Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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10/09/2018 (Nº 38) A Educação Ambiental através das visitas técnicas no ensino superior: estudo de caso
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Revista Educação Ambiental em Ação 38

A Educação Ambiental através das visitas técnicas no ensino superior: estudo de caso

 

Através de um estudo empírico, no qual se analisou questionários respondidos por alunos de graduação, defende-se aqui a importância de se rever as práticas de visitas técnicas no ensino superior como forma de priorizar as vivências e não apenas os conteúdos conceituais.

Isabela Barbosa Frederico1; Zysman Neiman2; Júlio César Pereira3

 

isabf_tur@yahoo.com.br; zysman@ufscar.br; julio-pereira@ufscar.br

 

1Bacharel em Turismo, Laboratório de Ecoturismo, Percepção e Educação Ambiental, Universidade Federal de São Carlos, Câmpus Sorocaba;

2Doutor, Professor Adjunto do Laboratório de Ecoturismo, Percepção e Educação Ambiental, Universidade Federal de São Carlos, Câmpus Sorocaba;

3Doutor, Professor Adjunto da Universidade Federal de São Carlos, Câmpus Sorocaba;

 

 

 

RESUMO

 

As visitas técnicas no ensino superior podem configurar-se como estratégias alternativas para a inserção do estudante universitário nos problemas socioambientais nos quais estão inseridos, para que possam pensar ações cabíveis para a melhora dos problemas encontrados. A presente pesquisa analisou o direcionamento que as visitas técnicas do câmpus da UFSCar-Sorocaba, realizadas durante o período de setembro de 2008 a maio de 2009, estão tendo em relação à eventual adição de conhecimentos aos alunos, e da imersão dos mesmos nos ideais da sustentabilidade ambiental. A metodologia utilizada ao longo da pesquisa se utilizou tanto de uma abordagem qualitativa como de uma quantitativa, pois  foi utilizada a observação participante e a aplicação de questionários do tipo “Escala Visual Analógica”, com 3 conjuntos de questões: o primeiro pretendeu mensurar a auto-avaliação do conhecimento que o aluno possuía antes e depois da visita sobre alguns temas. O segundo desejava avaliar se houve alguma mudança de atitudes e se a visita contribuiu para a mesma. Já o terceiro abordou os valores ecológicos, no âmbito da sustentabilidade ambiental. Uma análise estatística comparou as respostas ao questionário antes e depois das visitas técnicas, para detectar se houve mudanças significativas entre esses dois momentos. Como sujeitos de pesquisa participaram alunos que realizaram visitas técnicas para o Parque Estadual da Ilha do Cardoso (SP), o Parque Estadual da Serra do Mar (Núcleo Picinguaba), e as cidades de Curitiba (PR), Morretes (PR) e Iguape (SP). Vê-se pelos resultados que os alunos, apesar de melhoria em conhecimentos (apenas para o caso de alguns cursos e sempre através da auto-avaliação), apresentaram pouca mudança em direção à sustentabilidade ambiental, o que revela que, apesar da grande possibilidade de transformações significativas que as visitas técnicas podem produzir, elas ainda não estão sendo plenamente exploradas. Defende-se aqui a importância de se rever as práticas de visitas técnicas como forma de priorizar as vivências e não apenas os conteúdos conceituais.

 

Palavras Chaves: Excursões, Educação Superior, Mudanças de Comportamento

 

 

1.  Introdução

 

1.1. Educação Ambiental

 

            Ao abordar o surgimento da Educação Ambiental (EA), Carvalho (2008) destaca que em um primeiro momento a educação ambiental emerge como uma prática de sensibilização dos indivíduos em relação aos problemas ambientais, porém em um segundo momento, ela se fortalece como uma proposta educativa, iniciando seu diálogo com o campo educacional, e é aqui que o “Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis” (fruto da Rio-92) ganha importância, pois auxilia diretamente na definição do marco político para o projeto pedagógico da EA.

 

“Este tratado procura trazer uma nova abordagem aos problemas entre a natureza e os seres-humanos, buscando uma ótica interdisciplinar para sua análise e consequente busca por resolução iniciando novas áreas de saberes além dos escolares, valorizando a diversidade de culturas e dos modos de compreensão e manejo do ambiente.” (CARVALHO, 2008:54).

 

            Nota-se, portanto, que a Educação Ambiental, em sua proposta de melhorar a relação ser humano versus natureza deve não apenas focar nas questões da educação formal dentro das escolas, mas deve também ter um olhar aberto e complexo sobre todo o planeta e suas relações. É nesse sentido que a interdisciplinaridade ganha força, pois através dela os indivíduos podem entender e começar a pensar a complexidade na qual estão inseridos, e desta forma agir de maneira responsável sobre nossa realidade.

Para Neiman (2007), a EA deve também resgatar valores, até então, esquecidos na educação clássica formal, como a amizade, a lealdade, a responsabilidade, o respeito à vida, a democracia e, desta, visar uma sociedade mais justa. O autor ainda afirma que quando analisamos a educação no âmbito da atual sociedade vemos ações pedagógicas atreladas à visão bidimensional da natureza, uma característica advinda de Descartes que propaga a divisão do espírito e do material, gerando uma separação humana do meio ambiente. Isso se reflete em muitas características vividas nos dias atuais, como, por exemplo, a fragmentação de disciplinas acadêmicas (CAPRA, 1995). Noal (2006) afirma que essa fragmentação induz a dificuldade de se obter a interdisciplinariedade no cotidiano das atividades acadêmicas e intelectuais.

Nesse sentido, Guedes (1981) ao abordar a educação rogeriana, também chamada de educação centrada no aluno, afirma que em nosso sistema educacional vigente existe uma preocupação primordial com o “ensino” e não com a aprendizagem, ou seja, os estudantes estão inseridos em um modelo educacional autoritário, onde o processo educacional é feito apenas “do pescoço para cima”, o que acaba gerando uma necessidade de estar sempre sendo guiado pelos outros (no caso o professor).            

A Educação Ambiental, através de sua proposta interdisciplinar pode promover através de atividades como saídas de campo/visitas técnicas uma ruptura para esse cenário de fragmentação, ou seja, ela se apresenta como uma proposta ousada de transportar os alunos para a realidade provocando-os através da passagem por saberes e áreas disciplinares em um novo ambiente de aprendizagem (CARVALHO, 2008).

 

1.2. Visitas  Técnicas

 

            As visitas técnicas são experiências práticas que possibilitam o estudo da realidade através do deslocamento de alunos para ambientes fora de seu cotidiano (a sala de aula). Constituem momentos que permite aos estudantes um reconhecimento do ambiente que lhe circunda e desta forma criar um senso crítico sobre ele. Para Fernandes (2007) as aulas de campo são momentos em que monitores ambientais iniciam uma interação com os alunos, quando então, através do diálogo e da participação dos mesmos, são fornecidas informações sobre o ambiente onde estão inseridos.

            Segundo Mendonça e Neiman (2003) as viagens educacionais ou as visitas técnicas tiveram como precursor o pedagogo francês Celestin Freinet, que considerava essas saídas a campo como fonte natural de aprendizagem da realidade. Para Freinet, aprendemos em nossa família e na sociedade, ou seja, através do erro, da tentativa e da experiência.

            Ao estudar práticas de estudo do meio de escolas públicas de um município do Estado de São Paulo, Boscolo (2007) afirma que essas atividades promovem uma parceria em prol do conhecimento entre professores e alunos. Segundo a autora, as experiências de estudo do meio são propulsoras do diálogo e das atividades coletivas resultando em aprofundamento de conteúdos, socialização e em formação intelectual.

            As visitas técnicas constituem um importante instrumento para desenvolver o senso crítico do ser humano a partir da construção do conhecimento através da realidade. O experimentar, o viver, o aprender, o sentir são palavras que exprimem o que essa prática traz de positivo consigo, e nessa linha a Educação Ambiental também trabalha, pois em sua essência busca a mudança de atitudes e a geração de um comportamento mais responsável e cidadão através da vivência e da quebra de paradigmas, já que não busca desenvolver o conhecimento em partes, mas sim de forma complexa e interdisciplinar.

            Nesse sentido, as visitas técnicas no ensino superior podem configurar-se como estratégias alternativas para a inserção do estudante universitário nos problemas socioambientais nos quais estão inseridos, e a partir de então pensar ações cabíveis para a melhora dos problemas encontrados. Nossa realidade está composta por uma soma de fatores, e por isso sua interpretação não pode ser realizada apenas através do olhar de uma disciplina, mas sim sob uma ótica interdisciplinar, possibilitando entender o nosso meio através de uma abordagem complexa e realista.

            Essas experiências in loco podem, portanto, constituir uma quebra ao paradigma educacional vigente, ou seja, figuram como oportunidades de motivar os estudantes para momentos mais reflexivos e não apenas de aceitação do conteúdo transmitido pelos professores. O modelo atual preocupa-se apenas com a instrução do intelecto e são raras as vezes que os alunos são convidados a “fazer observações, formular críticas, ou ainda realizar qualquer tipo de operação intelectual que favoreça o desenvolvimento de sua capacidade reflexiva” (GUEDES, 1981:32).

            Santos e Sato (2006:33) levantam a importância de se inserir a Educação Ambiental no contexto do ensino superior:

 

“A introdução da Educação Ambiental nos níveis superiores nos obriga a repensar nosso próprio papel dentro da sociedade. É preciso compreender a academia dentro de um grande laboratório de convivência, que possa gerar condições concretas ao contexto regional, sem perder a dimensão mais complexa do conhecimento”  (SANTOS; SATO, 2006:33)    

 

            As práticas de visitas técnicas, em conjunto com os preceitos da Educação Ambiental podem juntos visar indivíduos mais responsáveis perante a realidade estabelecida, compreendendo o seu papel e sua participação para um mundo mais sustentável. Se visitas técnicas no ensino superior estiverem atreladas à Educação Ambiental, possibilitam uma imersão mais reflexiva, assim como socialmente e ambientalmente mais correta dos estudantes. Nesse sentido, a questão ambiental e social fará parte do cotidiano participativo e das ações protagonizadas pelos mesmos.

            A presente pesquisa pretende avaliar o quanto as visitas técnicas podem colaborar na auto-avaliação sobre a aquisição do conhecimento durante a graduação e como os ideais da sustentabilidade são trabalhados e podem ser transmitidos durante as mesmas, tendo como objeto de estudo a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), câmpus de Sorocaba, que se configura como um centro de educação universitária que privilegia a sustentabilidade como fio norteador para os seus cursos.           

 

2. Desenvolvimento

 

2.1. Metodologia

A metodologia utilizada ao longo da pesquisa se utilizou tanto de uma abordagem qualitativa como de uma quantitativa. No âmbito da qualitativa foi utilizada a chamada observação participante, já a quantitativa fez uso da aplicação de questionários usando as Escala Visual Analógica (NORRIS, 1971).

            Como sujeitos de pesquisa foram utilizados alunos da Universidade Federal de São Carlos, câmpus Sorocaba, que realizaram visitas técnicas entre o segundo semestre do ano de 2008 e o primeiro semestre de 2009. Foram analisadas visitas técnicas de discentes dos cursos de Bacharelado em Ciências Biológicas e Licenciatura Plena em Ciências Biológicas que cursavam o quarto semestre do curso, uma turma de Engenharia Florestal (também do quarto semestre) e  alunos do sétimo semestre do curso de Bacharelado em Turismo.  Os nomes dos participantes foram mantidos em sigilo, por questões éticas da pesquisas, e os dados foram obtidos e analisados com o consentimento das turmas.

            A visita dos alunos de Biologia Bacharelado/Licenciatura e Engenharia Florestal possui caráter interdisciplinar, visto que a saída a campo se destina a atender diversas disciplinas que os alunos vêm estudando no campo teórico no semestre citado. A visita do curso de Turismo se configura como uma disciplina regular obrigatória intitulada “Realidade Turística Brasileira II”, na qual são observados na prática diversos setores que englobam o turismo através da observação da realidade de uma determinada região do país. No caso da turma de Biologia a visita foi realizada em área natural, o Parque Estadual da Ilha do Cardoso (SP), com duração de três dias; a da turma de Engenharia Florestal também ocorreu também em uma Unidade de Conservação, o Parque Estadual da Serra do Mar (Núcleo Picinguaba), com duração de três dias; no caso da turma de Turismo, a visita se deu nas cidades de Curitiba (PR), Morretes (PR) e Iguape (SP). A observação participante foi realizada apenas durante a visita técnica do curso de Bacharelado em Turismo.

             Antes das visitas técnicas, foram feitas reuniões com os professores responsáveis pelas mesmas, para obtenção de informações sobre os objetivos no âmbito do conhecimento que os mesmo desejavam atingir. Dessa forma deu-se início também a construção dos questionários para uma análise quantitativa com todos os cursos objetos da pesquisa.

            Os questionários foram embasados no utilizado por Norris (2007), a partir do método chamado “Escala Visual Analógica” (convertida posteriormente em escala numérica para fins de registro). O mesmo possuía 3 conjuntos de questões: o primeiro pretendeu mensurar a auto-avaliação sobre a aquisição do conhecimento, comparando-se o seu grau antes (pré-teste) e depois (pós-teste) da visita. Os temas foram selecionados nas entrevistas com os professores responsáveis pelas vistas técnicas. O segundo desejava saber quais as atitudes que os discentes se dispõem a adotar antes (pré-teste) e após (pós-teste) a visita, e consequentemente, avaliar se houve alguma mudança interna entre esses dois períodos e se a visita contribuiu para a mesma. Já o terceiro abordou os valores ecológicos declarados, no âmbito da sustentabilidade ambiental, visto que esta constitui um dos pilares da ênfase de todos os cursos da Universidade em questão. Este instrumento foi utilizado, portanto, para mensurar as auto-avaliação sobre aquisição de conhecimento, atitudes e comportamentos dos discentes antes (pré-teste) e depois (pós-teste) das visitas técnicas, e dessa forma comprovar se a condução dos mesmos está atendendo de fato aos princípios supracitados das atividades de estudo do meio e de Educação Ambiental (como forma de inserir os alunos nos ideais da sustentabilidade).

            Ao utilizar esse instrumento nos questionários foram colocadas abaixo de todas as perguntas réguas de 100 mm (sem escala numérica visível). No preenchimento os alunos foram instruídos a considerar os extremos da régua conforme as respostas que estavam escritas (ex. pouco igual a 0mm e muito igual a 100mm). Após o preenchimento dos alunos, mediram-se os resultados para cada pergunta, desde o ponto inicial até onde os estudantes marcaram suas respostas nos pré e pós-testes.

Sobre os dados coletados (Biologia n = 38 respondentes; Turismo n = 28 respondentes; Florestal n = 25 respondentes) foram aplicados dois tratamentos estatísticos. Primeiramente se aplicou o teste de Shapiro Wilk para se observar a normalidade dos dados. Após a comprovação de que os mesmos apresentavam essa característica, se aplicou o “Teste das Ordens Assinaladas de Wilcoxon”. Esse teste é aplicado a dados emparelhados, como por exemplo, para comparar duas amostras que são realizadas nos mesmos indivíduos, amostras do tipo "antes e depois", funciona como um substituto do teste-T do campo paramétrico (SIEGEL, 1975). O teste permite avaliar as Hipóteses: H0: média_A = media_D vs. H1: média_A difere de média_D , em que A= antes e D = depois. Neste contexto as hipóteses podem ser assim formuladas: H0: a auto-avaliação feita pelos alunos antes da viagem e depois da viagem não diferem; vs. H1: a auto-avaliação dos alunos depois da viagem foi diferente da auto-avaliação feita antes. Para o tratamento dos dados, foi utilizado um software estatístico chamado “R” (R Development Core Team, versão 2007).

Após as evidências quantitativas obtidas através do questionário aplicado com as turmas, verificou-se (como se verá nos resultados) que os alunos não relataram grandes transformações principalmente no que se refere ao conjunto de temas do bloco referente aos conhecimentos. Nesse sentido, procuraram-se novas alternativas para uma maior compreensão do fato ocorrido. Juntamente com a observação participante, optou-se também por coletar dados qualitativos através da análise dos relatórios da viagem dos alunos do curso de Bacharelado em Turismo, que pudessem embasar a discussão sobre os resultados coletados ao longo da aplicação do instrumento quantitativo.

            Ao todo, foram analisados 14 relatórios, o que equivale 50 % dos elaborados pelos discentes de Turismo que participaram da visita.

            Ao longo da análise dos relatórios, procurou-se inicialmente, uma caracterização dos mesmos, a fim de observar o formato dos trabalhos elaborados pelos alunos e desta forma levantar possíveis provocações de como os discentes apresentaram seus instrumentos de avaliação da visita técnica, tendo em vista que este atua também como um fio norteador dos discentes ao longo da experiência prática.

            Em conjunto a essa observação, buscou-se também possíveis comentários que justificariam a inexistência de índices relevantes no quesito de conhecimentos. Foram levantados relatos dos alunos que por ventura indicassem motivos para o fato em questão. Julga-se pertinente a análise desses instrumentos, pois o foco da visita técnica residia nos alunos. Portanto, a preocupação com as opiniões dos estudantes acerca dessa experiência pode refletir como o processo de aprendizagem foi conduzido, assim como as sensações e o grau de desenvolvimento alcançados com tal prática.

            Ao se levantar os possíveis relatos da viagem confeccionou-se um texto síntese (apresentado em resultados e discussões) a partir das críticas e das observações realizadas pelos alunos.

           

2.2.  Resultados e Discussão

 

 2.2.1. Respostas ao questionário: após o tratamento dos dados, foram confeccionadas três tabelas com os resultados dos questionários. Os números que estão em negrito simbolizam uma mudança significativa (com nível de significância de 5 %) entre o antes e o depois das visitas técnicas.

 

Tabelas 1a, 1b e 1c: diferenças relatadas para a declaração de auto-conhecimento dos  temas entre os Pré e Pós-Testes (Teste de Wilcoxon).

Turismo

 

CONHECIMENTOS

 

POS X PRE (p)

Políticas Públicas para o turismo

 

3e-04

Patrimônio Imaterial

 

0.0041

Patrimônio Material

 

0.0817

Meios de transporte para o turismo

 

0.4119

Gestão de Meios de Hospedagem

 

0.2754

Gestão de Alimentos e Bebidas

 

0.9594

Gestão do Lazer

 

0.466

 

Biologia

 

Meio Ambiente

 

0.0972

Ecossistemas Costeiros e Mata Atlântica

 

1e-04

Unidades de Conservação

 

0.0053

Solos

 

0.0118"

Relações entre fatores bióticos e abióticos

 

0.0011

Uso dos Recursos Naturais para atividades econômicas

 

0.0129

Recuperação Ambiental

 

0.0112

Conflitos Sociais pelo uso da terra

 

0,0000

fauna e flora brasileiras

 

0.0035

 

Engenharia Florestal

 

Meio Ambiente

 

0.5626

Ecossistemas Costeiros e Mata Atlântica

 

0.0296

Unidades de Conservação

 

8e-04

Solos

 

0.0324

Relações entre fatores bióticos e abióticos

 

0.2294

Uso dos Recursos Naturais para Atividades Econômicas

 

0.3216

Recuperação Ambiental

 

0.1078

Conflitos Sociais pelo uso da terra

 

0.0339

Fauna e flora brasileiras

 

0.0067

 

Tabela 2: Diferenças estatísticas relatadas para atitudes nos Pré e Pós-Testes

(Teste de Wilcoxon).

 

ATITUDES

 

 

 POS X PRE

 

 

Turismo (p)

Biologia  (p)

Florestal (p)

Participar do movimento ambientalista

 

0.7603

0.0701

0.0458

Mudar seus hábitos de consumo

 

0.7798

0.4925

0.8372

Visitar áreas naturais

 

0.487

0.6961

0.9553

Usar menos o carro

 

0.7639

0.9003

0.338

Divulgar a preservação ambiental

 

0.4707

0.0091

0.6032

Fazer cursos na área ambiental

 

0.0852

0.2135

0.8893

Pesquisar e escrever artigos sobre Meio Ambiente

 

0.048

0.8086

0.0389

Rever seus hábitos cotidianos de modo a economizar recursos

 

0.178

0.5008

0.6636

Ler a respeito ou assistir documentários sobre meio ambiente

 

0.8823

0.2372

0.2987

Ser mais integrado às outras pessoas

 

0.9808

0.0323

0.2104

Espiritualizar-se

 

0.6183

0.0801

0.3539

Cuidar de plantas e animais

 

0.3455

0.2187

0.8959

Reciclar o lixo

 

1,0000

0.0123

0.347

Filiar-se à uma ONG

 

0.443

0.5183

0.8455

Doar recursos ou trabalhar voluntariamente para a Conservação Ambiental

 

0.8988

0.4927

0.8582

 

Tabela 3:   Diferenças estatísticas relatadas para valores nos Pré e Pós-Testes

(Teste de Wilcoxon).

 

VALORES

 

 

POS X PRE

 

 

Turismo (p)

Biologia  (p)

Florestal (p)

O que você acha da relação dos animais da mata com o homem?

 

0.5676

0.0026

0.0111

O que você sente quando ouve falar sobre a extinção de plantas e animais?

 

0.409

0.8947

0.856

Ao entrar em uma mata você fica com medo ou muito animado?

 

0.6218

0.1057

0.6538

O que você sente sobre a caça e a venda de  animais silvestres?

 

0.0836

0.4441

0.348

O que você sente quando vê áreas de mata queimando?

 

0.8294

0.1535

0.1016

Garantir a preservação de uma espécie é garantir a preservação da mata?

 

0.1782

0.7968

0.0758

O modo de vida das populações tradicionais deve ser mantido?

 

0.8664

0.1306

0.741

Visitar áreas naturais incômodo ou agradável?

 

0.6200

0.886

0.0995

A preservação da Mata Atlântica é urgente?

 

0.6044

0.308

0.7944

Quando estou em contato direto com a Natureza eu me sinto isolado ou integrado?

 

0.6652

0.7945

0.2428

A natureza ensina ao ser humano como ele deve viver?

 

0.8092

0.8504

0.5751

Os ambientalistas deveriam pensar mais no desenvolvimento da sociedade?

 

 0.4459

0.6652

0.715

           

Através dos dados obtidos, observa-se que a turma de Bacharelado em Turismo não relatou mudanças significativas entre os pré e pós-testes. Apenas três resultados mostraram diferenças significativas (conhecimentos sobre “Políticas Públicas para o turismo”, com p = 3e-04 e sobre “Patrimônio Imaterial”, com p = 0.0041, e atitude de “Pesquisar e escrever artigos sobre Meio Ambiente”, com p = 0,048).

            No caso dos alunos de Bacharelado em Ciências Biológicas e Licenciatura em Ciências Biológicas, os dados referente ao aumento declarado de conhecimentos (auto-avaliação), mostram um ganho significativo em quase todas as temáticas. O único item que não apresentou transformações foi de “Meio Ambiente” (p = 0.0972). Porém este se configura como o termo mais abrangente desse conjunto de questões, apontando para uma possível dificuldade de se trabalhar uma visão interdisciplinar que as visitas técnicas estão tendo neste caso específico. Quando os conceitos são apresentados de forma isolada ou fragmentada, os alunos apresentaram uma mudança de conhecimento após a atividade. Porém para o conceito unificador interdisciplinar, que necessita de uma visão mais abrangente e complexa, os alunos não apresentam uma grande transformação. Isso pode ser um indício que sugere um aspecto a ser potencializado nas próximas saídas a campo. Sugere-se aos coordenadores que, tendo em vista que a realidade está modulada sobre vários pilares, em forma sistêmica, seu entendimento precisa ser realizado dessa forma.

Os conhecimentos declarados dos alunos de Engenharia Florestal não tiveram mudanças tão significativas quanto os discentes de Biologia, porém a maioria dos resultados foi positiva (“Ecossistemas Costeiros e Mata Atlântica”, com p = 0,0296; "Unidades de Conservação”, com p = 8e-04; “Solos”, com p =  0.0324; “Conflitos Sociais pelo uso da terra”, com p = 0.0339; e “Fauna e flora brasileiras”, com p = 0.0067). O tema “Meio Ambiente novamente também não mostrou transformações (p = 0.5626), o que pode ser devido às mesmas características da viagem da turma de Biologia supracitada.

            Em relação ao segundo conjunto de perguntas referentes às atitudes ambientais dos discentes não foram observadas grandes mudanças. Nos três cursos foi possível levantar apenas alguns pequenos sinais de aumento de interesse declarado sobre a temática ambiental. No caso do Turismo esse número foi o menor (apenas uma mudança significativa), já a Biologia apresentou três alterações e a Engenharia Florestal duas (vide Tabela 2).

            O terceiro conjunto de perguntas sobre valores ecológicos dos discentes também não apresentou melhoria significativa para a grande maioria das temáticas (vide Tabela 3). No caso da turma de Turismo nenhum item sofreu alterações. Já nas turmas de Biologia e de Engenharia Florestal foi observada apenas uma modificação, coincidentemente no mesmo item: “O que você acha da relação dos animais da mata com o homem?”. Neste caso, a “melhoria” dessa relação pode ter aumentado pelo fato de ambas as visitas técnicas terem ocorrido em Unidades de Conservação, locais onde o contato com a fauna está facilitado. No caso do Turismo, os alunos visitaram ambientes urbanos e não áreas naturais.

            Esses dois últimos conjuntos de resultados referentes a mudanças de atitudes e valores ambientais nos mostram que o ideal da sustentabilidade não está sendo inserido nas “aulas de campo”, apesar do potencial de transformação que essas experiências possuem. Os resultados reforçam as teorias de Neiman (2007), que demonstrou a grande eficiência do contato dirigido com a natureza para a transformação de atitudes pró-ambientais, desde que o roteiro e o trabalho educativo sejam elaborados de forma transdisciplinar, valorizando a sensibilização a partir do contato com a realidade, o que parece não ter ocorrido aqui. Para o autor, a utilização do contato com a natureza como ferramenta educativa pode promover uma maior aproximação dos alunos com as causas ambientais, assim como um maior conhecimento sobre a realidade na qual estão inseridos.

No caso das visitas dos cursos de Ciências Biológicas e de Engenharia Florestal havia a possibilidade de uso do ambiente natural para a promoção de mudanças em direção ao aprimoramento da compreensão dos aspectos da sustentabilidade. No caso do Turismo, apesar da visita ter sido realizada em ambiente urbano, a temática ambiental deveria também estar inserida como uma característica intrínseca a todos os objetos trabalhados, como por exemplo, a “responsabilidade socioambiental dos meios de hospedagem”, ou a “gestão ambiental” dos mesmos.

            Apesar das visitas técnicas terem apresentado algumas mudanças relativas, o que demonstra o seu potencial para inserir os alunos na realidade e transformar seu conhecimento sobre as mesmas, essas atividades ainda precisam ser mais bem planejadas e executadas, visando uma maior aproximação do aluno com os objetos estudados e com a sua complexidade inerente. Só desta forma seu potencial poderá ser plenamente explorado.

           

2.2.2. Análises dos relatórios do curso de Bacharelado em Turismo: como instrumento de avaliação da disciplina de Realidade Turística Brasileira II os discentes do curso de Bacharelado em Turismo tiveram de elaborar um relatório da viagem através de fios norteadores referentes às disciplinas que a viagem pretendia integrar (temáticas que figuram o rol de “conhecimentos” dos questionários de “Análise Visual Analógica”).

            Durante o período que antecedeu a visita, os alunos tiveram alguns momentos com os professores para definição de roteiro e também uma reunião com quase todos docentes responsáveis pela disciplina, na qual foram repassados os indicadores de cada disciplina que deveriam ser observados ao longo da atividade e que deveriam figurar na análise dos alunos ao longo do relatório da viagem. No entanto, essas orientações foram repassadas poucos dias antes da visita, algumas inclusive, horas antes da mesma.

            As discussões sobre as áreas do conhecimento a serem estudadas in loco foram realizadas ao longo do semestre em que a disciplina foi ministrada, porém as orientações poderiam ter sido salientadas antes da visita com uma maior antecedência, objetivando relembrar os conteúdos estudados em sala, assim como presumir uma relação destes com os objetivos da disciplina a fim de motivar os alunos para suas observações ao longo da experiência prática.

            A execução da viagem apresentou, segundo relatos de alguns alunos, diversos problemas, tais como a “rapidez” com que certos destinos foram contemplados; a impossibilidade de se fazer reflexões profundas em detrimento da quantidade de locais visitados e da velocidade com que os conteúdos deveriam ser assimilados; o fato de alguns locais importantes para alguns conteúdos não terem sido visitados; entre outros. Nesse sentido, alguns discentes apontam o modelo “relatório” de avaliação como sendo um objeto muito fechado e muito denso de orientações, o que refletia na falta de espaço dos alunos para realizarem críticas e reflexões mais pessoais.

 

“Não tivemos tempo suficiente para realizarmos interpretações do patrimônio, e também não foi possível, devido às muitas exigências para com esse material (tópicos que deveriam constar no relatório, enviados por todos os docentes), para que exercemos nossas considerações, nossa visão, nosso olhar sobre toda a atividade turística. Quando temos que agregar tão distintos valores, e quando o relatório é tão direcionado, a parte crítica e individual que cada aluno deveria demonstrar é prejudicada”  (Discente de Bacharelado em Turismo).

 

            Nota-se, portanto, que o planejamento das atividades a serem realizadas no âmbito educativo in loco necessitam ser previamente estipuladas e pensadas. Segundo os alunos o fator planejamento deve ser prioridade para que todos os objetivos propostos pela atividade sejam possibilitados na maior parte da experiência. Quando previamente planejada, a atividade pode maximizar o cumprimento de suas metas, e, para tanto, no caso do turismo de cunho educativo, o estabelecimento de metas e de tarefas a serem cumpridas ao longo da visita devem estar estipulados tendo em vista que o objetivo primordial é o de se aprender na prática, através do contato com a realidade os conteúdos conceituais e reflexivos discutidos ao longo do ambiente formal da sala de aula.

 

“Em suma, sem dúvida, para a realização e cumprimento dos objetivos propostos pela disciplina, é imprescindível o planejamento prévio da atividade, a tomada de decisão e ação antecipada, a pesquisa prévia dos atrativos, quanto à disponibilidade, horário de funcionamento etc., salvo que essas disciplinas são, de maneira inestimável, fundamentais para a formação do profissional Bacharel em Turismo”  (Discente de Bacharelado em Turismo).

           

            Outro fator bastante ressaltado pelos discentes ao longo dos relatórios foi a questão do tempo das atividades. Segundo os relatos o tempo despendido para a visitação das três localidades (Curitiba, Morretes e Iguape) não possibilitou um contato aprofundado com as mesmas e também gerou uma visitação “massante”, pois eram muitas aspectos para se observar e refletir. Neste caso, alguns estudantes sugeriram que a visita fosse realizada apenas em uma localidade, com vistas a uma maior interpretação com o ambiente visitado.

 

“À guisa de conclusão, portanto, a atividade de turismo científico da disciplina apresentou como principal ponto fraco o pequeno espaço de tempo para realizar todas as observações demandadas seus nos objetivos, algumas das quais não puderam ser plenamente apreendidas na atividade devido à complexidade de análise requerida (...)”  (Discente de Bacharelado em Turismo).

 

            E ainda, corroborando a possibilidade de um maior aprofundamento em um destino por visita (preferencialmente a cidade de Curitiba em função de sua magnitude):

“Porém creio que para uma viagem de três dias sendo que uma das localidades contempladas é Curitiba, era necessário que este município fosse mais aproveitado” (Discente de Bacharelado em Turismo).

 

            Ressalta-se aqui, que mais da metade dos relatórios analisados inseriram em suas críticas a falta de tempo para assimilação dos objetos estudados in loco. Cabe julgar, portanto, que há boas evidências de que umas das grandes razões para a falta de mudança significativa entre o antes e o depois da viagem, no rol de conhecimentos, se deve, entre outros motivos e segundo os discentes, à problemática do tempo enfrentada ao longo da experiência prática.

            A ausência de tempo suficiente auxiliou na ausência de um contato mais direto dos alunos com o ambiente estudado e a realidade intrínseca ao mesmo. Para a qualidade de uma visita de cunho pedagógico se faz importante a criação de um laço entre os alunos com a comunidade do local, sua dinâmica, os aspecto físicos existentes, a fim de que o estudante se insira na realidade e possa desenvolver um senso crítico e opiniões consistentes através de relações feitas entre os conteúdos teóricos e o observado em campo. A importância deste contato mais intenso foi outro ponto bastante comentado ao longo dos relatórios.

 

“Com relação à cidade de Curitiba não houve um contato direto com moradores fora dos equipamentos de serviço que utilizamos, portanto, uma análise mais profunda do relacionamento da comunidade e visitante não é possível” (Discente de Bacharelado em Turismo).

 

            Através da análise quantitativa foi possível identificar que através da metodologia utilizada, ocorreram mudanças no rol de conhecimentos dos alunos de Bacharelado em Turismo apenas em duas temáticas: patrimônio imaterial e políticas públicas. Durante a análise dos relatórios foi possível identificar depoimentos nos quais os estudantes ressaltavam o contato mais direto que tiveram com os órgãos de políticas públicas das cidades de Morretes e Iguape, assim como a apreciação dos bens imateriais de maneira mais intensa e mais criativa.

 

“A visitação ao centro histórico na manhã de domingo foi muito interessante, pois coincidiu com a feira do Largo da Ordem, que é um atrativo turístico da cidade. Nesse momento foi possível entrar nos locais, e conhecê-los mais detalhadamente” (Discente de Bacharelado em Turismo).

 

“No restaurante onde almoçamos além da degustação do Barreado, os garçons e garçonetes nos mostraram como preparar e fizeram demonstrações com os pratos montados. Provar a comida típica de uma localidade é parte do processo da hospitalidade, pois, é uma das maneiras de participar do cotidiano da localidade. Houve um momento da visita livre para apreciação, e isto foi importante para a visita, pois, houve um contato maior com a cidade com a possibilidade da exploração; os detalhes são melhores assimilados depois de um momento para reflexão e vivência” (Discente de Bacharelado em Turismo).

 

            Em ambos os depoimentos acima é possível observar como os estudantes tiveram um contato mais próximo com o tema do patrimônio imaterial (representado aqui pela Feira do Largo da Ordem e pelo prato típico da cidade de Morretes, o Barreado). No primeiro discurso, os estudantes ressaltam como foi interessante o “pode entrar” na feira e observa intensamente sua dinâmica. Durante essa atividade os alunos tiveram a liberdade de andar pela mesma e contemplar aquilo que lhe era mais interessante. Os professores estipularam um tempo para que todos se encontrassem novamente e, nesse período, deixaram que os alunos circulassem e tivessem suas próprias percepções.

            Já no segundo discurso se faz muito presente a palavra liberdade e reflexão. Ambas foram possibilitadas com a apresentação do Barreado na cidade de Morretes. Esta apresentação se deu de forma criativa e o contato dos alunos com a comunidade da cidade também foi bem próxima o que possibilitou uma maior assimilação e reflexão de um bem intangível como esse prato típico.

            Já no caso das políticas públicas (contato direto com os órgãos de Morretes e Iguape):

“A experiência em Morretes também foi de grande valia, pois foi possível o contato com os gestores de turismo do município assim como no caso de Iguape também. Esse momento da viagem foi interessante, pois foi possível observar os problemas da gestão de pequenas localidades turísticas e como a atividade ainda é amadora em muitos aspectos como a ausência de métodos de controle de capacidade de carga (com vistas a garantir a preservação dos bens existentes e a qualidade de vida dos munícipes) assim como a orientação despreparada para algumas ações (como no caso de Morretes cuja prioridade dos gestores não foca os principais atrativos da cidade como as áreas protegidas e as edificações históricas)” (Discente de Bacharelado em Turismo).

 

É possível identificar, portanto, que o contato mais próximo com esses órgãos gerou uma situação na qual os discentes foram instigados a perguntar e a refletir sobre a realidade que estavam estudando e dessa forma procurar respostas para as idéias e conclusões que surgiram na hora. Nesse momento, as docentes deixaram os alunos livres para perguntar tudo aquilo que desejavam saber. Observa-se que foi uma experiência bastante enriquecedora, tendo em vista, que após este fato os estudantes fizeram críticas a partir do estudado, do observado e do questionado.

            Outro ponto conflitante apontado pelos alunos foi o de que o relatório, como forma de avaliação, limita o processo de “observar e refletir” e acaba se caracterizando pelo simples “olhar e anotar”

 

“ (...) outro ponto a ser colocado é que muitas vezes ficamos mais preocupados em anotar tudo a que temos acesso em vez de olhar ao que nos cerca, a dinâmica da cidade e o cotidiano das populações o que pode deixar alguns aspectos deste trabalho e de análise como um todo superficial” (Discente de Bacharelado em Turismo).

 

            Apesar desses relatos de pontos negativos, para os estudantes as visitas técnicas são consideradas relevantes, pois possibilitam o contato com a dinamicidade do contexto da realidade:

           

                                      No entanto, é necessário ressaltar a relevância de atividades dessa natureza (...) enquanto instrumentos que permitem aperfeiçoar as competências e habilidades de análise crítica de fenômenos observados no âmbito do turismo, através da retomada e aplicação dos diversos conhecimentos com os quais o discente e futuro Bacharel em Turismo entra em contato ao longo de sua formação” (Discente de Bacharelado em Turismo)

 

E ainda:

 

“No caso do turismo essas experiências se tornam interessantes, pois ao se estudar uma ciência social aplicada como essa, são observados fenômenos característicos pela intangibilidade, pela imprevisão, e pela subjetividade que as salas de aula não conseguem demonstrar com tanta veracidade como os estudos do meio possibilitam” (Discente de Bacharelado em Turismo)

 

            Desta forma, as visitas técnicas têm o seu potencial reconhecido, à medida que possibilitam o aprendizado em uma ambiente real através de suas dinamicidades e peculiaridades. O aluno passa então a reconhecer e interpretar este ambiente através dos conhecimentos adquiridos em sala e também de suas reflexões pessoais promovendo assim a construção e o desenvolvimento do conhecimento enraizado no contexto em que estão inseridos. Porém, como fora levantado, essas atividades ainda necessitam serem reordenadas de maneira a priorizar aspectos como planejamento, duração, organização, métodos de avaliação, de maneira que se busque atingir o seu potencial e se consagre como uma atividade educacional que possibilite a emersão de indivíduos mais críticos e responsáveis perante o ambiente no qual vivem e se estabelecem.

 

3.  Conclusão

 

            Para os alunos de Ciências Biológicas e de Engenharia Florestal, a inserção da Educação Ambiental nas visitas técnicas foi realizada em ambiente natural (Unidades de Conservação) o que, conforme o senso comum, costuma proporcionar uma imersão nos ideais da conservação dos recursos. No caso dos estudantes do curso de Bacharelado em Turismo, cuja visita foi realizada em ambiente urbano, pressupõe-se uma maior dificuldade (mas não a impossibilidade) em inserir o debate sobre a sustentabilidade.

            O conceito de meio ambiente deve estar inserido nas discussões das disciplinas e não ser visto como apenas um tema “separado”; ao contrário, deve ser transversal aos conhecimentos das diversas áreas. Nesse sentido, se entende que a Educação Ambiental pode ocorrer não necessariamente através da imersão em um ambiente natural. A visita técnica realizada pelos alunos de Turismo poderia, portanto, ter promovido uma mudança maior nas atitudes e nos valores referentes a sustentabilidade.

            Vê-se pelos resultados que os alunos dos três cursos relataram poucas mudanças em direção à sustentabilidade ambiental, o que revela que, apesar da grande possibilidade de transformações significativas que as visitas técnicas podem produzir, elas ainda não foram plenamente exploradas. Um fato bastante interessante foi a mudança para melhor na percepção de ”relação entre seres humanos e animais”, entre o pré e pós-teste dos alunos de Ciências Biológicas e Engenharia Florestal, o que gera indícios de que, após conhecerem o local, eles criaram um sentimento maior de vínculo e, consequentemente, de preocupação com as áreas naturais e sua fauna.

A inserção da Educação Ambiental nas práticas das visitas técnicas além de promover uma sensibilização nos estudantes, pode também gerar uma consciência mais participativa do ser humano em relação ao ambiente que lhe circunda. Nesse sentido, diferentemente da educação dentro da sala de aula, onde os alunos geralmente “escutam” e “acatam” o conhecimento, esta modalidade permite uma postura mais ativa do estudante fazendo com que o mesmo se insira na “causa” e não na “consequência”.

Nessa mesma linha se insere o objetivo primordial das visitas técnicas, ou saídas a campo, pois estas atividades buscam uma aproximação do estudante com o ambiente e permite, portanto, uma observação mais crítica e realista dos conceitos aprendidos em sala de aula. Através das visitas técnicas os alunos podem não apenas observar o “escrito nos livros” como também participar desses acontecimentos e dessa forma gerar o compromisso interno com essas realidades.

Como apontaram os resultados referentes ao primeiro conjunto de perguntas ligadas ao conhecimento, os alunos principalmente os de Ciências Biológicas (Licenciatura e Bacharelado) relataram indícios de mudanças significativas em relação ao pré e pós-testes das visitas. Isso demonstra o potencial dessas experiências como instrumento de aquisição e complementação dos conteúdos conceituais. Porém notou-se que esse potencial ainda não foi plenamente aproveitado nas turmas de Engenharia Florestal e Turismo. Os índices obtidos por essas turmas provavelmente são fruto da dificuldade de priorizar as vivências durante essas atividades (o foco principal foi no âmbito conceitual); ausência de interdisciplinaridade como forma de entender a complexa realidade na qual estão inseridos os alunos; e a falta de utilização de modos comunicativos variados para a transmissão de conceitos.            É fundamental ressaltar a importância de se pensar na sensibilização como forma mais adequada de prática educativa, pois a mesma visa atingir não apenas a parte conceitual, mas também as dimensões emotivas e espirituais dos alunos, ao invés de focar apenas na conscientização (transmissão de conhecimento), já que esta, em muitos casos, se mostra ineficaz na construção do saber.

As visitas técnicas são de fato experiências interessantes para inserção dos alunos em diferentes ambientes e realidades e com isso promover a geração de um espírito crítico e mais responsável destes perante o mundo no qual estão vivendo. Elas geram um conhecimento embasado na realidade e dessa forma possibilitam uma maior inclusão dos discentes com os problemas enfrentados pela sociedade e assim se inicia um engajamento político e social dos mesmos.

            É preciso, portanto, rever as práticas de visitas técnicas como forma de priorizar as vivências e não apenas os conteúdos conceituais, tendo em vista que através da sensibilização interna dos alunos podemos gerar indivíduos mais críticos e interessados em gerir e atuar com responsabilidade em seus ambientes.

 

 

 

4. Referências Bibliográficas

 

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NOAL, F.O. “Ciência e interdisciplinariedade interfaces com a Educação Ambiental”. In: SANTOS, J.E.; SATO, M. A contribuição da educação ambiental à esperança de Pandora. São Paulo: Rima, 2006, pp.369 – 388.

 

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SANTOS, J.E.; SATO, M. “Universidade e Ambientalismo – Encontros não são despedidas”. In: SANTOS, J.E.; SATO, M. A contribuição da educação ambiental à esperança de Pandora. São Paulo: Rima, 2006, pp. 31 – 50.

 

SIEGEL, S. Estatística não-paramétrica para as ciências do comportamento. São Paulo: McGraw-Hill, 1975.

 

Agradecimentos

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pela bolsa de Iniciação Científica concedida (à I.B.F.).

 

Ilustrações: Silvana Santos