Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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Breves Comunicações
O USO DE BIOSSÓLIDOS EM ATIVIDADES AGRÁRIAS E RECUPERAÇÃO DE ÁREAS DEGRADADAS
MONTANO, Daniel Bulgareli¹ FOFONKA, Luciana²
RESUMO
A população crescente e em grandes concentrações gera resíduos altamente poluentes. O tratamento de esgoto sanitário é uma solução. Nesse processo forma-se o lodo, esse é rico em nutrientes e matéria orgânica. O reuso agrícola e/ou a recuperação do solo degradado são alternativas para a disposição final do lodo. Objetivou-se com esta revisão verificar o que é descrito sobre a utilização do lodo proveniente do tratamento de esgoto. Desta forma a utilização do lodo como fertilizante nas culturas de milho e feijão preto é bastante eficaz e reduz custos. Em áreas degradadas a ação do lodo está na manutenção do horizonte orgânico, melhorando o aporte aos microorganismos. Por fim, percebeu-se que o biossólido (lodo tratado) é de grande valia e altamente aplicável nas atividades agrícolas ou na recuperação de áreas degradadas.
PALAVRAS-CHAVE: Lodo de esgoto. Reciclagem agrícola. Adubo orgânico.
INTRODUÇÃO
O aumento da população e sua crescente demanda por qualidade de vida aliada a grandes concentrações de pessoas (cidades) gera problemas e a necessidade de pensarmos no fazer com os resíduos. A coleta e o tratamento de esgoto é uma excelente solução, mas por vezes isso é diminuído por falta de tecnologia ou um aporte financeiro. Nesse processo forma-se um subproduto chamado de lodo e, quando este sofre algum tipo de tratamento é chamado de biossólido. O lodo de esgoto é rico em matéria orgânica, nutrientes essências às plantas e melhora a estrutura do solo. Algumas alternativas para a disposição do resíduo do tratamento do esgoto urbano são: o uso agrícola, como adubo ou fertilizante ou na recuperação do solo em áreas degradadas (BARBOSA & FILHO, 2006).
_______________________________ ¹ Pós-graduando em Gestão Ambiental – IERGS ² Doutoranda em Análise Ambiental – UFRGS. O BIOSSÓLIDO DE ETES
O lodo gerado nas estações de tratamento de esgoto sanitário (ETES) possui constituição média de: água (99,9%) e sólidos (0,1%), desse total, 70% são orgânicos (proteínas, carboidratos, gorduras, etc.) e 30% inorgânicos (areia, sais, metais, etc.), segundo Andreoli (1999). O descarte desse subproduto é um problema operacional para essas ETES. A má gestão desses resíduos origina custos significativos, por vezes são armazenados em condições precárias ou são lançados nos recursos hídricos. A reciclagem agrícola surge como uma alternativa. O lodo é transformado em um importante insumo rico em nutrientes e matéria orgânica para o solo. Algumas vantagens nesse reuso são a diminuição do uso de fertilizantes e os efeitos adversos causados pela incineração. O solo recupera suas condições físico-químicas o que possibilita a atividade da população edáfica. No entanto, o lodo pode conter: agentes patogênicos, nitrogênio e problemas de odor e atração de vetores. Desta forma planos de reciclagem devem ser elaborados. Andreoli e colaboradores (1999) relatam um plano de três fases:
FASE 1: PLANEJAMENTO PRELIMINAR • Estudo da produção do lodo: regime de funcionamento e vazão de entrada; sistema de estabilização e higienização; tipo de tratamento; equipamentos; área para gerenciamento do lodo; avaliação da quantidade produzida; cálculo da área necessária para distribuição. • Avaliação da qualidade do lodo: valor agronômico; níveis de metais pesados; patógenos; estabilidade. • Estudo da área de aplicação: localização geográfica; estrutura viária; características climáticas; hidrologia; características dos solos predominantes; contexto agrícola. FASE 2: ORGANIZAÇÃO DA DISTRIBUIÇÃO• Licenciamento: Regularização junto ao Órgão Ambiental; obtenção de licença ambiental. • Estratégias de distribuição: estratégias de transporte. • Parcerias: identificação de outros usuários potenciais; apoio técnico. • Marketing e divulgação. • Cadastro de interessados: cadastro dos produtores interessados; cálculo da área agrícola; períodos de aplicação e estocagem e culturas de utilização. FASE 3: OPERAÇÃO DE DISTRIBUIÇÃO • Estruturação: coleta de amostras de lodo. • Seleção de áreas: avaliação do potencial da propriedade. • Orientação agronômica: recomendação de adubação e complementação mineral. • Liberação de lotes de lodo: carregamento, distribuição e incorporação do lodo. • Relatórios e registros: organização e manutenção de cadastro. • Monitoramento: critérios e metodologia de monitoramento.
Em estudo realizado por Gadioli e Neto (2004), no interior do estado São Paulo, demonstraram que é possível utilizar o lodo de esgoto para culturas de milho (verão) e feijão preto (inverno). Neste o lodo passou por digestão aeróbia, e tratado com cal. As análises químicas obtidas no laboratório de solos da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz e coliformes fecais no laboratório de Ciências Ambientais da Universidade de Taubaté. Também foram feitas análises de solo da área onde ocorreu o plantio das culturas, a qual já tinha sido utilizada no cultivo de feijão carioquinha com aplicação de lodo. As doses aplicadas foram baseadas nas quantidades de nitrogênio recomendadas para os cultivos. O retorno financeiro por real gasto com o lodo pode ser de até quatro vezes mais do que com adubo químico (ANDREOLI et al., 1999 apud BISCAIA & MIRANDA, 1996). A ausência de matéria orgânica no solo restringe a atividade microbiana e não possibilita o crescimento da vegetação. O uso de cal e fertilização mineral pode contribuir para o desenvolvimento da flora, mas em condições precárias, a cobertura vegetal pode deteriorar-se antes da recuperação total do solo (BARBOSA & FILHO, 2006 apud STROO & JENKS, 1985). Assim, outra forma de uso do lodo pode ser a recuperação de solos degradados. Este possibilita o estabelecimento de plantas como gramíneas e leguminosas. As plantas demonstraram-se mais vigorosas, apresentando um melhor desenvolvimento de suas raízes. Nas áreas nas quais não foram colhidas houve a reciclagem de nutrientes e como conseqüência se acumulou matéria orgânica (BARBOSA & FILHO, 2006 apud SOPPER, 1993; VISSER, 1995). Desta forma podemos considerar o biossólido como um condicionador para a recuperação do solo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A reciclagem do lodo proveniente do tratamento do esgoto sanitário é possível e com grandes aplicabilidades minimizando a poluição dos solos e recursos hídricos, reduzindo custos no tratamento de água potável e proporcionando uma melhora e manutenção da qualidade dos ecossistemas aquáticos. O uso na agricultura pode restringir o uso de fertilizantes químicos que produzem inúmeros malefícios aos seres humanos e ecossistemas, possibilitando a redução de custos na produção, aumentando os rendimentos do produtor e proporcionando um menor preço para o consumidor final. Além disso, melhora os horizontes orgânicos, disponibilizando nutrientes e matéria orgânica para o solo. Na recuperação de solos degradados os biossólidos agem de forma a propiciarem a manutenção dos microorganismos. Os biossólidos possibilitam o estabelecimento e crescimento de gramíneas e leguminosas mais vigorosas. Isso possibilita o planejamento de recuperação de áreas degradadas que se destinam à preservação ambiental, auxiliando no processo de sucessão ecológica. Por fim é de suma importância que o tratamento prévio do lodo seja feito antes de qualquer disposição final, para evitar a contaminação por metais pesados ou patógenos. Para tanto o estudo da qualidade do lodo é necessário e fundamental. As condições ambientais do local, onde vai ser aplicado o biossólido também devem ser avaliadas entre outros aspectos. Definições políticas normatizando e regulando a utilização segura do lodo devem ser discutidas pela União, estados e municípios, bem como a população em geral.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDREOLI, Cleverson V. Uso e manejo do lodo de esgoto na agricultura e sua influência em características ambientais no agrossistema. 1999. 278 f. Tese (Doutorado em Meio Ambiente e Desenvolvimento) – Universidade Federal do Paraná, Curitiba.
ANDREOLI, Cleverson V.; FERREIRA, Andréia C.; PEGORINI, Eduardo S.; LARA, Aderlene I. A reciclagem agrícola do lodo de esgoto e a gestão do processo em estações de tratamento de esgoto. In: Conferência internacional sobre agropolos e parques tecnológicos agroindustriais. Barretos, SP, 1999.
BARBOSA, Graziela M. C.; FILHO, João T. Uso agrícola do lodo de esgoto: influência nas propriedades químicas e físicas do solo, produtividade e recuperação de áreas degradadas. Semina: Ciências Agrárias, Londrina v.27, n. 4, p. 565-580, out./dez. 2006
GADIOLI, João Luiz; NETO, Paulo F. Rendimento de milho e de feijão preto cultivado em solo acrescido de lodo de esgoto. Sanare. Revista Técnica da Sanepar, Curitiba, v. 21, n. 21, p. 53-58, jan./jun. 2004
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