Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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04/06/2012 (Nº 40) ESTUDO DE CASO BASEADO NO DIAGNÓSTICO SÓCIO-AMBIENTAL DE COMUNIDADES PRÓXIMAS AO COMPLEXO PORTUÁRIO DO AÇÚ NO NORTE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
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ESTUDO DE CASO BASEADO NO DIAGNÓSTICO SÓCIO-AMBIENTAL DE COMUNIDADES PRÓXIMAS AO COMPLEXO PORTUÁRIO DO AÇÚ NO NORTE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

 

A Educação Ambiental tem a capacidade de intervir na construção social da realidade de uma comunidade, podendo atuar como mediadora de futuros conflitos.

 

Monique Moreira Moulin1, Thaís Nacif de Souza2, Ricardo Pacheco Terra3

 

1.    Mestre em Genética e Melhoramento de Plantas, Especialista em Educação Ambiental. Professora do Instituto Federal do Espírito Santo – IFES – Alegre/ES. Endereço: Rodovia Cachoeiro - Alegre, Km =48, s/n°, Rive - Alegre, ES. CEP: 29500-000. Telefone:(28) 35528131. E-mail: moniquemoulin@gmail.com

 

2.     Mestre em Engenharia Ambiental, Especialista em Educação Ambiental. Coordenadora de Núcleo da Associação de Pró-gestão das Águas da Bacia Hidrográfica do Rio Paraíba do Sul (AGEVAP).

 

 

3.    Mestre em Ciência Animal, Especialista em Problemas Ambientais. Professor do Instituto Federal Fluminense (IFF).

 

RESUMO

Os estudos de percepção ambiental permitem investigar as relações que determinada comunidade estabelece com o ambiente em que vive. Estudos de como age e pensa uma comunidade pode colaborar com a aferição de melhorias ambientais e integração das pessoas com o meio. Os moradores do município de São João da Barra, localizado no Norte do Estado do Rio de Janeiro, vivem em uma região de baixa densidade populacional e baixo poder aquisitivo, onde está sendo construído um grande Complexo Portuário. O presente trabalho objetiva avaliar a percepção ambiental das comunidades localizadas nas proximidades do empreendimento. A metodologia utilizada consistiu na aplicação de questionários, em doze localidades do município, nestes foram abordadas questões relacionadas ao perfil sócio-econômico, conhecimentos ambientais, e conhecimentos dos moradores em relação ao Complexo Portuário do Açu, em fase de construção. Constatou-se uma baixa percepção ambiental das comunidades, demonstrando que não estão preparadas para receber o empreendimento, havendo necessidade de maior difusão da educação ambiental e sensibilização das pessoas para a reflexão sobre o seu entorno. 

 

INTRODUÇÃO

O modelo de desenvolvimento atual, desigual, excludente e esgotante dos recursos naturais, tem levado a produção de níveis alarmantes de poluição do solo, ar e água, contaminação da vida selvagem por resíduos, destruição da biodiversidade animal e vegetal e ao rápido consumo das reservas minerais e demais recursos não renováveis (Rede Ambiente, 2000).

Embora a exploração econômica dos recursos naturais deva combinar de maneira racional o desenvolvimento e as práticas de conservação para resguardar a qualidade ambiental da paisagem local, há poucas diretrizes técnicas e éticas para um consenso em estabelecer qual a melhor política para enfrentar os problemas ambientais não percebidos pela sociedade (Santos et al., 2004). Provavelmente, os principais motivos são a insuficiência do conhecimento ecológico e do sistema ambiental de interesse, a magnitude e a rapidez das alterações ambientais resultantes das atividades humanas associadas ao uso e ocupação do solo, e, sobretudo do nível de compreensão e percepção da sociedade entre a problemática ambiental e as atividades produtoras regionais (Moschini, 2009).                                                                                                                           

O estudo da percepção ambiental de uma comunidade configura-se em uma ferramenta essencial para compreensão acerca de comportamentos vigentes e para o planejamento de ações que promovam a sensibilização e o desenvolvimento de posturas éticas e responsáveis perante o ambiente (Marczwski, 2006).                                                                                    

Segundo Bezerra (2009) através da percepção ambiental são estabelecidas as relações de afetividade do indivíduo para com o ambiente, e, a partir da formação de laços afetivos positivos, pode acontecer a modificação dos valores ambientais atribuídos pelas pessoas. A tomada de consciência do ambiente pelo homem, no sentido de perceber o ambiente que está incluído, aprendendo a cuidar e proteger o mesmo define-se como percepção ambiental (Fernandes, 2003).                                                                

De acordo com Oliveira (2000) a concepção da proposta de Educação Ambiental no processo de percepção associa-se a uma estratégia política segundo a qual entende que a participação da sociedade é condição indispensável ao exercício de cidadania. É a educação que leva ao exercício da cidadania, capacitando os indivíduos à participação na vida em sociedade. (Fiori, 2002). Neste sentido, o objetivo deste estudo foi avaliar, através de questionários, a percepção ambiental das populações-alvo, especificamente aquelas que se concentram próximas ao empreendimento Porto do Açu, localizado no município de São João da Barra - RJ.

 

METODOLOGIA

Foi desenvolvido um questionário com perguntas semi-estruturadas, o qual foi aplicado em diferentes locais nas proximidades do empreendimento. À saber: Barcelos, Caetá, Palacete, Pipeiras, Barra do Jacaré, Sabonete, Água Preta, Cazumbá, Mato Escuro, Barra do Açu, Campo de Areia e Campo da Praia.                                                                                 

O questionário aplicado possuia perguntas que abordavam temáticas referentes ao nível de escolaridade, faixa etária e renda, expectativa de desenvolver alguma atividade remunerada ligada ao Empreendimento Portuário, percepção sobre o meio ambiente, qualidade e responsabilidade ambiental, e consequências da degradação do meio ambiente ligadas à atividade portuária. Os entrevistados foram escolhidos aleatoriamente, e os mesmos foram comunicados que não seriam identificados.                                        

Os dados foram tabulados no Programa Excel para posterior análise. Adotou-se uma metodologia de análise descritiva em percentual da freqüência das respostas obtidas (Pimentel Gomes, 2000). Foram entrevistadas 140 pessoas, no período de maio a novembro de 2009.                                   

Para obter as coordenadas geográficas das localidades onde foram realizadas as entrevistas foi utilizado um equipamento de GPS (Sistema de Posicionamento Global). Posteriormente os dados foram inseridos no Programa Google Earth.

 

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Foram visitadas doze localidades do município de São João da Barra, conforme mostrado no mapa abaixo, com os pontos localizados com o uso de GPS (Figura 1).

Figura 1 - Mapa com os pontos onde foram aplicados os questionários, obtido por meio de GPS. São João da Barra, RJ, 2009.

De acordo com os questionários aplicados foram obtidos os seguintes resultados:                                                                                                                             

Para o questionamento nível de escolaridade, 13% eram analfabetos, 27% tinham primeiro grau completo e 42% primeiro grau incompleto, 13% tinham segundo grau completo, 2% segundo grau incompleto, apenas 1% tinha algum tipo de curso superior completo, e 2% superior incompleto, nenhum dos entrevistados possuíam curso de pós-graduação. Estes dados evidenciam a baixa escolaridade nos locais da pesquisa.                                                                      

Cerca de 57% da totalidade dos entrevistados eram do sexo feminino, e 43% do sexo masculino. Sendo que 19% dos entrevistados estavam na faixa etária entre 15 e 25 anos, 28% estavam na faixa etária entre 26 e 40 anos, 28% estavam na faixa etária entre 41 e 55 anos, e 25% na faixa etária maiores de 55 anos.                                                                                                           

Quanto à renda mensal, um percentual de 64% da totalidade dos entrevistados respondeu receber entre um e dois salários mínimos, 12% responderam não ter nenhuma fonte de renda, 13% respondeu receber menos de um salário mínimo, 8% respondeu receber entre três e quatro salários mínimos, e apenas 3% respondeu receber mais de cinco salários mínimos.                

Foi possível também constatar que grande parte da população não possui expectativas pessoais em exercer alguma atividade no Porto do Açu, totalizando 62% dos entrevistados os que não desejam exercer atividades no Porto, 35% mencionaram desejar exercer atividade no Porto com carteira assinada, e 3% desejam trabalhar em alguma atividade comercial. Nenhum dos entrevistados mencionou querer desenvolver atividade informal.                                      

Com relação à importância ambiental da região onde moram, 63% responderam que a região apresenta importância ambiental, para a grande maioria a importância está relacionada à natureza, e principalmente para o fornecimento de recursos e sustento a partir desta, o que demonstra a falta de conscientização e educação ambiental. Neste contexto, destaca-se a antiga percepção de que a natureza, além de fornecer bens, também desempenha funções de suporte para a continuação das formas de desenvolvimento material e social (Rebollar, 2009). Outros 19% responderam que a região não apresenta qualquer importância ambiental, e 18% não souberam responder. Com isso, fica evidente que a Educação Ambiental deve atuar na busca por soluções que visem à melhoria dos conhecimentos dos moradores do entorno do empreendimento, de forma que o processo educativo seja legitimado, não apenas voltado para o público escolar.                                                                                   

Quando questionados sobre possíveis danos ocasionados pelo empreendimento, 44% dos entrevistados disseram que o mesmo ocasionará danos ao ambiente, enquanto 39% responderam que não ocorrerão danos, e 17% não souberam responder.                                                                                                       

Para 74% dos entrevistados a instalação do empreendimento Portuário já ocasionou alguma mudança na região, 21% responderam que não houve nenhuma alteração desde o início da implantação do empreendimento, e 5% alegaram não saber se houve ou não alguma alteração. De forma geral, a maioria das mudanças observadas pelos entrevistados está relacionada às questões sociais, como geração de empregos, aumento da violência e do fluxo de veículos. As alterações de cunho ambiental foram secundárias, sendo mencionadas apenas por 8% dos entrevistados.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

As análises das informações obtidas com a pesquisa possibilitam inferir que as comunidades não estão preparadas para as grandes transformações em nível ambiental, urbano e econômico geradas com a implantação do Complexo Portuário. Outro dado de relevante importância que pôde ser constatado é que os moradores consideram a natureza de forma isolada, como fornecedora de recursos.                                                                                                

A instalação do Complexo Portuário do Açu é percebida pela maioria dos moradores como positiva, devido à grande quantidade de empregos que será gerada, entretanto 62% dos entrevistados disseram não ter expectativa de trabalhar no empreendimento. Alterações do ponto de vista ambiental são consideradas mudanças secundárias, apesar de 74% dos entrevistados terem relatado que já observaram mudanças na região com a instalação do empreendimento.                                                                                                

Segundo Reigota (1991) “... para que possamos realizar a educação ambiental, é necessário, antes de mais nada, conhecermos as concepções de meio am­biente das pessoas envolvidas”. Espera-se que esta pesquisa subsidie projetos de educação ambiental que promovam melhorias na percepção e sensibilização dos moradores, integrando os impactos ambientais e sociais relacionados ao estabelecimento do Complexo Portuário com a conservação dos ecossistemas.  É indispensável que se comece a discutir noções mais claras e diretas sobre aspectos relacionados ao meio ambiente, destacando-se a preservação do ecossistema local para sua própria sobrevivência.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

Bezerra, F.S.B. França, L.S. Oliveira, CP. Menezes, L.C.R. Oliveira, C.R.M. Qualidade de vida e percepção ambiental dos moradores de uma comunidade rural de Mossoró, RN. Revista Verde, Mossoró, v.4, p. 39-44, 2009.

Fernandes, R.S. Pelissari, V.B. Souza, V.J.P. Gorza, L.S. Laranja, A.C. Percepção Ambiental dos Alunos da Faculdade Brasileira – UNIVIX. Vitória, ES. Anais. In: 5° Seminário Estadual sobre Saneamento e Meio Ambiente, Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental, Vitória. Abes v.1, p.1-8, 2003.

Fiori, A. Ambiente e educação: abordagens metodológicas da percepção ambiental voltadas a uma Unidade de Conservação. 42 p. Dissertação de Mestrado. PPG-ERN, UFSCar, São Carlos, 2000.

Marczwski, M. Avaliação da percepção ambiental em uma população de estudantes do ensino fundamental de uma escola municipal rural: um estudo de caso. Dissertação de Mestrado, Porto Alegre, p. 15, 2006.

Moschini, L.E. Zoneamento ambiental da bacia hidrográfica do médio Mogi-Guaçu Superior. Tese de doutorado-Universidade de São Carlos, São Carlos, 2009.

Oliveira, E.M. Educação ambiental: uma possível abordagem. Brasília. Ed. IBAMA, 150 p, 2000.

Pimentel Gomes, F. Curso de Estatística Experimental. 14° Edição. ed. Piracicaba: Degaspari. 477p, 2000.

Rebollar, P.M. Educação Ambiental e os termos meio ambiente e impacto ambiental na visão de alunos do ensino superior da região da grande Florianópolis – SC, Biotemas, v. 22, p.173-180, 2009.

REDE AMBIENTE. Disponível em http://www.redeambiente.org.br. Acesso em 28 de setembro de 2011, 2000.

Reigota, M. O meio ambiente e suas representações no en­sino de ciências em São Paulo – Brasil. Uniambiente. Boletim da Comissão Interinstitucional sobre Meio Ambiente e Educação Universitária,v. 1, p. 27-30, 1991.

Santos, J.E. Zanin, E.M. Sato, M.A. Práxis da Educação Ambiental na Investigação em Ecologia. Perspectiva (Erexim), Erechim, v. 28, n. 101, p. 17-28, 2004.

Ilustrações: Silvana Santos