Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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Para Sensibilizar
04/06/2012 (Nº 40) É preciso ter cuidado para não pintar a besta de verde
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Educação Ambiental em Ação 40

 Entrevista / Vandana Shiva

É preciso ter cuidado para não pintar a besta de verde

 

 

INIMIGA Nº UM DA BIOTECNOLOGIA, A FÍSICA VANDANA SHIVA CRITICA AS NEGOCIAÇÕES AMBIENTAIS, MAS CRÊ NO ÊXITO DA CONFERÊNCIA

 

Fabio Braga/Folhapress

 
 

Vandana Shiva anteontem, em hotel na zona central de São Paulo


ANDREA VIALLI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA


A física e ativista indiana Vandana Shiva, uma das grandes vozes da atualidade sobre desenvolvimento sustentável, crê que a Rio+20 não será um fracasso, contrariando as previsões pessimistas. 

A conferência se salvará não pelos acordos que serão firmados -que devem ser menos impactantes do que aqueles feitos na Eco-92- mas pela força de pressão da sociedade e dos movimentos sociais, na visão dela. 

"Conectadas como nunca, as pessoas farão a diferença no sentido de propor a construção de novos caminhos para o mundo", diz a ativista, que veio ao Brasil para participar do ciclo de palestras Fronteiras do Pensamento. 

Crítica feroz da globalização e da biotecnologia, Shiva ressalta que os governos estão apáticos nas principais convenções ambientais (clima, biodiversidade) por causa do avanços dos grandes grupos transnacionais e seus lobbies poderosos, os quais, mais do que nunca, influenciam as decisões dos governos. Aqui, ela fala dos riscos do conceito de "economia verde", foco da conferência. 

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/images/ep.gif


Folha - A sra. virá à Rio+20?
Vandana Shiva - Sim, chego no dia 17 de junho para os painéis que estão sendo preparados pelo governo brasileiro. Um deles é sobre segurança alimentar e energética. Uma das grandes mudanças da Rio+20, em relação à Eco-92, da qual também participei, é que agora a agricultura está no centro das discussões. Especialmente a agricultura tradicional, que ganha importância como uma questão ecológica. Também farei parte de várias atividades na Cúpula dos Povos, com o objetivo de acordar os líderes. 

Os líderes mundiais precisam acordar para o desenvolvimento sustentável? Há críticas sobre a agenda difusa da Rio+20.
Em 1992, a agenda era bem clara: incluir a proteção da natureza entre as obrigações da comunidade internacional. Daí surgiram as principais convenções, como a do clima e da biodiversidade, e também os Princípios do Rio, que foram um balizador das leis ambientais no mundo todo. Mas a agenda da Rio+20 está difusa por um motivo claro: a ascensão, nos últimos anos, do poder das grandes corporações multinacionais. 

As empresas estão influenciando as decisões globais sobre ambiente?
Sem dúvida, e não para o bem. A ascensão do poder das grandes empresas se deu em razão dos acordos de livre comércio da OMC (Organização Mundial do Comércio). Esses acordos permitiram amplo acesso das empresas aos recursos naturais e estão ajudando a desregulamentar o que foi duramente regulamentado durante a Eco-92. Desde então, as multinacionais estão destruindo o futuro da humanidade. Foi por causa delas que não há avanços nas negociações de clima, por exemplo. 

E mudanças climáticas não estão na agenda da Rio+20.
Não há progressos nessa área desde a conferência de Copenhague. Depois vieram os encontros de Cancún e Durban, sem resultados efetivos. Por causa do lobby das grandes corporações, os países estão 'desregulamentando' o que havia sido regulamentado antes. 

A sra. poderia dar exemplos dessa 'desregulamentação'?
O Brasil é um exemplo, veja o que ocorreu com os transgênicos. Quando eu vim pela primeira vez ao Rio Grande do Sul, a convite do José Lutzenberger [ex-ministro do Meio Ambiente], havia um forte movimento dos agricultores contra as sementes geneticamente modificadas.
Agora os campos estão cobertos de soja transgênica. Isso é parte da mudança trazida pela globalização, da tomada do poder pelas multinacionais que são contrárias a qualquer acordo ambiental.
Os setores mais nocivos são as empresas de combustíveis fósseis, os gigantes do agronegócio e da biotecnologia. O Canadá era um país progressista na Eco-92 e agora está paralisado nas negociações ambientais por causa das empresas que exploram óleo nas areias betuminosas. 

Como tornar a conferência relevante?
A resposta está nas pessoas. É por isso que a Cúpula dos Povos é tão importante. Serão as pessoas e os movimentos sociais que vão impor uma nova agenda para a humanidade. Conectados como nunca, as pessoas farão a diferença no sentido de propor a construção de novos caminhos. Veja o movimento "Occupy", por exemplo. 

Outra discussão da Rio+20 será a formulação de novos indicadores econômicos. A sra. acompanha esse debate?
Sim, e fico feliz que muitos economistas 'mainstream', como Joseph Stiglitz, estejam empenhados nesse debate. Mas o que não podemos é transformar a natureza em commodity. Devemos valorar a natureza, mas não transformar o ar, a água, as florestas em mercadorias.
Esse é um dos riscos do conceito de economia verde. Ele não é ruim em essência, mas o que me preocupa é se essa não será mais uma manobra para os poderosos saquearem os recursos naturais em nome dessa "nova economia". Temos de ter cuidado para não pintar a besta de verde.


 

Raio-X / Vandana Shiva

 
Quem é
Ambientalista e feminista, ficou famosa nos anos 1970 ao se amarrar a árvores para impedir seu corte, criando o movimento Chipko 
 
Nascimento
Dehradun, na Índia, em 1952 
 
Atuação
Diretora da Fundação de Pesquisa em Ciência, Tecnologia e Ecologia, em Nova Déli, na Índia 



 

Cúpula não dará prazos para economia verde



Encontro apenas terá decisão política de estabelecer metas, diz diplomata brasileiro 

DE NOVA YORK


A Rio+20, conferência ambiental da ONU que ocorre neste mês na capital fluminense, não deverá definir prazos e metas de desenvolvimento sustentável para os países. Esse processo só começará no ano que vem.

"Teremos a decisão política de que o mundo passará a contar com metas de desenvolvimento sustentável, como houve em 2000 a decisão de que o mundo passaria a ter metas de desenvolvimento do milênio", diz o embaixador Luiz Alberto Figueiredo Machado, secretário-executivo da Comissão Nacional da Rio+20.

Segundo ele, a definição de metas e prazos dependeria do parecer de técnicos e cientistas, e não há tempo hábil para que isso seja discutido antes da cúpula. "A ideia hoje é que a determinação das metas ocorra de 2013 a 2015 e que, em 2015, essas metas sejam postas em prática."

O negociador brasileiro também afirmou que os emergentes não fogem da responsabilidade de ajudar outros países em desenvolvimento a financiar iniciativas sustentáveis -por exemplo, infraestrutura e pesquisa sobre energia renovável.

Machado diz, porém, que os emergentes buscam engajamento mais forte dos países desenvolvidos para atingir esse tipo de meta.

Embora a União Europeia declare estar pronta para adotar metas concretas de desenvolvimento sustentável, o bloco não está disposto a dar dinheiro para implementar essas ações. Para os europeus, os recursos devem vir da iniciativa privada.

(VERENA FORNETTI) 

Fonte: Folha de S.Paulo

01/06/2012

Ilustrações: Silvana Santos