Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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10/09/2011 (Nº 37) COLETIVO EDUCADOR: UM PERFIL DO SUJEITO SOCIOAMBIENTAL.
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Educação Ambiental em Ação 37

COLETIVO EDUCADOR:

UM PERFIL DO SUJEITO SOCIOAMBIENTAL.

 

Fujihara, J. R. P & Spazziani, M. L / Departamento de Educação – UNESP/Botucatu

jrp_fujihara@yahoo.com.br

spazziani@ibb.unesp.br

 

 

INTRODUÇÃO

 

No Brasil a educação ambiental surge muito antes da sua institucionalização federalista no governo, iniciando em 1973, com a criação, no Poder Executivo, da Secretaria Especial do Meio Ambiente (SEMA), a qual foi extinta, mas deixando projetos de inserção da temática ambiental nos currículos escolares e seis cursos de especialização em educação ambiental. Outro passo na institucionalização da Educação Ambiental foi dado com a Política Nacional de Meio Ambiente (PNMA), que se estabeleceu em 1981. Em 1988, inicia-se o processo de institucionalização de uma prática de comunicação e organização social em rede, com os primeiros passos da Rede Paulista de Educação Ambiental (REPEA) e da Rede Capixaba de Educação Ambiental. Mais tarde, em 1992, no II Fórum Brasileiro de Educação Ambiental, é lançada a idéia de uma Rede Brasileira de Educação Ambiental (REBEA), onde se adotou o Tratado de Educação Ambiental para Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global como carta de princípios (BRASIL, 2005a).

Partindo do pressuposto de que educação ambiental é parte constitutiva de uma política pública e que o educador ambiental está por fazer parte como colocam (GONÇALVES, 2007; DIAS, 2000; SORRENTINO ET AL., 2005), a Diretoria de Educação do Ministério do Meio Ambiente propôs a formação de Educador (es) Ambientais, os quais se pautam na idéia de que cada grupo, cada coletivo, é responsável pela sua constante formação, por ser conhecedor de suas dificuldades e potencialidades e, dessa maneira, ser capaz de diagnosticar e interpretar a realidade, sonhar sua transformação, planejar intervenções educadoras, implementá-las e avaliá-las (BRASIL, 2005a). Considerando essa perspectiva, a proposta de política pública, segundo Ferraro Jr. & Sorrentino (2005), é apresentada pelo programa dos Coletivos Educadores (CE), que são grupos formados por pessoas de instituições localizadas em determinado território e que precisam se constituir como grupos de pesquisa-ação-participativa, trabalhando em um processo permanente de ação-reflexão, de pesquisa e intervenção, de análise, de delineamento participativo de estratégias, implicando também em procedimentos democráticos não hierarquizados e transparentes. Os primeiros CE se articularam em 2004, sob apoio institucional de parceiros do DEA/MMA, nos estados do Paraná, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul (BRASIL, 2008), consequentemente foi lançado o edital público para a seleção de projetos de Coletivos Educadores para Territórios Sustentáveis, em 2005, via Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA), idealizado pela DEA/MMA em parceria com Ministérios da Educação (MEC), da Integração Nacional (MI) e do Desenvolvimento Agrário (MDA).

Neste sentido, o objetivo deste trabalho é identificar e analisar o perfil dos participantes enquanto sujeitos no que se refere aos interesses e os motivos que os levaram a se interessar pela questão ambiental e os direcionamentos a educação ambiental e seus desdobramentos.

            O projeto foi realizado entre os anos de 2009 e 2010. Nas etapas iniciais realizou-se a revisão de literatura, o contato com os participantes do Coletivo Cuesta Educador (CCE) e as suas identificações. A seguir, durante o ano de 2009, foram aplicadas as entrevistas propostas, a priori, pelo questionário elaborado. À medida que os dados foram sendo obtidos, sistematizados e análises descritivas preliminares.

 

I – EDUCAÇÃO AMBIENTAL – PRESSUPOSTOS E SENTIDOS DE UMA CONSTITUIÇÃO SOCIOAMBIENTAL

 

Em 2005 inicia-se a caminhada do CCE, com algumas poucas pessoas provenientes de diferentes instituições, contudo, em 2007 quando o número de entidades foi ampliado é que se deu sua formação oficial. O grupo tem como Instituição âncora ao longo do processo de formação, a Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho- UNESP/Rubião Jr – Departamento de Educação, e demais instituições, tanto de Botucatu quanto dos outros municípios participantes.

O processo educativo, adotado pelo grupo formador do Coletivo Cuesta Educador teve por objetivo desenvolver um curso de Formação de Educadores Socioambientais com atividades práticas, bem como uma maior integração e participação entre os grupos regionais e os grupos dos Coletivos Educadores do Estado de São Paulo e até outros estados na área socioambiental através de eventos, favorecendo a troca de conhecimento, e através das experiências e dificuldades buscar juntos soluções de melhorias da qualidade de vida de todo um grupo e do meio ambiente. Seu início aconteceu em oito de novembro de 2008, e encerrou-se em 20 (vinte) de junho de 2009, concluindo 28 (vinte e oito) sendo: cinco formandos do município de Conchas, cinco de Itatinga, cinco de Torre de Pedra e oito de Botucatu, ficando no meio do caminho os municípios de Pardinho e São Manuel os quais simplesmente não compareceram nas datas do curso, não justificando suas desistências.

O interesse pelo perfil dos educadores socioambientais do CCE manifesta-se no início do processo de formação dos mesmos. O grupo foi constituído por diferentes personalidades, com diferentes olhares e histórias, o que nos instigou a compreender como se dá a inserção dos sujeitos no campo ambiental. Durante o curso foi possivel notar algumas pessoas mais atuantes que outras, tanto no que diz respeito às atividades e frequência no curso quanto a outras atividades já iniciadas no campo ambiental. Diante desta constatação entramos em contato com essas pessoas, foi um processo meio demorado, haja visto que o curso era aos sábados e quinzenalmente, e pelo fato das pessoas pertencerem a outros municípios, isso dificultou um pouco a aproximação. Das 12 (doze) pessoas que contatamos, somente 8 (oito) puderam participar das entrevistas, umas por falta de tempo, e outras ainda por não se sentirem à vontade. Conseqüentemente, as entrevistas iniciaram-se no mês de julho.

 

II- HISTÓRICO DE VIDA – PERFIL E A RELAÇÃO COM AMBIENTE SOCIOAMBIENTAL

 

Dos entrevistados, quatro estão na faixa dos 25 aos 30 anos, dois estão entre os 31 aos 40 anos e dois entre os 41 aos 50 anos. Ou seja, embora todos adultos, metade são jovens e a outra metade dos sujeitos estão na fase madura da referida etapa. Entre eles seis são do sexo feminino e dois do sexo masculino. Pode-se verificar que entre os 8 entrevistados há uma heterogeneidade entre a escolaridade, sendo que a metade possui nível superior completo. Entre os cursos superiores, Pedagogia é formação de três, sendo que uma possui, também, Letras e a outra em Educação Artística. Outro sujeito tem formação em Ciências Biológicas e outro está estudando Letras. Há três sujeitos que sua escolarização remete à educação básica, dois em nível técnico e outro ensino fundamental incompleto. Dos cursos e formação explicitados identificamos que todos de nível superior relacionam-se a área da educação, sendo que o de Biologia favorece o tema ambiental. Com relação ao curso técnico, o de Engenharia Florestal também relaciona o enfoque ambiental. Assim, dos oito sujeitos, seis tiveram na sua formação aspectos que favorecem o tema educativo e/ou ambiental.

Tomando como referência o ambiente histórico onde o homem nasce e se desenvolve, a abordagem de Vygotsky entende que o processo de construção do conhecimento ocorre através da interação do sujeito historicamente situado com o ambiente sociocultural onde vive (VYGOTSKY, 1996). O caminhar dentro de uma trajetória ambiental é tomada pelas experiências de vida de cada sujeito.

Os relatos dos sujeitos entrevistados nos revelam que todos tiveram uma infância com bastante liberdade, onde ‘brincar na rua’ era uma das brincadeiras prediletas, diferentemente dos modos de ser das crianças de hoje, que se atém e se entretém com eletrônicos, como tv, computadores, internet, celular e vídeo-games. As músicas infantis quase não existem, agora a moda é o estilo ‘funk’. As meninas, por sua vez, foram as que mais perderam em termos de brincadeiras, deixaram de lado as bonecas por estojos de maquiagem, sapatos de salto e baladas. A inocência da criança, o incentivo à literatura e à imaginação, da forma como foram concebidos no contexto da sociedade moderna, são raros nos desenhos e jogos dessa nova infância. No caso dos entrevistados, fica evidente que cada um relaciona em suas narrativas de vida o contexto socioambiental do desenvolvimento infantil com suas escolhas profissionais durante o processo de aprendizagem.

É possível identificar que o potencial que congrega esses atores no percurso que os levam em direção à questão ambiental é explicitado em suas narrativas durante as experiências, positivas ou negativas, ainda na fase da infância, onde eles conseguem identificar situações e oportunidades que nortearam suas escolhas para o campo ambiental.

Quando perguntamos aos entrevistados para lembrar-se de fatos que evidenciam na sua relação com o meio ambiente socioambiental, surge a educação familiar, como um fato importante para as ações socioambientais, presente no dia-a-dia. Os valores, atitudes e mudanças de comportamento no processo para a conscientização e despertar para as ações socioambientais são marcantes no núcleo primário de vida social (a família).

Os relatos também apontam a necessidade de mudanças de conceitos e de atitudes através da educação ambiental, tendo a intervenção social como aliada na tentativa de exercer influência na construção de novos significados, sentidos e novos comportamentos nas relações entre sociedade e meio ambiente.

 

III - EDUCAÇÃO AMBIENTAL E TRAJETÓRIAS: ENCONTRO OU BUSCA?

 

Para nossos sujeitos a percepção de mundo vem associada à intensidade e forma de participação, permitindo determinar qual direção seguir e como agir para a promoção da participação de todos. Segundo Carvalho (2010) “o campo social é o universo onde as formulações éticas encontram legitimidade e a partir do qual podem exercer suas pretensões de universalidade, disputando reconhecimento para além de seu campo específico” (CARVALHO, p 60).

A importância de diálogos, de participação e de transformação é sentida por eles e revelada no envolvimento com as questões ambientais, no acreditar que podem fazer a diferença. Desse modo é possível dizer que a formação de cidadãos críticos e atuantes depende da compreensão de problemas ambientais, da difusão de informações, da assimilação dos conceitos por meio de diferentes espaços, além de promover formas alternativas de mudanças pessoal e grupal.

É no campo da ação e da reflexão que vamos delinear os interesses e motivos pelos quais nossos entrevistados enunciam a educação ambiental. Guimarães (2004) aponta a importância da ação pela reflexão e revela que é através dessa dinâmica entre a produção e reprodução das relações sociais que se concretiza a educação. Os discursos vão ficando cada vez mais marcados pela significância da participação no curso de Formação de Educadores Socioambientais e pela possibilidade de levar a educação ambiental para suas áreas de atuação.

Através das narrativas é possível identificar que os caminhos de acesso para o coletivo educador se dão a partir do convite ou indicação de pessoas que já estavam na articulação do grupo gestor do Coletivo Cuesta que viram nessas pessoas um potencial para atuar coletivamente dentro dos preceitos da educação ambiental

 

CONCLUSÃO

 

            A riqueza e a diversidade de histórias que pude ouvir foram muitas, as quais não foram totalmente contempladas neste momento. A complexidade de vidas e necessidades a partir da imersão da educação ambiental em seus projetos de vida nos aponta a necessidade de discussões acerca da perspectiva crítica, transformadora e emancipatória.

Quando falamos no sentido que a educação ambiental traz aos nossos entrevistados, é preciso destacar que a educação ambiental surge como um novo desafio voltado para sustentabilidade ambiental e da própria sociedade.

É possível detectar que o caminho de entrada para a área ambiental acontece das mais variadas maneiras e momentos. Contudo, nesta pesquisa, pode-se identificar o campo profissional, as experiências pessoais, a conscientização dos problemas ambientais e a preocupação por uma transformação com equidade, são descritos como indicadores no processo formativo e reflexivo que os unem para um atuar coletivamente.

Apesar das diferentes abordagens que se têm sobre a educação ambiental, todos apontam para a necessidade da conquista da consciência ambiental, na integração entre homem-ambiente.

 

REFERENCIAS

 

BRASIL. Ministério do Meio Ambiente.Programa Nacional de Educação Ambiental – ProNEA.  Brasília: MMA, Secretaria Executiva Diretoria de Educação Ambiental. 3ª Ed, 2005a, p.105.

CARVALHO, I.C.M. A invenção ecológica – Narrativas e trajetórias da Educação Ambiental no Brasil. 2ª Ed. Porto Alegre: Ed da UFRGS, 2002.

FERRARO JR., L. A. & SORRENTINO, M. Coletivos Educadores. In: FERRARO JR, L. A. (Org.) Encontros e caminhos: formação de educadoras (es) ambientais e coletivos educadores. Brasília: MMA, Diretoria de Educação Ambiental, 2000, p.57-70.

GONÇALVES, P. M. C. Juventude, Meio Ambiente e Educação: da investigação das trajetórias de vida à discussão de políticas públicas, considerações iniciais para a pesquisa. In: V ENPEC - Encontro Nacional de Pesquisa em Educação em Ciências. UNB. EPEA, 2007.

DIAS, G.F. Educação Ambiental: princípios e práticas. 6ª Ed. São Paulo: Gaia, 2000.

SORRENTINO, M, TRAJBER, R. MENDONÇA, P. FERRARO JR, L. A. Educação Ambiental como política pública. In Revista Educação e Pesquisa. São Paulo. vol. 31, no 2, p.285-299. Maio/Ago, 2005.

VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. Editora Martins. Rio de Janeiro,

1996.

 

Ilustrações: Silvana Santos