Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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04/09/2012 (Nº 41) O DESFLORESTAMENTO DAS MATAS CILIARES E ANINGAIS NO LAGO DO JAUARI NA AMAZÔNIA: PERSPECTIVAS PARA EDUCAÇÃO AMBIENTAL
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AVALIAÇÃO DO IMPÁCTO AMBIENTAL CAUSADO PELA DERRUBADA DAS MATAS CILIARES E ANINGAIS, NO LAGO DO JAUARY, NO MUNICÍPIO DE PARINT

O DESFLORESTAMENTO DAS MATAS CILIARES E ANINGAIS NO LAGO DO JAUARI NA AMAZÔNIA: PERSPECTIVAS PARA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

 

Sandro Ribeiro da Costa

Licenciado em Biologia, Universidade do Estado do Amazonas – Pós-graduando em Educação Ambiental – UNICID sandrorcr@gmail.com

 

Esp. Ronaldo Américo Silva de Medeiros

Pós-graduado em Educação Ambiental – UEA

 

Me. Adaílton Moreira da Silva

Mestre em Ciências Biológicas pela Universidade Federal do Pará – Professor da Universidade do Estado do Amazonas - amdsilva@uea.edu.br

 

Me. Paulo Augusto Ramalho de Souza

Mestre em administração pela UFMS - Professor da Faculdade de Administração e Ciências Contábeis da UFMT – paramalho@gmail.com

 

Resumo: O presente trabalho tem como objetivo avaliar o impacto ambiental causado pelo desflorestamento das matas ciliares e aningais no lago do Jauari, município de Parintins, AM. Para tanto, foram realizadas visitas periódicas para observação in loco do lago e entrevista com os morados da comunidade situada a frente do mesmo. Foram observados problemas ambientais decorrentes da queima e desflorestamento da vegetação nativa que rodeava o lago. A questão do assoreamento, que segundo os moradores, aconteceu devido ao aprofundamento de um canal que liga o lago ao rio Amazonas, assim como, da destruição das matas ciliares e aningais. Esta alteração permitiu a entrada das águas do rio Amazonas mais cedo ao lago e como isso depositando maior quantidade de sedimento. A abertura desse canal deu vazão mais rápida para as águas do lago e conseqüentemente o desaparecimento das espécies residentes tanto da fauna como da flora. Propõe-se uma conscientização dos moradores quanto à preservação ambiental e posteriormente uma campanha envolvendo toda a comunidade para o replantio de toda área afetada, com mudas de espécies nativas da região.

 

PALAVRAS-CHAVE: Impacto Ambiental, Mata Ciliar, Aningas, Assoreamento, Educação Ambiental.

 

Abstract: The present study aims to evaluate the environmental impact caused by deforestation of riparian forests and the lake of aningais Jauari, city of Parintins, AM. To this end, there were periodic visits to the lake on-site observation and interviews with the residents of the community located in front of it. Were observed environmental problems of deforestation and burning of native vegetation surrounding the lake. The issue of siltation, which residents said, was due to the deepening of a channel connecting the lake to the Amazon River, as well as the destruction of riparian forests and aningais. This change allowed the entry of the waters of the Amazon River to the lake early and how this increased amount of sediment deposited. The opening of this canal gave rise faster to the waters of the lake and consequently the disappearance of the resident species of both fauna and flora. It is proposed that an awareness of residents regarding environmental preservation and later a campaign involving the whole community to replant the entire affected area with native species in the region.

 

WORD-KEY: Environmental impact, Kills Ciliary, Aningais, Assoreament, Environmental Education.

 

INTRODUÇÃO

A profunda preocupação causada pelos problemas ambientais cada vez mais graves que afetam o meio ambiente são fenômenos relativamente discutíveis na sociedade atual. Devido a dados divulgados em relação a esses problemas, hoje há uma maior preocupação com o meio ambiente e com a educação ambiental. Porém, nem sempre o homem ocupou a posição que ocupa hoje em relação a esta temática. As primeiras preocupações datam da década de 70 quando o homem começou a incorporar o meio ambiente em seus programas e conteúdos educacionais. No entanto, o enfoque era exclusivamente biológico deixando de lado as questões sociais e políticas. A meta da educação ambiental é desenvolver uma população mundial consciente e preocupada com o meio ambiente para atuar individual e coletivamente na busca de soluções para os problemas atuais e para a prevenção de novos problemas (BARBIERE, 2004).

São objetivos da educação ambiental: tornar os indivíduos e grupos conscientes e sensíveis em relação ao meio ambiente e aos problemas ambientais; promover valores e sentimentos que motivem as pessoas e os grupos a se tornarem participantes ativos na defesa do meio ambiente e na busca de soluções para os problemas ambientais; proporcionar conhecimentos sobre o meio ambiente quanto às influências do ser humano e de suas atividades; proporcionar as habilidades que uma participação ativa requer; proporcionar condições para avaliar as medidas tomadas em relação ao meio ambiente e aos programas de educação ambiental; promover o senso de responsabilidade e de urgência com respeito às questões ambientais que estimule as ações voltadas para resolvê-la (BARBIERE, 2004).

Quando se trata de questões ambientais deve-se para efeito do estudo conceituar o impacto ambiental como qualquer mudança no ambiente natural e social decorrente de uma atividade ou de empreendimento proposto. Mesmo considerando que mudanças podem ocorrer por causas naturais, as que interessam aqui são resultantes de ações humanas. Entretanto, a palavra “impacto” diz respeito às mudanças no meio ambiente, físico, biótico e social em consequência às multiplicidades de atividades humanas em andamento ou propostas. Quando se fala em impacto ambiental decorrente de ações humanas, há uma tendência em associá-los apenas aos efeitos negativos sobre os elementos do ambiente natural e social, pois a degradação ambiental que nos rodeia são resultados indesejáveis dessas ações (BARBIERE, 2004).

Segundo a resolução n° 01 de 1986 do CONAMA, que estabelece os critérios básicos e as diretrizes para o uso e a prática do EIA (estudo do impacto ambiental), o impacto ambiental é qualquer alteração das propriedades físicas, químicas e biológicas do meio ambiente, causada por qualquer forma de matéria ou energia resultante das atividades humanas. Tais ações afetam direta ou indiretamente a saúde, a segurança e o bem estar da meio ambiente; a qualidade dos recursos ambientais.

Preocupados com todos esses fatores, ambientalistas estão cada vez mais, desenvolvendo trabalhos voltados para melhor entendimento da problemática ambiental. Na Amazônia, em especial, muito se tem ouvido falar sobre esta temática e do que se conhece sobre o assunto hoje na região. Uma das maiores preocupações se volta para as conseqüências de impactos ambientais causado pelo chamado desenvolvimento econômico. Entre os impactos comuns, encontram-se aqueles ligados aos rios e lagos da região (IBAMA, 1994).

Segundo Sioli (1985), na Amazônia as águas dos rios são classificadas em três grupos: transparente de água preta (exemplo o rio Negro); turvo de água branca (exemplo os rios Amazonas, Madeira, Juruá, e outros); transparente de água clara, pouco colorida (exemplo os rios Tapajós e Xingu).

Assim como as águas, o solo amazônico também é diversificado, entre essa diversidade, vamos encontrar áreas denominadas de várzea, terra firme, igapós e os aningais. As áreas de várzeas apresentam terreno plano, periodicamente inundado que margeiam os rios de água branca sendo mais fértil que o igapó devido a deposição periódica dos sedimentos dos rios. Os igapós, são terrenos que margeiam os rios de água preta, apresentam baixa fertilidade, menor incidência de insetos hematófagos e pouca produtividade. Já os aningais ocorrem nas várzeas dos rios sobre solos inundáveis (SIOLI, 1985).

Os aningais são caracterizados pela Aninga ou Montrichardia linífera, uma Araceae que pode atingir 3 a 4 metros de altura, ocorrendo em densa sinúsia quase monoespecífica. O principal fator de perturbação observado é a drenagem da várzea do rio, para expandir a área agricultável (OLIVEIRA-FILHO, 1988). Mata ciliar, é a formação vegetal localizada nas margens dos rios, córregos, lagos, represas e nascentes. Também é conhecida como mata de galeria, mata de várzea, vegetação ou floresta primária. A mata ciliar é considerada, pelo código florestal federal (Lei n. 4.771/65), como “área de preservação permanente”, com diversas funções ambientais. O aningal, por ser um tipo especial de mata ciliar, também é considerado área de preservação ambiental permanente.

O uso das áreas naturais e do solo para a agricultura, pecuária, loteamentos e construções de hidrelétricas, contribuíram, para a redução da vegetação original, chegando em muitos casos na total ausência da mata ciliar em algumas regiões do sudeste brasileiro altamente exploradas (SEMA, 2007). A ausência da mata ciliar faz com que a água da chuva escoe sobre a superfície não permitindo sua filtração e armazenamento no lençol freático. Com isso reduzem-se as nascentes, os córregos, lagos, rios e riachos. A mata ciliar é uma proteção natural contra o assoreamento. Sem ela, a erosão das margens, leva terra para dentro dos rios, tornando-o turvo, barrento e dificultando a entrada de luz solar. Além de reduzir o assoreamento, a mata ciliar, deixa a água mais limpa, facilitando a vida aquática, possibilitando assim que as espécies tanto da flora, quanto da fauna, possam se deslocar, reproduzir e garantir a biodiversidade da região.

O lago do Jauari está localizado na margem direita do rio Amazonas, em frente à comunidade do Jauari, pertencente à gleba de Vila Amazônia, distante cerca de aproximadamente 20 Km por via fluvial do município de Parintins-Am. Este lago (figura 1) apresenta intensos impactos ambientais causados pelo desflorestamento das matas ciliares e aningais, através da ação do homem, para a formação de pastagens para rebanhos de bovinos e bubalinos. Por isso, este trabalho foi elaborado para verificar e avaliar quais as reais conseqüências que esse impacto causou para o lago e para os moradores locais. Os resultados visam promover a conscientização dos comunitários, quanto à importância da preservação das áreas de matas ciliares e aningais ao redor dos lagos da região, e mais tarde um reflorestamento com mudas nativas desta área.

 

 

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Figura 1: O Lago do Jauari na época da seca

Fonte: Elaborado pelos autores com base na pesquisa de campo.

 

METODOLOGIA

O método empregado foi o da observação direta e indireta através de entrevistas com os moradores locais. Num total foram entrevistados 16 moradores que possivelmente participaram da fundação da comunidade. Estes podem melhor informar sobre as mudanças ambientais ocorridas no lago do Jauari desde que a comunidade foi formada. Foram realizadas visitas periódicas a comunidade e ao lago do Jauari durante os períodos de seca e cheia. Nestas visitas foram avaliados e quantificados vários parâmetros, entre eles; nível de escolaridade, idade, sexo, tempo de estadia na comunidade e atividade extrativista-agropecuária dos moradores locais. Também foi avaliada a situação e as causas do impacto ambiental do lago pela visão dos entrevistados. Entre os parâmetros analisados do lago estão: as principais mudanças ambientais e suas causas; a existência de ação de preservação; as mudanças na fauna e flora antes e depois do impacto; e mudanças no nível do lago durante as secas e cheias. Os dados foram tabulados, quantificados e analisados em planilha eletrônica.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A comunidade do Jauari, pertencente à gleba de Vila Amazônia, já existe há aproximadamente 30 anos. Os comunitários residentes ou não que participaram da fundação da mesma são os que melhor podem servir de referência para a descrição dos impactos ambientais ocasionados no lago do Jauari. Em relação à idade dos entrevistados 37% tem entre 30 a 40 anos, 25% tem entre 41 a 50, 19% de 51 a 60, 13% de 61 a 70, 6% de 71 a 80, como mostra a figura 2. Isso demonstra que a maioria dos entrevistados tem idade suficiente para estarem na época da fundação da comunidade e conseqüentemente demonstrarem uma melhor visão do antes e depois do impacto ambiental.

 

 

 


Figura 2: Comunitários entrevistados de acordo com intervalos de idades.

Fonte: Elaborado pelos autores com base na pesquisa de campo.

 

 

A escolaridade observada foi de 87% com ensino fundamental incompleto e 13% com ensino médio completo como mostra a figura 3. Contudo, apesar de alguns moradores terem o ensino médio à maioria tem apenas o fundamental incompleto demonstrando a carência educacional dos comunitários. Esta carência, assim como, a falta de uma educação ambiental levou os mesmos, junto com proprietários de gado da região, a devastarem a vegetação nativa ao redor do lago.

O ano aproximado de fundação da comunidade, segundo os moradores, foi 1974, iniciando com sete famílias em terrenos doados por agricultores locais. Estas famílias trabalhavam unidas e com o passar do tempo, a população da comunidade aumentou, passando a ter 47 famílias. Devido ao crescimento populacional, se dividiram em três comunidades: Santa Clara (Jauari), São Jorge e Quebrinha hoje a comunidade se encontra com 32 famílias incluindo as que chegaram recentemente à comunidade. Mesmo com essa separação os fundadores não perderam o contato com a comunidade, pois continuam a utilizar o lago tanto na cheia, como via de transporte, quanto na seca, tirando os peixes que ficam aprisionados na lama, como parte do sustento de suas famílias.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


                    

 

 

Figura 3: Grau de escolaridade dos Comunitários

Fonte: Elaborado pelos autores com base na pesquisa de campo.

 

 

 

Em relação à permanência dos moradores na comunidade, como demonstrado na figura 4, foi constatado que 6% residem ou residiram na comunidade por mais de 30 anos, 31% de 21 a 30 anos, 50% de 11 a 20 anos e 13% de 0 a 10 anos. Estes resultados corroboram a visão de que a maioria dos entrevistados contribuiu para a fundação da comunidade e permanecem ou vivem até hoje no local. Esse fato reforça a veracidade da pesquisa em relação às observações, pois os moradores participaram e acompanharam as mudanças no ecossistema do lago.

 


Figura 4: Tempo de moradia dos comunitários na região

Fonte: Elaborado pelos autores com base na pesquisa de campo.

 

 

A partir da figura 5 pode-se dizer que a principal atividade econômica dos comunitários é a agricultura e a pesca com 74%. Em seguida vem a agricultura e pecuária com 13% e outras atividades também com 13%. Nestas outras atividades incluem-se as agentes de saúde, parteiras, agentes ambientais e coordenadores da comunidade. Apesar do número alto na atividade da agricultura e da pesca, o principal agente econômico é a agricultura de subsistência, pois o lago em frente à comunidade não tem quantidade suficiente de peixes para movimentar a economia da mesma. Antes do impacto ambiental, o lago supria apenas as necessidades de alimentação das famílias locais, o que não acontece hoje. Por outro lado, apesar do número pequeno de moradores na atividade da pecuária, esta é a maior causadora de mudanças no ecossistema do lago, pois a formação de pastagens para o gado se dá através do desflorestamento e queima da vegetação nativa da região.

 

 


Figura 5: Comunitários de acordo com sua atividade econômica principal na comunidade.

Fonte: Elaborado pelos autores com base na pesquisa de campo.

 

Em decorrência do crescimento populacional e econômico da comunidade houve a transformação do ambiente do lago. A figura 6 demonstra, segundo os próprios moradores, as principais causas destas mudanças. Assim, 44% afirmam que a maior causa foi à queimada da vegetação nativa para facilitar o acesso à comunidade, 31% relataram que foi o aprofundamento de um dos canais que liga o lago ao rio Amazonas e 25% que foi o desflorestamento dos aningais e matas ciliares para a formação de pastagens. Estes eventos em conjunto, provavelmente, diminuíram o nível de profundidade do lago, pois as águas barrentas do rio Amazonas penetraram mais cedo aumentando o carreamento e deposição de sedimentos no fundo do mesmo.

Em relação ao aprofundamento do canal, os comunitários achavam que isto favoreceria um abrigo e acesso ao lago para guardar suas embarcações. Pois estas ficavam na margem do rio Amazonas sujeitas a ventos fortes e a força da correnteza. A princípio a idéia deu certo, mas com o passar dos anos, se notou que o lago foi ficando cada vez mais raso, chegando praticamente a secar durante os meses de verão, impossibilitando a entrada de embarcações. Os comunitários ficaram sem entender as causas desse fenômeno, mesmo assim, decidiram fechar o canal para evitar uma seca total do lago. Uma forma de explicar este fenômeno, a partir das observações, é que durante a vazante do rio Amazonas as águas do lago escoam rapidamente devido a diferenças do nível de profundidade, pois o canal é mais fundo do que o lago. Devido a esse fenômeno há uma secagem rápida do lago provocando uma mortandade muito grande de peixes, pois os mesmos acabam ficando presos em buracos ou lamas, tornando-se assim presas fáceis para o homem e aves.

 

 


 

Figura 6: Causas do impacto ambiental no lago Jauari na percepção dos moradores

Fonte: Elaborado pelos autores com base na pesquisa de campo.

 

Sobre o desflorestamento e queima das matas ciliares e aningais, segundo os moradores, havia a necessidade de realizar esta atividade para a formação de pastagens e melhor acesso dos comunitários ao lago. Os aningais e matas ciliares são vegetações encontradas nas margens dos rios e lagos da região Amazônica. Estas duas formações são importantes para manter a estrutura do solo e sua ausência faz com que a água da chuva escoe sobre a superfície provocando lixiviamento e erosão. Portanto, a erosão das margens leva terra para dentro do lago tornando-o turvo, barrento e dificultando a entrada de luz solar (Oliveira-filho, 1988).

O assoreamento ou mudança no nível pode ser confirmado quando se analisa a figura 7. Existe uma diferença perceptível, segundo os moradores, da profundidade durante a seca e cheia, antes e depois das transformações ocasionadas pela ação humana. No início da fundação da comunidade o lago na seca chegava aproximadamente 3 metros e na cheia a 11 metros. Nos tempos atuais, o que se verifica é uma profundidade de aproximadamente de 1 metro na seca e 8 metros na cheia. No relato de alguns moradores, durante as secas de anos anteriores o lago já atingiu uma lâmina d’água de apenas 30 centímetros chegando a quase secar literalmente. Como citado anteriormente, as possíveis causas dessas diferenças devem-se as mudanças no meio-ambiente que margeiam o lago. Segundo Lago e Pádua (1998), o solo não é um simples arcabouço de matéria morta e sim uma intensa presença de vida microscópica que impulsiona os processos orgânicos que dão origem ao húmus, a camada fértil existente na superfície. O desflorestamento, as queimadas e outras práticas impróprias tornam essa camada empobrecida e vulnerável a ação desagregadora da chuva causando a erosão e assoreamento de lagos, igarapés e rios.

 


Figura 7: Período percebido de assoreamento do Lago pelos comunitários

Fonte: Elaborado pelos autores com base na pesquisa de campo.

 

Quando se volta para o lago do Jauari, segundo os comunitários, existe uma intensa preservação do mesmo motivado pelas conseqüências do impacto ambiental. A figura 8 apresenta a visão dos entrevistados sobre a preservação do lago. Assim, 62% afirmam que há uma preservação intensa voltada principalmente para a proibição da pesca e caça no lago e também no sentido de evitar a secagem rápida do mesmo durante a vazante do rio Amazonas, através da construção de barragens no canal aprofundado. Existe também uma preservação moderada (25%) que consiste numa atuação indireta de órgãos públicos de defesa do meio-ambiente e de agentes ambientais voluntários, principalmente durante a época do defeso. A minoria cerca de 13%, afirmam que não existe nenhum tipo de preservação, isso reflete a passividade tanto dos comunitários quanto de instituições ambientalistas. Os moradores que relatam a inexistência de preservação ressaltam também, sob seu ponto de vista, que a mesma é só para beneficiar um pequeno grupo que se privilegia do contato direto com agentes ambientais voluntários e ONGs ambientalistas, enquanto que eles ficam marginalizados dos recursos naturais.


Figura 8: Tipos de preservação do lago Jauari segundo os moradores locais.

Fonte: Elaborado pelos autores com base na pesquisa de campo.

 

A figura 9 mostra os animais caçados e pescados no lago do Jauari antes do impacto ambiental. Os entrevistados enumeraram vários tipos como quelônios, tambaqui, tucunaré, pirarucu, cara-açu, curimatã, surubim, aruanã, cuiu-cuiu pirapitinga, bodó, ariranha, capivara, pato do mato, marreca e jacaré. Observou-se que no início o lago do Jauarí era um lago exuberante cheio de vida e havia muita fartura, com várias espécies tanto da fauna aquática como da fauna terrestre e outros. Entretanto esta abundância já não existe mais nos tempos atuais. Segundo Lago e Pádua (1998), um dos recursos naturais fundamentais de nosso planeta são os animais e vegetais que vivem nos ecossistemas.

 

 


Figura 9: Animais pescados e caçados no lago Jauari antes do impacto ambiental

Fonte: Elaborado pelos autores com base na pesquisa de campo.

 

 

Existe a necessidade de preservar os organismos de um modo geral não só por causa do equilíbrio ecológico, mas também por ser este um poço de recursos genéticos ainda não explorados que podem ter enormes potenciais biotecnológicos para o homem. Além do que, existe o problema ético do direito de todas as criaturas a vida, direito tantas vezes negado pelo antropocentrismo e atividades econômicas do capitalismo.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O lago do Jauari, hoje se apresenta com uma paisagem desoladora, pois a mata ciliar que outrora se encontrava no local, não existe mais, é um lago raso, sem vegetação, sem espécimes da flora e da fauna, praticamente um lago sem vida. Pelas observações realizadas, o lago, no início, apresentava água de cor escura durante todo o ano

A falta de conhecimentos biológicos sobre o ecossistema e também de uma educação ambiental levou os moradores da comunidade do Jauari a realizarem as transformações nas características do lago. As principais conseqüências dessas transformações foram à diminuição do alimento para os próprios moradores e a dificuldade de acesso pelo lago.

A transformação da floresta em pastagem é atraente para os proprietários das terras por razões sociais e institucionais, sendo a produção de carne uma consideração menor (FEARNSIDE, 1989). Um ponto importante é que o pasto pode ocupar uma área com um mínimo de gasto, já que o desflorestamento da terra é considerado uma benfeitoria e a pastagem é a maneira mais fácil de evitar a reversão para a vegetação secundária.

Os resultados descritos e discutidos acima apontam para uma efetiva conscientização dos comunitários e proprietários de terra/rebanho, da região próxima ao lago.

Através da educação ambiental, deve-se também realizar uma intensa campanha educativa sobre a importância da preservação das áreas de matas ciliares e aningais ao redor dos lagos, para minimizar o impacto e reverter à situação através do reflorestamento com mudas nativas nas áreas afetadas.

Faz-se de grande necessidade que os atores envolvidos saibam como os processos biológicos e físicos são importantes para a nossa sobrevivência e como esses processos são frágeis. Logo, não basta uma educação ambiental voltada para a comunidade sem que os governantes, empresários, pecuarista e a sociedade civil de um modo geral sejam inseridos nelas de maneira intensa e produtiva.

 

Bibliografia

 

BARBIERE, Jose Carlos. Gestão ambiental empresarial: conceitos, modelos e instrumentos. São Paulo: Saraiva, 2004.

 

FEARNSIDE, P. M. A ocupação humana na Amazônia: impactos, limites e planejamento. Brasília: SCT/PR, CNPq. Relatório de Pesquisa, 1989.

 

IBAMA. Amazônia: Uma proposta interdisciplinar de educação ambiental, temas básicos. Brasília: IBAMA, 1994.

LAGO, Antônio; PADUA, José Augusto. O que é ecologia. São Paulo: Brasiliense, 1998. Coleção primeiros passos, 116.

 

OLIVEIRA-FILHO. Integrar para entregar: políticas públicas. São Paulo: Papirus, 1988.

 

SEMA, Secretaria de Meio Ambiente do Estado do Paraná. Programa Mata Ciliar. Disponível em . Acesso em: 08 de out. de 2011.

 

SIOLI, H. Amazônia: fundamentos da ecologia da maior região de florestas tropicais. Petrópolis: Vozes, 1985.

 

Costa M.L. 1991. Aspectos geológicos dos lateritos da Amazônia.

Revista Brasileira de Geociências.

Ilustrações: Silvana Santos