Estamos sendo lembrados de que somos tão vulneráveis que, se cortarem nosso ar por alguns minutos, a gente morre. - Ailton Krenak
ISSN 1678-0701 · Volume XXI, Número 86 · Março-Maio/2024
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04/06/2011 (Nº 36) Desafios da educação ambiental no Ensino Médio em duas cidades do interior de MG
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Revista Educação Ambiental em Ação 36

DESAFIOS DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL NO ENSINO MÉDIO EM DUAS CIDADES DO INTERIOR DE MG.

 

Aloísio Calsoni Bozzini

Mestre em Ecologia- Professor do Centro Universitário da Fundação Educacional de Guaxupé (UNIFEG)

acbozzini@hotmail.com

 

Graziela Aparecida Nicolau

Acadêmica do curso de Ciências Biológicas do Centro Universitário da Fundação Educacional de Guaxupé (UNIFEG)

apnicolaugnesia@hotmail.com

 

Raquel Christina Vinco

Acadêmica do curso de Ciências Biológicas do Centro Universitário da Fundação Educacional de Guaxupé (UNIFEG)

raquelcvinco@hotmail.com

 

Rômulo Magno da Silva

Acadêmico do curso de Ciências Biológicas do Centro Universitário da Fundação Educacional de Guaxupé (UNIFEG)

apice_alfa@hotmail.com

 

RESUMO

A Educação Ambiental tem tomado um papel cada vez mais significativo em nossa sociedade na medida em que se torna cada vez mais necessário novas formas de concepção e relação com o meio ambiente, de forma que as práticas de que visem o bem material acima de tudo sejam revistas e reformuladas. Dessa forma o presente trabalho teve o objetivo de analisar como a EA tem sido vista e interpretada pelos do Ensino Médio em escolas públicas de Guaranésia e Muzambinho, no interior de MG. Pelos dados coletados observou-se uma discrepância entre os objetivos clássicos da EA e forma como a EA tem se inserido nos currículos das escolas analisadas. Conclui-se que torna necessária uma reestruturação da forma como a EA tem sido inserida no meio escolar com o fim de desenvolver nos alunos atitudes e valores condizentes com a consciência ambiental.

Palavras-chave: Ensino Médio; Discrepância; Reestruturação de currículos.

 

1. INTRODUÇÃO

Andrade (1993) acredita que o papel da Educação Ambiental (E.A.) é o de auxiliar o homem a desenvolver relações mais harmônicas com o meio ambiente em que vive sem deixar de considerar os fatores sociais, econômicos e culturais inerentes a essas relações. Jatobi (2003) defende que o debate acerca da educação ambiental se faz cada vez mais necessário, pois o processo reflexivo sobre o tema se mostra incipiente diante das múltiplas possibilidades, deixando de considerar suas relações com a natureza, a cultura, e a técnica. Ainda segundo o autor, refletir sobre o tema abre espaço para que novos atores sociais se mobilizem na apropriação da natureza, levando em conta a sustentabilidade e a participação da sociedade, tendo como cerne o diálogo e a interdependência entre as mais variadas áreas do saber. Mas também implica na mudança na forma de pensar e agir, de forma a transformar o conhecimento e a educação. A realidade exige uma reflexão cada vez menos linear, devendo se dar ênfase ao dialogo. A preocupação com o desenvolvimento sustentável representa a possibilidade de garantir mudanças sociopolíticas que não comprometam os sistemas ecológicos e sociais que sustentam as comunidades.

            A E.A. tem o papel de formar novos cidadãos que sejam críticos e difundam o diálogo sobre o uso consciente dos recursos da natureza. Seu papel é, então, realizar uma ampla e profunda transformação social. A escola foi uma das primeiras a receber essa dimensão de “ambientalização”, tomando para si a grande responsabilidade de melhorar a vida da população por meio de conscientização e informação (DIAS, 2003).

A E.A. vem sendo integrada ao currículo do Ensino Médio de forma gradual, ocorrendo de diversas formas, sobretudo pelas propostas de Conselhos de Educação, o que no Brasil culmina com a elaboração dos Parâmetros Curriculares Nacionais, onde há amplo dimensionamento da questão ambiental. Existe a necessidade de que o currículo motive mais os alunos, mobilizada para assumir um papel mais propositivo, capaz de questionar, de forma concreta, a falta de iniciativa do governo na implementação de medidas que melhorem o meio ambiente (SANTOS, 2002).

             Para Carvalho (2006) a E.A., no Brasil, permeia os currículos de todos os níveis educacionais, sendo sua inclusão garantida pela lei 9.795 No entanto, a E.A. já estava presente nos currículos muito antes: a Lei 9693/1996 (Lei das Diretrizes e Bases da Educação) declarava em seu 2º Artigo que a função da educação é: “garantir o pleno desenvolvimento do educando, o exercício da cidadania e seu preparo para o mercado de trabalho.” O referido autor não consegue prever que o homem alcance seu “pleno desenvolvimento” sem desempenhar relações harmoniosas com o meio em que vive. Dessa forma, de acordo com autor, a E.A. já estaria implícita na Lei de Diretrizes e Bases da Educação.

            Daí surge o primeiro descompasso das práticas da E.A. brasileira. Apesar de estar implícita na LDB de 1996, sempre houve uma escamoteação no meio escolar e, além disso, o pouco de E.A. difundida nas escolas brasileiras era desvinculado dos pressupostos debatidos nos grandes eventos mundiais e nacionais sobre o tema. Carvalho (2006) ainda caracteriza a E.A. brasileira como pouco aprofundada, havendo poucos trabalhos sobre o tema, sendo as principais atividades de E.A. brasileiras adaptações grosseiras de práticas estrangeiras, sendo pouco adaptadas à realidade do país.

 

ndo suas principais atiema. trabalhos sobre o tema. ebatidos nos grandes eventos sobre o tema

2. METODOLOGIA

           

            O presente trabalho caracterizou-se por se do tipo “pesquisa-ação”. Nesse tipo de abordagem, segundo Brandão (1981) as características básicas são a inserção de pesquisadores e pesquisados em um mesmo escalão, trabalhando conjuntamente para a produção de novos conhecimentos, visando a uma transformação social e uma mudança de atitudes dos pesquisados, após uma intervenção programada e dirigida dos pesquisadores no grupo investigado. Nesse ínterem, após a realização das entrevistas, foi realizada uma palestra aos alunos a respeito do tema investigado na pesquisa, buscando alargar e aprofundar os conhecimentos dos alunos a respeito do tema. Buscou-se com isso a criação de valores, atitudes e conhecimentos para uma melhor compreensão da realidade em que estavam inseridos.

Foram pesquisados alunos da terceira série do Ensino Médio de escolas públicas dos municípios de Guaranésia e Muzambinho – MG. O instrumento de abordagem aos entrevistados foi a entrevista estruturada- questionário, em que os alunos deveriam responder perguntas determinadas previamente (Tozoni- Reis, 2009).

Além disso, houve o uso da observação participante, onde os pesquisadores buscaram analisar comportamentos, atitudes, valores, crenças e conhecimentos dos alunos através da observação de sua atuação e comportamento no meio escolar, nos momentos em que os pesquisadores estiveram presentes na escola.

Antes de a pesquisa ser aplicada “in loco” aos alunos das escolas foi realizado um estudo piloto com alguns alunos do curso de Biologia do UNIFEG a fim de se identificar falhas no questionário para que os futuros entrevistados não encontrassem dificuldades interpretativas e não fosse preciso a intervenção dos pesquisadores, o que poderia ocasionar gerar influência nas opiniões dos alunos.

A pesquisa foi conduzida nos meses de outubro e novembro de 2009. Antes de os questionários serem respondidos, foi realizada uma breve explanação sobre os objetivos da pesquisa. Essa primeira parte do trabalho justifica-se pelo fato de aprofundar o conhecimento dos alunos sobre o tema, sendo realizada na própria sala de aula onde os alunos se encontravam.

Para a análise dos resultados foram utilizados as técnicas inerentes às pesquisas das ciências sociais que são denominadas “qualitativas”. Segundo Minayo (1998) é preciso considerar que os fenômenos sociais nem sempre podem ser quantificáveis, pois, trata-se de um universo de significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, que corresponde a um espaço mais profundo das relações dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos a operacionalização de variáveis. O que se busca nesse contexto de pesquisa são as causas (sociais, econômicas, psicológicas) do problema e não meramente sua quantificação.

 

 

3. RESULTADOS

 

Foram entrevistados 128 alunos do Terceiro Ano de Ensino Médio, em quatro turmas diferentes, duas na Escola Estadual Salatiel de Almeida (Muzambinho) e duas na Escola Estadual Alice Autran Dourado (Guaranésia). Os questionários foram aplicados de manhã e à noite, em período letivo. Antes da aplicação dos questionários, os pesquisadores explicaram os objetivos do trabalho.

Na primeira questão, apenas 14% alunos deram resposta negativa. Isso significa que somente cerca de 17  do total de entrevistados não adquiriu algum conhecimento sobre E.A. durante o Ensino Médio. Os alunos que deram resposta afirmativa prosseguiram respondendo as demais questões.

As questões que se seguiam discutiam o significado de E.A. para os alunos e sua importância na sociedade, quais atitudes os alunos tomavam para a melhoria do meio ambiente e da qualidade de vida e do bem-estar da sociedade como um todo.

A partir das respostas dadas à segunda questão, percebe-se que os alunos têm uma visão compartimentalizada sobre as práticas de E.A., sendo levada em conta apenas a dimensão naturalizada do meio ambiente. Os alunos citam a E.A. como sinônimo de "cuidar do meio ambiente", "não jogar lixo nas ruas", "não desmatar", “forma de instruir o cidadão a cuidar do ambiente”, “respeitar o meio ambiente”, “reeducar nossos hábitos”, “não poluir”. Nenhum dos alunos abordou a dimensão social da questão, onde poderiam ter citado outros fatores como a fome, a pobreza, a violência e consumismo como problemas presentes no ambiente onde vivem.

A terceira questão abordava as atitudes que os alunos tomavam ou tomam para garantir a preservação e a conservação do meio ambiente. 25 alunos afirmaram não adotar atitudes de preservação, 99 alunos disseram levar em conta o respeito ao meio ambiente nas práticas cotidianas. A atitude mais comum desempenhada pelos alunos foi "não jogar lixo nas ruas”. Alguns alunos preferem “andar a pé”, ao invés de usar o carro, outros ajudam na “reciclagem” de materiais.

Na pergunta final, os alunos deveriam citar formas de como a escola poderia influenciar os alunos a tomarem medidas que garantissem o desenvolvimento e a melhoria da qualidade de vida da comunidade, sem colocar em risco o meio ambiente. Foi muito citada a "conscientização das pessoas", embora não se explicitasse a forma de consegui-la. Alguns alunos citaram a "punição" como uma boa medida para se conseguir os objetivos almejados. A maioria dos alunos afirmou que "palestras", "filmes", "exposições" podem contribuir para a melhoria da relação homem-ambiente-desenvolvimento. Alguns entrevistados afirmaram que a escola não tinha a função de conscientizar os alunos, sendo essa uma decisão individual, proveniente de um processo de reflexão interna, cabendo ao próprio indivíduo a decisão de qual atitude tomar.

Observa-se que os resultados obtidos refletem a opinião que vários estudiosos têm mostrado e previsto sobre o tema, classificando as práticas de E.A. como “engessadas”, pouco articuladas entre as diversas áreas do saber e pouco dialéticas. Nota-se, pelos dados obtidos, que os alunos têm uma visão do meio ambiente levando em conta apenas os fatores naturais, deixando de lado os fatores sociais, humanos e econômicos envolvidos no processo.

Autores como Grun (1996) e Guimarães (1995) comprovam em suas obras a tendência de pouco dialogo e apontam que há certa desconectividade entre os reais objetivos da E. A. e a forma que com que ela é abordada nas escolas. Dias (2003) corrobora com a opinião dos alunos quanto às formas de melhoria do ensino de E.A.. No entanto atividades mais práticas (extraclasse) como passeios, trilhas, “caminhadas interpretativas socioambientais”, não são bem vistas por diretores, coordenadores e pais de alunos para os quais o lugar dos alunos é na sala de aula.

Trata-se, portanto de um problema estrutural que atinge toda  a educação básica brasileira, não somente a EA. Vê-se como afirma Savian (2008) uma decadência na educação publica brasileira que, apesar dos recentes investimentos, não houve grandes mudanças, já que esse investimentos não são satisfatórios e além do que os problemas educacionais brasileiros não são decorrentes apenas de causas financeiras, mas também de falta de preparação e comprometimento dos professores. Na questão da EA, o problema se vê ainda mais agravado, pois apesar de se ver que o tema está inserido, inclusive, com leis regulamentares  no currículo escolar, muitas vezes ela é subexplorada em detrimento de outros conteúdos.

Infelizmente o que se espera diante de tal realidade é um agravamento dos problemas ambientais, pois a instituição necessária para a socialização dos conhecimentos a respeito do tema se encontra com condições cada vez mais precárias de incutir valores, atitudes e conhecimentos nos alunos.

 

 

4. CONCLUSÃO

 

            A Educação Ambiental constitui-se em um dos pilares da sociedade moderna atual. Seu papel de mediadora entre o homem e o meio ambiente se torna um fator de modificação de atitudes e tomada de novas posturas e modos de pensar. Ela estimula atitudes que visem a conservação, a melhoria da qualidade de vida e enfoca tema controversos como a “sustentabilidade”. No entanto, E.A. não tem a ver somente com temas específicos como a preservação do meio ambiente. Como uma área do conhecimento ampla e diversificada, ela apresenta inúmeros outros objetivos, apresentados nos documentos gerados nas grandes reuniões de E.A. No campo da educação, o diálogo e a discussão, formas extremamente úteis de produção e irradiação de conhecimento em E.A., são muitas vezes negligenciados em detrimento do magistrocentrismo e do tradicionalismo da sala de aula.

            Um novo redimensionamento da forma com que se divulga e se lida com a E.A. nas escolas torna-se cada vez mais necessário. A dimensão discursiva das questões e as várias interpretações que o tema pode gerar devem ser levadas em conta. Para que práticas de ensino em E.A. atinjam os objetivos almejados, é preciso, portanto, uma revisão e uma profunda reflexão sobre como se lida com o tema durante o Ensino Médio.

 

 

REFERÊNCIAS

ANDRADE, A. L. Educação Ambiental e construçao da cidadania-Uma prática com classes populares. Dis mestrado. RJ: Facul de Educaçao: UFRJ, 1993.

 

BRANDÃO, Carlos R. Pesquisa Participante. 3. Ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1986.

 

 

BRASIL. Lei nº 9394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da Educação Nacional. Diário Oficial da União, Brasília, Brasília, DF, 20 de dez. 1996.

 

 

————. Lei n º 9795, de 28 de setembro de 1999. Dispõe sobre a Educação Ambiental, institui a Política Nacional de Educação Ambiental e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 27 de abril de 1999.
  

 

CARVALHO, Vilson Sérgio de. Educaçao Ambiental e desenvolvimento comunitário. Rio de Janeiro: WakEd, 2006.


 

DIAS, Genebaldo Freire. Educação Ambiental: Princípios e Práticas. 9 ed. Rio de Janeiro, Gaia, 2004. 551 p.

 

 

GRUN, Mauro. Ética e Educação Ambiental: a conexão necessária. 11 ed.Campinas: Papirus, 1996. 114p. Disponível em: <http://books.google.com.br/books?hl=pt-BR&lr=&id=MoIe_qa1XvwC&oi=fnd&pg=PA9&dq=educa%C3%A7ao+ambiental+&ots=Q_qQtaFhv8&sig=1WkBcUzHfPvs2Hxt-j8enwiSleQ#v=onepage&q=&f=false>. Acesso em 01 dez. 2009.

 

 

GUIMARÃES, Mauro. A dimensão ambiental na educação. 8 ed.Campinas: Papirus, 1995. 102 p. Disponível em: <http://books.google.com.br/books?hl=pt-BR&lr=&id=huMtr2kOGoUC&oi=fnd&pg=PA9&dq=educa%C3%A7ao+ambiental+&ots=qe9Tc4tL64&sig=ycuiam7PZH26kTEN51iild0jIcU#v=onepage&q=&f=false>. Acesso em 12 dez. 2009.

 

 

JACOBI, Pedro. Educação Ambiental, Cidadania e Sustentabilidade. Cadernos de Pesquisa, n. 118, p. 189- 205, março 2003. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/cp/n118/16834.pdf. Acesso em 8 set. 2009.

 

MINAYO, M.C. Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. Petrópolis: Vozes, 1998.

 

SANTOS, Evalter Souza. Educação e Sustentabilidade. Revista da FAEEBA – Educação e Contemporaneidade, Salvador, v. 11, n. 18, p. 259- 279, jul./dez. 2002. Disponível em : http://www.revistadafaeeba.uneb.br/anteriores/numero18.pdf#page=17. Acesso em 7 set. 2009.

 

SAVIANI, Demerval. Educação Brasileira: Estrutura e Sistema. 10 ed. Campinas: Editores Associados, 2008.

 

TOZONI-REIS, Marília Freitas de Campos. Metodologia da Pesquisa. 2. Ed. Curitiba: IESDE Brasil S.A., 2009.

 

 

Ilustrações: Silvana Santos