônios. No âmbito de atuação do projeto o aluno representou como ocorre sua participação (Figura 4).

 

 

imagem

Figura 4. Presença no desenho de elementos da categoria III - Dependências práticas de atuação no projeto. Fonte: Elaborado por aluno da comunidade do Parananema.

 

Nesta categoria o aluno mostra como ocorre o desenvolvimento do projeto, simbolicamente ocorre o primeiro passo que é a coleta dos ovos, logo os filhotes são levados para os berçários, onde poderão se desenvolver longe de predadores; depois que nascem são colocados em um reservatório com água para somente depois de alimentados e com um tamanho maior serem soltos. O que o aluno mostra nessa imagem, configura sua expressão e sentimento da importância que é fazer parte dessa atuação, sua participação mostra o quanto as fases podem ser compensadoras.

Segundo Goldberg (2005) o desenho infantil constitui-se num elemento mediador de conhecimento. A partir do desenho a criança organiza informações, processa experiências vividas e pensadas. São dessas experiências que necessita o Ensino de Ciência, para torná-los aprimorados, mais ainda sim é importante pensar indivíduos capazes de conhecer e não deixar de estabelecer críticas sobre a ciência. Para Paiva (2008) é completamente compreensível que o Ensino de Ciências selecione conteúdos que justifiquem o seu papel como instrumento social para o desenvolvimento da cidadania, levando as crianças a refletirem sobre os rumos da humanidade e a sua relação com a forma de produção de conhecimento. A busca constante por conhecimentos que podem mudar para melhor a vida de populações é compromisso, e como educação não se pode limitar e nem privilegiar um público único, mais sim descentralizar esse pensamento.

A quarta categoria envolve as pessoas e personagens nos desenhos, Hanauer (2011) diz que o desenho revela o desenvolvimento da criança; nessa categoria houve através de figuras a presença dos alunos na inclusão das ações promovidas tanto pela escola, como pelos comunitários (Figura 5). Participar para o estudante significa que o homem faz parte desse processo. A visualização do aluno e seu reflexo dentro do projeto “Pé-de-Pincha” fortalecem a prática e valorização da ação humana no meio ambiente. Dessa forma o ensino de ciência ocorre de forma natural, o projeto faz parte do dia a dia dos comunitários, pois dividem o mesmo espaço.

 

Figura 5. Presença no desenho de elementos da categoria IV – Pessoas, personagens, representados no desenho. Fonte: Elaborado por aluno da comunidade do Parananema.

        

Umas das fases mais marcante do processo de conservação dos quelônios nas comunidades rurais é a soltura, na imagem o aluno revela como se envolve nesse processo, os personagens humanos são expressos de forma participativa e sua proximidade com as espécies é no sentido de ajudar a mantê-las. Paiva (2008) sobre o aluno inserido no processo de Educação Científica manifesta a seguinte opinião: o aluno é o protagonista, é ele que deverá agir e refletir sobre a sua ação, na perspectiva de construir o seu conhecimento, num movimento de aproximação das ideias cientificamente aceitas. A união do senso comum com a ciência tem possibilitado a manutenção das espécies de quelônios por meio da conservação; que é uma prática desenvolvida inclusive em quintais de casas de comunitários com auxilio de estudiosos na área e órgãos parceiros, como por exemplo, as Universidades.

Por fim a quinta categoria revela a participação do aluno no projeto quando este transmite em imagens a presença de animais (Figura 6). Nessa categoria a facilidade em expor os elementos justifica-se pela constante vivência nesses ambientes; peixes, quelônios, etc., são realidades dessas comunidades.

Cada aluno representou sua participação de maneira onde diversos elementos estão subjetivos; com isso nesses locais estão aspectos socioculturais desenvolvidos pela comunidade, independente da inserção ou não no projeto, o que significa que as ações do "Pé de Pincha", não impedem outras atividades como a pesca e criação bovina, elementos que fazem parte do cotidiano dos comunitários e são mais do que representações simbólicas. Mais Paiva (2009) vai além: Alguns estudiosos do assunto acreditam que seja possível desenvolver atitudes científicas nos alunos, para que esses possam enfrentar os problemas, utilizando os métodos de indagação e de experimentação atribuídos à ciência.

 

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Figura 6. Presença no desenho de elementos da categoria V – Animais do ambiente.

Fonte: Elaborado por aluno da comunidade do Macurany.

 

Os desenhos feitos pelos estudantes refletem como o homem amazônico vive em estreita relação com o meio ambiente. Apesar de todos viverem rodeados dos mesmos elementos naturais, que foi retratado em forma de imagem, apresenta um quadro geral sobre o cotidiano do aluno, sendo que o pensamento de cada indivíduo pode variar. Os desenhos refletiram a participação do aluno e como ele se vê inserido no projeto, como agente transformador e participativo. Para Pozo e Crespo (2004) o Ensino de Ciência não necessita de grandes aparatos, para estes a simples aplicação de habilidades já criadas e uma vez aplicadas diariamente, unida com autonomia, por si caracteriza-se como fazer científico.

Esse pensamento preconiza o ideal que o ensino de ciências pretende alcançar a partir de sua propagação, a fim de alcançar uma classe social movida pela pretensão de evoluir cientificamente e com qualidade de conhecimento sobre as mais diversas temáticas. Segundo Hennig (1998) é no ensino de ciências que ocorre o envolvimento com caráter de compreensão para que no futuro o adulto seja um indivíduo cientificamente educado. Nessa perspectiva existe a necessidade de se repensar o ensino, suas influências na vida de cada cidadão e quais os pontos que acabam promovendo mudanças de comportamento. Segundo este mesmo autor, para que o ensino de ciências atinja seus objetivos é necessário que seja compreendidas em três fases contínuas e conectadas: Iniciação científica, compreensão da ciência e a educação científica. Para Chassot (2003) fazer os alunos entenderem ciência possibilita a compreensão melhor das manifestações do universo.

 

Considerações Finais

 

Na Amazônia existe o cenário ideal para trabalhar o ensino de ciências com projetos de cunho científico com a participação das escolas rurais, já que os projetos produzem informações que precisam ser divulgadas abrindo a possibilidade da construção de novos conhecimentos.

As atividades de conservação de quelônios realizadas no projeto “Pé-de-Pincha” com a participação de estudantes das comunidades estudadas contribuem para o fortalecimento da educação em ciências na medida em que possibilitam acesso a uma série de conhecimentos que são vivenciados na prática, a partir das relações de ensino e participação do sujeito no processo. Tais relacionamentos contribuem para o fortalecimento da prática educativa centrado em valores, que possibilitam a formação da consciência ambiental e a alfabetização científica na perspectiva de oportunizar a aquisição de saberes fundado na ciência e em uma prática social comprometida com o exercício da florestania.

 

 

Agradecimentos

 

Aos comunitários moradores das localidades de Aninga, Parananema e Macurany no município de Parintins-Amazonas pela sua colaboração durante as diferentes fases da pesquisa. A Fundação de Apoio a Pesquisa do Estado do Amazonas, pelo apoio através de bolsa de pesquisa concedida a Carmem Lourdes Freitas dos Santos Jacaúna, David Xavier da Silva e João Marinho da Rocha e aos nossos pares do grupo "Estudo e Pesquisa em Educação em Ciências em Espaços Não Formais" do Programa de Pós-Graduação em Educação e Ensino de Ciências na Amazônia da Universidade do Estado do Amazonas.

 

Referências

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Andrade, L C (2005) O desenho como expressão no aprendizado infantil: caminhos e possibilidades. Universidade Federal de Mato Grosso do Sul: Centro de Ciências Sociais, 63 pp.

Chassot, A (2003) Alfabetização Científica: uma possibilidade para a inclusão social. Revista Brasileira de Educação; n.22; Rio de Janeiro, 12 pp.

Cachapuz A; Gil-Pérez D; Pessoa AM; Praia J; Vilches A (2005) A necessária renovação do ensino das Ciências. São Paulo: Cortez. 20 pp.

Freitas MS (2009) Representações de meio ambiente por crianças da educação infantil. UFPA. Dissertação de Mestrado em Ciências e Matemática. Belém, PA: 136 pp.

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Lemke, JL (2006) Investigar para el futuro de la educación científica: nuevas formas de aprender, nuevas formas de vivir. Revista Enseñanza de las Ciencias, 5-12 pp.

Lopes EL, Park MB (2007) Representação social de crianças acerca do velho e do envelhecimento. Estud. psicol. (Natal), vol.12, n.2. 141-148 pp.

Moscovici S (1978) A Representação social da psicanálise. Rio de Janeiro: Zahar. 291 pp.

Paiva, AG (2008) Ensino de Ciências: O currículo em Ação de uma Professora Polivalente. São Paulo, 54-64 pp.

Porcher L (1982) Educação Artística Luxo ou Necessidade? São Paulo: Summus. 20-23 pp.

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Ilustrações: Silvana Santos