Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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10/09/2018 (Nº 38) A Prática da Educação Ambiental em Sala para Explicar a Abundância e Escassez de Recursos.
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Revista Educação Ambiental em Ação 38

A Prática da Educação Ambiental em Sala para Explicar a Abundância e Escassez de Recursos.

 

Autor: Ronaldo Gomes Alvim despreze

Doutor em Biologia Social pela Universidad de Salamanca, Bolsista de Desenvolvimento Cientifico Regional do CNPq/ FAPITEC-SE; Professor Visitante do Programa Regional de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente – PRODEMA – da Universidade Federal de Sergipe; Currículo Lattes: lattes.cnpq.br/3857891508359148.E-mail: alvimrg@yahoo.com.br;  Tel: (079) 9173-7002/ (79) 2105-6783

 

Resumo

O presente trabalho é parte de uma atividade interdisciplinar desenvolvida em sala de aula para poder trabalhar junto ao aluno as diversas circunstâncias que envolvem o crescimento, seja ele populacional ou de produção e consumo dos recursos. O estudo destas relações pode ser utilizado em forma de projeto que envolva professores de diversas disciplinas como a matemática, ciências/biologia, ecologia, letras, história, filosofia, dentre outras, unidas ou não pelo mesmo propósito, permitindo aos professores explorar a temática sobre a visão do desenvolvimento sustentável e do aluno uma ação coletiva de reflexão sobre suas ações e dos valores sociais contemporâneos. O ponto culminante desta prática será o de entender sua dimensão e responsabilidade com o entorno.

Palavras chave: Prática Docente; Crescimento Populacional; Jogo Interativo; Educação Ambiental; Recursos Naturais.

 

summary
This work is part of an interdisciplinary activity developed in the classroom for the student to work alongside the various circumstances surrounding the growth, whether it be population or consumption production and consumption resources. The study of these relationships can be used in the form of project that involves teachers from different disciplines such as mathematics, science / biology, ecology, literature, history, philosophy, among others, united or not by the same way, allowing teachers to explore the sustainable development thematic vision and student collective action to reflect on their actions and contemporary social values​​. The culmination of this practice will be to understand their size and responsibility to the environment.

 

Keywords: Teaching Practice; Population Growth, Interactive Games, Environmental Education, Natural Resources

 

 

Introdução

O uso de jogos interativos em sala de aula seja desde o ensino fundamental ao ensino superior, é sem dúvida uma das formas mais eficazes e dinâmicas de se criar no aluno a construção de bases conceituais que ultrapassam a fronteira de sua realidade capaz de contribuir com a dimensão de um conhecimento inter e multidisciplinar( MELO, 2002).

Estas ações práticas e reflexivas dos experimentos em sala de aula dão margem à discussão, redimensionam a realidade do discente e propicia o prazer pela aquisição do conceito científico a partir do prazer gerado, cria prazer a partir da descoberta de conquistar o conhecimento e, por sua vez, contribui para construção do senso crítico das ações individuais e coletivas apoiadas por experiências de socialização (CANIANTO, 1992; DELIZOICOY et ANGOTTI).

Partindo desta premissa, não há como negar que o ensino das ciências em sala de aula, sobre esta perspectiva, dá um novo valor ao conceito pré-elaborado ao aluno e, ao mesmo tempo, instaura nele, regras como sintonia social onde a aprendizagem tende, sobretudo, despertar o valor do entorno em um momento em que a discussão de uma temática ecológica torna-se cada vez mais necessária a partir de uma perspectiva socioecológica e ampliada ao saber interdisciplinar (VILLAR, 1997; ALVIM, 2008).

Embora muitos ainda tendam em considerar a ecologia como um padrão biológico verde preservacionista/conservacionista, hoje já se tenta vislumbrar uma nova dimensão a esta ciência permeada de valores sociais, educacionais, políticos, econômicos, culturais, filosóficos, históricos, geográficos, padrões construídos que podem levar o aluno a levantar questionamentos como consumo, qualidade de vida, saúde, lazer e criar novos paradigmas de visão de mundo.

Partindo deste conceito, não há como negar que o ensino de ciências, sobretudo de padrões ecológicos tornam fundamentais a uma nova postura ligada ao desenvolvimento sustentável que partem de sua perspectiva de complexidade e interdisciplinaridade e que trabalhada, unindo a teoria à prática a partir da necessidade de um posicionamento ante um problema que se tenha como relevância para o estudo, cria possibilidades para o aluno desenvolver o conhecimento científico de forma mais prazerosa através de métodos e técnicas que tenderão a se aplicar à sua formação cidadã. (KOFF, 1995)

As condições anteriores expostas nos fazem levar a considerar que as tendências contemporâneas do ensino, sobretudo a ecologia, ultrapassa o padrão de conhecimento disponível livro didático e muitas vezes de forma equivocada ou fora do padrão de vida do aluno que para ser bem compreendida e assimilada, deve ser transmitida a través de atividades práticas, transmitindo os conhecimentos teóricos a partir de bases consistentes, pois “a excelência da argumentação, a explicitação e a clareza da formulação das questões e das perguntas determinarão o grau de cientificidade ao projeto” (FAZENDA, 1995:69) bem como a sua aplicabilidade no cotidiano do aluno.

Expor o conhecimento e aplicar a uma proposta educativa lúdica, ainda que haja uma boa teoria, compreendê-la nem sempre é factível o que requer outras formas de atividades que façam como a aplicação de um jogo dentro de uma temática de aprendizado específico, por exemplo, cria uma forma prazerosa de aprendizagem que tende a facilitar o crescimento intelectual do sujeito, rompendo a rigidez do ensino tradicional e desperta no aluno, o senso pela descoberta. No caso da ecologia, traz temas socioambientais para sala de aula, expondo seus resultados e impressões socializando, democratizando e valorizando conhecimentos principalmente quando partem da realidade e, consequentemente do interesse e curiosidade do aprendiz, capaz de interferir positivamente nos indivíduos, provocando uma transformação em seu modo de pensar e agir ao canalizar sentimentos e emoções que resgatam o que lhes era indiferente, reconhecendo e reconstruindo novas realidades (MOREIRA; SCHWARTZ, 2009:211) que necessita não apenas de uma boa base, mas, também, fazer parte do cotidiano do aluno.

 

O crescimento populacional

Há de se considerar que qualquer prática científica como diz BAUMGARTEN (2009:19) tende a

produzir conhecimentos sobre natureza e sociedade - avanços, problemas, métodos e técnicas - e a discussão sobre a perspectiva da complexidade, com seus diálogos e práticas inter e transdisciplinares podem (…)  lidar com as incertezas do mundo contemporâneo e possibilitar a necessária reflexividade na construção de conhecimentos sobre um mundo cada vez mais complexo.

Partindo do exposto, quando se aplica qualquer conceito em sala de aula a partir de dinâmicas envolvendo temas ambientais, não há como negar que suas bases conceituais transcenderão as perspectivas biológicas para abrir espaço a métodos e práticas sociais, econômicas e culturais.

O ensino da ecologia não foge à regra, embora muitos docentes tem certa dificuldade de trabalhar a temática com os alunos por entender que alguma atividade sobre esta ótica, deva ser realizada fora do espaço escolar o que nem sempre é verdade, e muitas podem acontecer na própria sala de aula.

Dentre os diversos temas que trata a ecologia, um se destaca já que se aplica diretamente à condição do padrão de vida humana e tem se tornado tema de grandes discussões é o crescimento populacional. Seu estudo parte da compreensão das condicionantes que levam o sucesso e fracasso do aumento populacional influenciado por diversos fatores como: as condições favoráveis à reprodução, abundância de recursos, competição, disponibilidade de alimentos, presença de predadores, espaço geográfico, clima favorável, índices e natalidade e mortalidade, etc. (NEBEL & WRIGHT, 1999; TOWNSEND, BEGON & HARPER, 2006).

Quando as condições são favoráveis, as populações tendem a crescer de forma geométrica, mas isto é impossível ocorrer já que em algum momento, os recursos disponíveis tendem a diminuir a ponto de impedir que o crescimento seja contínuo e eterno (Kormondy, 2002).

Ainda que pareça ser uma temática restrita aos outros seres, vivos, a exploração deste tópico a partir da condição humana, poderá abrir várias reflexões/discussões que o envolvem a sobrevivência da nossa espécie.

Embora a maioria dos fatores citados, até o instante, tem sido pouco relevante em criar algum impacto na nossa condição de vida, a prática deste jogo poderá atentar os alunos sobre questões como o sobreconsumo de alimentos agropecuários, a sobre pesca que ultrapassam os padrões vitais para a sobrevivência de qualquer espécie e, consequentemente, acentua a degradação dos ecossistemas com a produção de rejeitos contaminação aquática, terrestre e edáficos que tendem a afetar toda a biodiversidade do planeta “em um grau de complexidade cada vez maior, o que nos obriga a analisar a questão a partir de novas ou várias perspectivas integradas (…)”  (SCHUSCHNY, 2010:2)

 

Experiência didática:

Na contemporaneidade, tem-se discutido muito a questão da produção econômica neoclássica dos preços dos alimentos, a inflação, a depleção dos recursos naturais renováveis e não renováveis gerados pela ordem do crescimento populacional. Por outro lado, as condições descritas são um fator desencadeador à falta de distribuição de tais recursos, acabam por desencadear a fome em todos os continentes, comprometendo os recursos públicos para obras essenciais como educação, saneamento, melhoramento viário e arborização para ações como violência social, miséria, caos nos serviços de saúde, e o desperdício de todos estes fatores.

Não há como negar que as explicações supracitadas apresentam uma dimensão que provavelmente ultrapassa a visão do professor de ciências/biologia que pode aproveitar o jogo como uma atividade da sua área em específico, mas a dinâmica de tal estudo visto de forma interdisciplinar, poderá se transformar em um projeto rico em informações interdisciplinar que envolva todas as áreas a partir de um projeto que envolva todos os docentes.

Espera-se que com esta atividade, se bem trabalhada e com apoio dos demais professores, gere no aluno capacidade de reflexão/discussão e mudanças de paradigmas pautados em valores éticos, políticos, responsabilidade social e ambiental quanto ao armazenamento, consumo e rejeito dos produtos de forma adequada.

 

Objetivo:

Promover reflexão-ação sobre o crescimento populacional, produção, consumo, desperdício de alimentos a degradação socioambiental a partir do cotidiano cidadão como alternativa fundamental para alcançar o desenvolvimento sustentável.

 

Público alvo:

Estudantes em idades a partir dos 15 anos e em todos os níveis de ensino.

 

Materiais e métodos:

Embora para a realização da experiência possa ser utilizado qualquer objeto como marcador, sugere-se o uso de sementes grandes para facilitar o manuseio (ex. milho, feijão, girassol, soja etc.) bem como para poder explicar a relação entre tamanho populacional e alimentos por entender que esta temática poderá ser explorada em diversas disciplinas. Além disso, papel caneta e cronômetro.

Para a realização da atividade, deverá haver uma divisão de grupos de alunos nunca inferior a 5 pessoas uma vez que cabe a cada grupo haverá dois responsáveis por cronometrar, outro responsável pela retirada e outro para a colocação de grãos na unidade de semente e um fiscal. Para cada equipe, deve-se dar um montante de sementes suficiente.

Etapa 1:

Cada grupo deverá desenhar no caderno um quadrante com 7 colunas e 5 linhas com espaço suficiente para o manuseio das sementes.

Definido o quadrante, coloque 20 sementes sendo uma em cada unidade
(graf. 1).

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X= um objeto marcador (ex: semente)

Etapa 2:

Sugere-se que para a realização efetiva de cada parte do experimento, o professor deixe a atividade acontecer por pelo menos 6 minutos.

Uma vez passado as regras para os alunos e distribuído os grãos, cada grupo tem liberdade para começar a atividade.

De acordo com o estudo, utiliza-se o cronômetro para definir a colocação ou retirada de grão, considerando que a primeira se trata do nascimento de um indivíduo da espécie e a retirada, a morte de membro que deixa de utilizar os recursos naturais.

Sugere-se cada grupo repita cada fase ao menos duas vezes e faça os três estudos sucessivamente.

O professor não deve dizer os resultados esperados e sim esperar que o resultado seja mostrado.

Para as três fases, deve-se  utilizar o seguinte critério onde o professor vai apenas dirigir o tempo de retirada e colocação de grãos.

-       Para Crescimento populacional: Utiliza-se um cronometrista que a cada 5 segundos indica a um aluno a necessidade de se colocar de um grão e um outro com a mesma função que informa o momento da retirada a cada 3 segundos.

-       Para Estabilidade: A mesma estratégia utilizada para cada 5 segundos, coloca-se e retira-se um grão, obedecendo ao mesmo padrão de registro.

-       Para Decréscimo: faz-se a retirada a cada 5 segundos de um grão e a cada 3 coloca-se outro. Obedecendo ao mesmo padrão de registro.

No final do tempo dado, conta-se o número de grãos totais

 

Etapa 3

Esgotado o tempo, solicite aos grupos que registrem os resultados no papel e se o trabalho for realizado em etapas, que se tente montar o experimento em uma planilha de Excel® caso o aluno tenha conhecimento e computador à disposição.

Com os resultados levantados, pode-se dar ao aluno oportunidade de pesquisar sobre a produção alimentar no mundo, relacionar com o crescimento populacional do Brasil de acordo com as últimas décadas e a produção de alimentos, identificar as condições que envolvem a produção e impacto sobre os ecossistemas.

Poderá haver por parte dos professores argumentos a serem para cada uma das circunstâncias descritas tais como:

- O que houve com o número de grãos? Explique sobre a visão do crescimento populacional e disponibilidade de alimentos.

- Com o maior/estável/menor processo de produção (ou crescimento populacional), quais as situações que podem aparecer?

- em que circunstâncias há riscos de aumento dos preços? E por quê?

- em que condições há maior tendência de pessoas famintas?

- qual o reflexo do crescimento e da violência urbana?

- O que envolve a produção do alimento até chegar à sua mesa? (transporte, energia, armazenamento, distribuição, venda)

- Como fica a pressão sobre o ambiente em cada uma das circunstâncias?

- Onde participo positiva ou negativamente desta relação?

Além das indagações aqui citadas, poder-se-á trabalhar com os alunos, dependendo do nível de ensino em que estejam frequentando, questões como inflação, lei malthusiana, condicionantes que limitam o crescimento de uma espécie (ecologia), relação entre abundância de recursos como responsáveis pela diminuição/extinção da biodiversidade, preço dos produtos, o grau de consumo, obesidade, fome, violência social, guerra por recursos, biotecnologia, transgenia, etc.

 

Resultado esperado:

 

Havendo a participação de outros professores, poderá ser feito na escola/faculdade, um grande evento que trate o tema.

 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

ALVIM, R. G. Ecologia multidisciplinar - visão ética e social da problemática ambiental. 2008 Acessado em 20/mai/2011. 

ANDRADE, L.; SOARES G.; PINTO, V. Oficinas Ecológicas: uma proposta de mudanças. Vozes, 1995. Petrópolis. 

BAUMGARTEN, Maíra. A prática científica na "era do conhecimento": metodologia e transdisciplinaridade. Sociologias,  Porto Alegre,  n. 22, dez.  2009 .   Disponível em . acessos em  06  jun.  2011.  doi: 10.1590/S1517-45222009000200002.

CANIATO, R. Com ciência na educação: ideário e prática de uma alternativa brasileira para o ensino de ciências. Papiros, São Paulo. 1992.

DELIZOICOY, D.; ANGOTTI, J. A. Metodologia do ensino de ciências. Cortez. São Paulo. 1995.

FAZENDA. I. C. A. Interdisciplinaridade: história, teoria e pesquisa. Papirus. 2ª ed. São Paulo. 1995.

KOFF, Elionora Delwing. A questão ambiental e o estudo de ciências. Algumas atividades. UFG, 1995.

KORMONDY, Eduard J. Brown Daniel E. Ecologia Humana. Atheneu Editora. São Paulo. 2002.

MELO, C. M. R. . As atividades lúdicas são fundamentais para subsidiar o processo de construção do conhecimento.  Información Filosófica. Volume II. Número 1, 2002.  Pág. 128-137.

MOREIRA, Jaqueline C. Castilho; SCHWARTZ, Gisele Maria. Conteúdos lúdicos, expressivos e artísticos na educação formal. Educ. rev.,  Curitiba,  n. 33,   2009.   Disponível em . acessos em  06  jun.  2011.  doi: 10.1590/S0104-40602009000100014.

NEBEL B. J.; WRIGHT, R. T. Ciencias ambientales. Ecología y desarrollo sostenible. 6ª ed. Prentice Hall, México, 1999.

SCHUSCHNY, A. “La metodología de los ‘Síndromes de Cambio Global’: un abordaje para estudiar la sostenibilidad del desarrollo”. Revista Brasileira de Ciências Ambientais, Número 17 - Setembro/2010. Acesso em jun. 2011.

TOWNSEND Colin R.; BEGON, MICHAEL.; HARPER, John L. Fundamentos em ecologia. 2ª edição. Artmed. Porto Alegre, 2006.

VILLAR, S. La nueva racionalidad: comprender La complejidad con métodos transdisciplinarios. Barcelona: Kairós S. A. 2007

 

Ilustrações: Silvana Santos