Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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04/06/2012 (Nº 40) O outro lado do Lixo – Intervenção Escolar e Comunitária
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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DE PERNAMBUCO

O outro lado do Lixo – Intervenção Escolar e Comunitária

 

 

 

João Rufino de Freitas Filho

Licenciado em Química, Doutor em Química, atualmente é Professor Adjunto do Departamento de Química da Universidade Federal Rural de Pernambuco – DQ/UFRPE. E-mail: joaoveronice@yahoo.com.br

 

 Ivoneide Mendes da Silva

Licenciado em Química, Especialista em Gestão e Políticas Públicas,  atualmente é Técnica em Química do Departamento de Química da Universidade Federal Rural de Pernambuco – DQ/UFRPE. E-mail: ivonms@hotmail.com

 

Taciana Lima da Silva

Estudante do Curso de Licenciatura em Química do Departamento de Química da Universidade Federal Rural de Pernambuco – DQ/UFRPE. E-mail: tacisilvaquimica@hotmail.com

 

Júlio César R de Freitas

Biólogo, Especialista em Gestão Educacional, atualmente Professor de Ciências da Escola Assis Chateaubriand, Recife – PE. E-mail: juliobiologo2004@yahoo.com.br.

 

 

E-MAIL DE CONTATO: joaoveronice@yahoo.com.br

SEÇÃO: Relatos e Práticas de Educação Ambiental


 

 

RESUMO

 

O presente trabalho apresenta um projeto de Educação Ambiental realizado por estudantes do curso de Licenciatura em Química da UFRPE, no período de fevereiro a junho de 2011, na Escola Municipal Sociólogo Gilberto Freyre, Recife - PE, com estudantes da terceira e quarta séries do ensino fundamental. Ao longo do projeto, o estudante foi incentivado a descobrir sua relação com o local em que vive, a estudar e a ampliar seu relacionamento com o meio ambiente, tornando-se apto a atuar junto à comunidade. Com a finalidade de alcançarmos os objetivos propostos, realizamos com as turmas atividades de caráter interdisciplinar envolvendo todas as disciplinas do currículo escolar. Verificou-se, no final do projeto, que os estudantes encontravam-se sensibilizados sobre os problemas ambientais existentes no entorno da Escola e motivados a atuarem na comunidade em prol do meio ambiente, propondo soluções e apresentando-as através de cartilha informativa e jornais mensais.

 

Palavras-chave: Lixo. Ambiente. Contexto escolar.

 

 

1. INTRODUÇÃO

 

  Diante da crise ambiental provocada pelo modelo agrícola implantado no mundo a partir das décadas de 50 e 60, cientistas, governos, organizações não-governamentais e parte da população consciente encontram-se preocupados em encontrar alternativas de desenvolvimento que propiciem ao ambiente a sua preservação e recuperação gradual e sistemática, tendo em vista a sustentabilidade da vida humana na Terra. Assim, impõe-se, agora, mais do que nunca, um desenvolvimento regional responsável. De acordo com a Sociedade Internacional de Economia Ecológica, a sustentabilidade é uma relação entre sistemas dinâmicos, econômicos e ecológicos, orientada pelos requisitos de que a vida Humana possa evoluir; de que as culturas possam se desenvolver; e de que os  efeitos das atividades humanas permaneçam dentro dos limites que impeçam a destruição da diversidade e da complexidade do contexto ambiental (GERARDI, SALAMONI, 2001, p.73).

A Educação Ambiental é uma dimensão da educação, um processo que busca o desenvolvimento de uma consciência crítica das pessoas e pode ser fundamental no enfrentamento das questões ambientais e sociais. Cabe à Educação Ambiental formar cidadãos conscientes, capazes de tomar resoluções sobre a realidade ambiental, de forma comprometida com a vida do planeta.

É importante ressaltar que, a palavra ambiente pode ter inúmeras definições. No senso comum, refere-se ao ambiente físico ou “natural”, que contém os seres humanos e demais espécies vivas. Para fins deste estudo, no entanto, o conceito é expandido para englobar não apenas o entorno físico, mas também os aspectos sociais, culturais, econômicos e políticos inter-relacionados. Em conseqüência, por educação ambiental entende-se a dimensão dada ao conteúdo e a prática da educação, orientada para a resolução dos problemas concretos do meio ambiente através de enfoques interdisciplinares e de uma participação ativa e responsável de cada indivíduo e da coletividade.

Desenvolver um cidadão consciente do ambiente total, preocupado com os problemas associados a esse ambiente e que tenha o conhecimento, as atitudes, motivações, envolvimento e habilidades para trabalhar individual e coletivamente em busca de soluções para resolver os problemas atuais e prevenir os futuros.

Cabe ressaltar, que a integração de conhecimentos, valores e capacidades permitem gerar atitudes comunitárias coerentes com os pressupostos da educação ambiental. É tarefa de o educador ambiental desenvolver o associativismo, difundir o conhecimento e sugerir técnicas e instrumentos que inspirem o engajamento da comunidade, em prol da manutenção de sistemas ambientais sustentáveis e que gerenciem eco-eficientemente seus resíduos.

Baseados em um modelo econômico capitalista, que leva ao consumismo crescente, os processos de urbanização, industrialização e a consolidação de padrões modernos nas atividades do espaço agrário, determinaram a ocorrência de problemas ligados à produção de lixo, tanto nas cidades quanto no campo.

Cuidar do meio ambiente é responsabilidade de todos e a escola é um local favorável ao processo holístico na educação ambiental. Sabendo que as escolas são grandes geradoras de resíduos sólidos, é importante que trabalhemos no sentido de envolver nossos alunos e educadores para que essa situação seja modificada, formando novos hábitos.

Embora muitas escolas, concebam projetos de educação ambiental com uma abordagem genérica da questão ambiental e desvinculada do projeto educativo da escola, percebemos que existe uma tendência clara em trabalhar cada vez mais com esta prática em sala de aula.

O objetivo deste projeto foi realizar um trabalho de Educação Ambiental - tendo como contexto o lixo - com crianças da terceira e quarta série do ensino fundamental da Escola Municipal Sociólogo Gilberto Freyre, Recife – PE, contribuindo para que as crianças e gestores adquirissem uma compreensão sobre o meio ambiente e desenvolvessem uma consciência crítica sobre ele.

Para Cunha e Caixeta Filho (2002), muitas vezes, o lixo é tratado com a mesma indiferença da época das cavernas, quando não era verdadeiramente um problema, seja pela menor quantidade gerada, seja pela maior facilidade da natureza em reciclá-lo. Entretanto, em tempos mais recentes, a quantidade de lixo gerada no mundo tem sido grande e seu mau gerenciamento, além de provocar gastos financeiros significativos, pode provocar graves danos ao meio ambiente e comprometer a saúde e o bem-estar da população. Por esse motivo, o interesse em estudar resíduos sólidos tem se mostrado crescente.

A educação ambiental foi o eixo central da proposta. O educando foi incentivado a descobrir sua relação com o local em que vive e a estudar e ampliar seu relacionamento com o meio ambiente, tornando-se apto a atuar junto à comunidade.

 

 

 

 

 

2. ESBOÇO METODOLÓGICO

 

Nossas atividades, na Escola Municipal Sociólogo Gilberto Freyre, iniciaram em fevereiro de 2011, com um período de observação, para um melhor conhecimento da comunidade escolar e seus anseios, quanto às questões ambientais. Efetivamente, começamos a atuar na Escola, no mês de março de 2011.

Os estudantes abrangidos pelo projeto foram crianças pertencentes à terceira e quarta séries do ensino fundamental, com idades entre 11 a 14 anos. Realizamos encontros semanais durante os meses de março a junho de 2011.

O projeto foi elaborado levando-se em conta a comunidade escolar. No início de nossas observações, os professores da escola indicaram alguns rumos a serem seguidos com relação à preocupação ambiental e a comunidade escolar. Esses caminhos foram pensados e levados em consideração na elaboração do projeto e, posteriormente, trabalhados com os estudantes. Foi sugerido conjuntamente que abordássemos sobre a questão do lixo urbano, deslizamentos de barreiras e, suas consequências e causas, já que muitos estudantes eram moradores do Córrego da Fortuna; e no período de chuvas, sofrem com tais efeitos, ou seja, com acúmulos de lixo nas ruas, barreiras e canais. As atividades foram organizadas em forma de oficinas, palestras, vídeos educativos.

Conforme Reigota (1991, p.38), a Educação Ambiental deve empregar “metodologias que permitam ao estudante questionar dado e ideias sobre um tema, propor soluções e apresentá-las”. Este autor sugere que em projetos de Educação Ambiental seja empregado o método ativo, o qual permite que o estudante participe das atividades, desenvolva progressivamente o seu conhecimento e comportamento em relação ao tema, de acordo com sua idade e capacidade.

Com o fim de alcançarmos os objetivos propostos no projeto, procuramos abordar, as questões ambientais de forma interdisciplinar no diferente componente curricular como geografia, língua portuguesa, história, meio ambiente e ciências. Além das atividades pedagógicas propostas, foram elaboradas cartilhas informativas e jornal impresso, os quais foram divulgados em mural na Escola - construídos pelos estudantes com materiais descartáveis – Assim, trabalhamos com os estudantes a importância do reaproveitamento e do consumo consciente dos materiais com o objetivo de contribuirmos com o meio ambiente. Utilizamos todos os espaços da Escola para a realização das atividades propostas. Como ferramentas de aprendizagem, utilizamos mapas, imagens, livros de literatura e recursos audiovisuais.

Com o objetivo de discutirmos com os estudantes a questão dos cuidados que devemos ter com o meio ambiente, mas especificamente o lixo, e que tudo e todos estão interligados e somos responsáveis pelos nossos atos, tratamos com eles sobre as mudanças climáticas, o aumento da população e a consequente escassez de água.

Realizamos um passeio pedagógico no entorno da escola, onde deparamos com: acúmulos de lixo em locais não apropriados, por exemplo, em encosta; b) deslizamento de barreias; c) e a erosão das encostas. Durante o passeio os estudantes foram conduzidos a verificar como o ser humano interfere no meio ambiente e como pode causar grandes problemas para todo o Planeta.

No retorno à escola, foi sugerido que os estudantes abordassem sobre os deslizamentos e a erosão das encostas, suas consequências e causas, já que muitos estudantes moradores do Córrego da Fortuna, no período de chuvas, sofrem com tais efeitos. Esta atividade foi realizada com materiais reaproveitados de monografias e relatórios da universidade. As explorações realizadas pelos alunos, durante as saídas de campo, deram origem a textos individuais e coletivos. Nestes, deixaram registradas suas impressões sobre o meio ambiente e curiosidades.

 

3. DISCUTINDO OS RESULTADOS

 

O projeto: O outro lado do Lixo – Intervenção Escolar e Comunitária, foi desenvolvido na perspectivas de conscientização, contextualização e formação de cidadãos, de modo que professores / alunos / comunidade em geral pudessem intervir de forma consciente e mais ativamente na sua realidade. O esquema 1 abaixo sumariza os eixos norteadores no estudo da temática do projeto.

 

Esquema 1: Eixos norteadores no estudo da temática do projeto

 

Realizamos com as crianças da Escola um passeio pedagógico pelo bairro, o qual proporcionou inúmeros debates sobre os temas que estavam sendo tratados: o meio ambiente, a geografia, sua ocupação, o intenso processo de expansão e estruturação urbana, os problemas sociais, o lixo, o esgoto, etc. (Figura 1, 2 e 4).

 

                   

Figura 1: Lixo em encosta    Figura 2: lixo em córrego   Figura 3: lixo vs. rua

 

Os estudantes produziram texto individual e coletivo em aulas de Português - em forma de oficina - os quais abordam os temas tratados em nossa saída de estudos e em nossos encontros (aulas em sala). Neles aparecem suas observações e reflexões, figuras 4 e 5.

 

                     

Figura 4. Produção de texto individual      Figura 5: Produção de texto coletivo.

 

Com os dados produzidos anteriormente, em aula de educação artística foi confeccionado um Mural. Convém destacar que o mural foi confeccionado pelos estudantes e com materiais reaproveitados, figuras 7 e 8. A folha de papelão foram recobertas com folhas de trabalho monográfico (reaproveitadas)

 

                   

Figura 7: Confecção do mural.                     Figura 8: Mural com as produções.

 

A figura 9 demonstra uma aula de ciências em turma do ensino Médio. A parte experimental consistiu na identificação de substâncias presentes no lixo. A partir da seleção e separação dos materiais encontrados no lixo foram construídos pelos estudantes equipamentos e realizaram experimentos simples com materiais reaproveitados.

 

Figura 9: Materiais reaproveitados em aulas de ciências.

 

Dando continuidade ao projeto, foi elaborada uma Cartilha Informativa. As cartilhas foram distribuídas e divulgadas na escola campo de estudo; e também na comunidade em que a escola estava inserida. A ideia da cartilha foi reunir informações relacionadas à questão do lixo, com o objetivo de facilitar o acesso à informação técnica, através do uso de uma linguagem mais acessível. A cartilha visou orientar e conscientizar os estudantes e comunidades em geral através de conceitos, informações e procedimentos relacionados à gestão do lixo urbano.

Jornais impressos também foram elaborados, mensalmente, e distribuídos com os estudantes, comunidade em geral. Vejamos um exemplar do jornal impresso na figura 10.

 

 

Figura 10: Jornal impresso e distribuídos.

 

A qualidade do jornal impresso causou impacto na comunidade escolar. A distribuição dos exemplares do jornal, mensalmente, era feita no dia-a-dia das atividades e pelos estudantes. Eles fixavam o jornal do Mural e distribuíam, para os vizinhos; entregavam exemplares na padaria, nas mercearias, no posto de saúde e na associação de bairro. Com uma página, o jornal trazia no cabeçalho o título e a principal atividade realizada (gestão do lixo), geralmente uma matéria positiva, com fotos. Os jornais e a cartilha foram peças importantes na comunicação do projeto, e o objetivo a ser alcançado era uma maior mobilização em torno dele. A cartilha e os jornais foram impressos com materiais reaproveitados, tais como folha de monografia e relatório.

 

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

            O desenvolvimento do projeto: O outro lado do Lixo – Intervenção Escolar e Comunitária permitiu que os estudantes envolvidos tivessem oportunidade de observar tudo relacionado com a questão do lixo e algumas mudanças sofridas pelo bairro Córrego da Fortuna, com o processo de urbanização, o qual acarretou profundas alterações ambientais. Os estudantes foram incentivados a considerar o meio ambiente e a perceberem que fazem parte dele e que são sujeitos importantes, na preservação do mesmo.

Os professores e estudantes também se mostraram preocupados com o que foram descobrindo no bairro ao longo do Projeto: falta de saneamento, problemas de encostas, córrego poluído, acúmulo de lixo etc.; e, sobretudo, que esses lixos podem ser reaproveitados em sala de aula, usando diferentes estratégias e em diferentes disciplinas do currículo. Verificou-se, ao fim desta primeira etapa de desenvolvimento do Projeto, que os estudantes encontravam-se sensibilizados sobre os problemas ambientais no entorno da escola e da comunidade em que a escola está inserida e sentiram como atores motivados a atuarem na comunidade em prol do meio ambiente, propondo soluções e apresentando-as.

O projeto foi desenvolvido durante os meses de maio/junho de 2011, no entanto a sugestão do grupo envolvido – professores, gestores e coordenadores do projeto - é que ele seja permanente, tendo em vista que a criança desenvolve novos conhecimentos progressivamente, de acordo com sua idade e capacidade. Convém destacar que a continuação do projeto proporcionará aos estudantes novas oportunidades de construção de conhecimento e, ao mesmo tempo, estaria lhes preparando para serem cidadãos ativos na sociedade. 

 

5. AGRADECIMENTOS

A PRAE/UFRPE e Gestores da Escola Municipal Sociólogo Gilberto Freyre.

6. REFERÊNCIAS BIBIOGRÁFICAS

CUNHA, V.; CAIXETA FILHO, J. V. Gerenciamento da coleta de resíduos sólidos urbanos: estruturação e aplicação de modelo não-linear de programação por metas. Gest. Prod. v. 9, n. 2, p. 143-161, ago. 2002.

GERARDI, L. H. O; SALAMONI, G. Princípios sobre o ecodesenvolvimento e suas relações com a agricultura familiar. Disponível em < www.ageteeo.org.ber >. Acesso em: 09 jun. 2009.

REIGOTA, Marcos. O que é educação ambiental. São Paulo: Brasiliense, 1991, p. 38.

Ilustrações: Silvana Santos